A ÚLTIMA CHAGA - Ofertas tentadoras

Tragédia anunciada foi o pré-anúncio de caminhos, escolhas e decisões que estavam por vir. Também foi o título de uma das cartas de Júnior em sua antiga escrivaninha, em resposta à minha poesia chamada 'CAOS', que ainda permanece aqui.

No mesmo ano em que o pai do meu filho faleceu e ainda no ano seguinte, por alguma razão que até hoje eu desconheço, passei a atrair olhares de muitas figuras masculinas. O que eu tinha dificuldade nos anos passados, passou do nada, assim tão de repente, a vir em badejas ou oferendas, vai saber...

Eu continuava esteticamente e fisicamente a mesma, mas meu estado de espírito estava iluminado, e não estando mais preocupada com o assunto, parecia cada mais do que eu já não precisava. O assédio em pequena escala sempre foi algo que me incomodou, e na proporção que estava naquela época, além de me deixar desconfortável, também me deixava intrigada e curiosa com o fato. Penso no que li no livro "O Segredo", que o universo te dá mais daquilo que você já tem e não do que você precisa.

Lembro de um rapaz em específico, um ano mais novo que eu e que era o dono de uma farmácia local do bairro aonde eu morava na época. O rapaz tinha pinta de ator de novela e assim do nada, se encantou por mim. Eu sempre deixei claro que não me envolvia com homens casados ou comprometidos, que era o caso dele, e eu ainda por sinal também estava comprometida com Júnior. Por nenhum destes, bonitos, lindos ou nem tanto, o meu coração balançou. Nunca me importei com a aparência física, sempre procurando olhar o caráter e o interior das pessoas, ainda que descobrisse este último, um pouco de forma tardia. Mas a vida ensina e insiste em ensinar...

Este farmacêutico sabendo que eu não me envolvia com homens comprometidos e envaidecido por sua beleza, chegou ao ponto de separar de sua companheira, na esperança de eu ficar com ele. Chegou a me dizer que às 2h da madrugada passaria na minha casa. Lógico que depois disso eu tive que ser um pouco indelicada e como homens não ficam muito tempo sem mulheres, logo reatou com sua companheira.

Falando assim, até posso estar passando uma imagem de ser uma pessoa que facilitava esses assédios, mas não era isso que acontecia. Eu apenas era educada com as pessoas e nem sempre estava bem arrumada. Recebia convites para jantar fora, e mesmo dizendo que tinha um namorado, eram insistentes. Claro, que fazia o possível para evitar futuros contatos com tais pessoas, mas que nem sempre dependia apenas de mim. Era o cara do mercado da esquina, eram os caras que ofereciam serviço de taxista, era o farmacêutico da única farmácia que tinha no bairro, e por aí se percebe o pequeno círculo em que estava inserida e que não tinha muito para onde me desviar.

Não me achava empoderada, nem envaidecida, pelo contrário, me sentia sim, uma mulher completa e amada, tanto por mim quanto por Júnior, apesar de algumas ressalvas posteriormente relatadas e dos problemas pessoais que estava passando. Estava atraente, mas me sentia atraída por um único rosto, o do meu namorado. Nada poderia substituir o que a gente era quando estávamos juntos e nada poderia preencher a lacuna que ficava quando estávamos separados, quer dizer, quase nada. Não necessariamente uma pessoa, mas um sonho tão esperado, após muitos anos de labuta, solidão, choro e desilusões. Este meu sonho se encontra relatado aqui com o título de 'CASINHA BRANCA', no qual Júnior sempre foi ciente.

Em paralelo à isso tudo, nessa época, Rafael começou mais que flertar, e mesmo eu insistindo em dizer que tinha namorado e que o amava, ele não respeitava e insistia em dizer mesmo sem o conhecer, que Júnior nunca poderia me fazer feliz como ele poderia. Que procurava uma mulher e tinha certeza que essa mulher era eu, para morar em sua casa recém reformada e construir uma família comigo e com meu filho. Em algumas fotos que Rafael enviava, um dia me enviou a da sua casa, e por curiosidade, sendo coincidência ou não, a casa era de cor totalmente branca.

