2AM

São quase duas da manhã, mas o meu cérebro não dorme. Sua risada me invadiu a mente e ficou ecoando pelos quatro cantos dessa cabeça confusa até não existir mais eu, até tudo remeter a você. E da sua risada, vieram os abraços de madrugada, os incontáveis banhos intermináveis nos quais intercalávamos moicanos de espuma e beijos apaixonados contra o azulejo frio, você colocando as músicas que me faziam sentir mais poderosa enquanto eu me maquiava para sairmos pelo centro daquela cidade morta que eu odeio... A última briga, tão feia que até a lembrança faz doer onde doeu, rompe a cicatriz e sangra a ferida, tudo de novo, como se fosse a primeira vez.

Eles dizem que o tempo cura tudo, mas ninguém sabe quem ou o que é capaz de curar o próprio tempo, porque é ele que se torna insuportável. Cada minuto, cada hora, cada dia, cada ano passado sem uma resposta, uma mensagem que seja, só aumenta o desespero e a ansiedade. As vezes eu entendo o Chorão quando ele diz que "fim de semana, eu sei lá, vou viajar, vou me embalar, vou dar uma festa, eu vou tocar um puteiro, eu vou te esquecer, nem que for só por uma noite". Uma alívio rápido se mostra imensamente melhor que alívio algum.

E você não se importa, não é? Não, você não está acordado as duas da manhã lembrando de como meu cabelo parecia macio entre os seus dedos, ou na maneira como eu te olhava, tal qual fora o homem mais lindo desse mundo, nem mesmo deve se lembrar da minha pele aveludada, correndo contra a sua, arrepiando espinhas e eriçando pelos por todo o corpo. Não, você não pensa em nós dois porque, talvez, jamais tenha existido esse conceito na sua cabeça, pelo menos não como existiu pra mim.

No meu dubio conto de fadas ao inverso, a chapeuzinho se apaixonou pelo lobo sem se importar se ele ia deixá-la nua na cama, completamente quebrada e machucada. Ela só queria sentir e sentiu: toda a paixão, o ardor, o medo, o rancor, sente até hoje, por mais que diga que não. Essa pequena rosa selvagem que pensou que ia permanecer pura em suas pétalas e espinhos agora jas destroçada contra o chão de concreto, pisoteada por esses converses de tamanho quarenta já muito gastos pelo uso. E para não terminar sem mais nem menos esse desabafo completamente desprovido de sentido, deixo algo revelado que sai rasgando meu peito lavado:

Quero beijar seus pulsos finos de novo.