Certo dia, em um desses rompantes de Rafael, ele bebeu e ainda contendo a minha senha do site de jogos, ele por dois dias a fio apagou cem amigos da minha lista, e não apagou mais porque caiu de sono de tão bêbado que estava. Mudava a minha foto, fez tudo o que eu disse que ele poderia vir a fazer se passando por mim e aquilo me enfurecia ao máximo. Até que um dia, enfurecido com algo que no momento eu não me lembro, ele deu um chute na CPU do seu computador e estragou o HD da mesma. A partir deste dia eu vi a possibilidade de me ver livre dele, visto que havia perdido todos os dados salvos da minha conta que estavam em seu computador e que nada tinha anotado fora dele.

Fiquei aliviada e vi ali a chance de bloqueá-lo finalmente em tudo e me ver livre daquela obsessão toda. E nem preciso mencionar que ele voltou a pedir novamente a senha, que eu nunca mais dei e se quer cogitei a possibilidade de informar mais nada meu. Nem sobrenome e muito menos redes sociais. Mas, não o fiz, pelo menos nesta época e nem por este motivo.

A intensidade do sentimento não permitia que eu deixasse Júnior, principalmente em momento tão difícil da vida dele. Mas a incerteza de ter um futuro com ele e sua família, e o fato de desejar profundamente sair e tirar o meu filho daquela situação de humilhação na qual estávamos passando, foi honestamente falando, a causa de não ter excluído Rafael da minha vida.

Rafael quando queria ser um nojo ele fazia com maestria, mas quando era dócil, baixava qualquer guarda. Mandava muitas fotos do lugar aonde ele morava e eu ficava encantada, pois sempre apreciei a natureza. E além das paisagens muito bucólicas, o que mais mexeu comigo foi a possibilidade de dar um futuro com maior qualidade de vida para o meu filho. Enviava vídeos das possíveis escolas que meu filho estudaria e eu ficava muito encantada, visto que era tudo muito diferente e imensamente melhor das condições que eu e meu filho estava.

Também tinha por hábito mandar fotos de muitas flores e principalmente de rosas que haviam em seu trabalho e dizia que plantaria um jardim só para mim e já falava em "nossa casa". E isso conflitava quando Júnior certa vez me disse que nunca mais daria uma rosa para nenhuma mulher, visto que quando o mesmo enviou para uma ex-namorada sua, a mesma ficou indecisa se fora ele ou os outros contatinhos dela.

Na época, eu achava errada a forma de pensar dele, pois além de generalizar as mulheres, já me deixava claramente na posição de uma mulher que por mais que ele dizia que amava, de não ser merecedora de receber rosas. Por um trauma, ou bloqueio ou o caramba a quatro do seu passado e que eu não tinha nada a ver com aquilo. Imagine se eu resolvesse não me entregar e fazer tantas coisas das quais fiz por Júnior, se ficasse pensando nas "rés" que só havia levado até aquela altura da minha vida? Esse é só um dos episódios que relato, em que os textos escritos por Júnior não cabiam na sua vida e penso que nem na que gostaria de ter, pois quem vê uma chance, jamais pensa em perdê-la. E a atitude que eu esperava de Júnior, infelizmente, vinha de Rafael. Menos os desrespeitos, claro, e a sua falta de limites.

A ideia ainda era muito remota e eu ainda estava muito resistente, mas uma centelha acesa bem no centro da lacuna do meu relacionamento com Júnior, me colocou em posição de cogitar e pensar se não era o meu tão desejado sonho de ter a minha casinha branca. Afinal, eu havia pedido tanto a Deus. Mas, uma casinha branca sem Júnior? Que com todas as observações que fiz a seu respeito, eu ainda o amava como a nenhum outro. Além de não ser dessas mulheres que se desligam tão facilmente quando realmente se conectam com uma pessoa.

Eu estava conflitando entre o que não teria com o Júnior mas queria, com o que teria com o Rafael, mas o que não seria. Com o falecimento do pai de Júnior, era notório que o mesmo se tornaria o patriarca da família e o principal provedor da mesma. Suas responsabilidades aumentariam mais que o dobro e tudo o que eu desejava era poder estar ao seu lado, pois sabia que ele iria passar por momentos de muitas dificuldades. Porém, sua família era altamente ignorante, e na minha concepção, a voz mais ativa tinha que partir do coração do Júnior e não do meu que já havia deixado com grande clareza desde o início, quais eram as minhas intenções.

Algumas pessoas que viam as nossas fotos, chegavam a dizer que parecíamos irmãos, que nossos olhos se alinhavam nas fotos em que nos beijávamos... Eu dizia que ele era a minha alma gêmea, e apesar da doutrina espírita dizer que não existia isso, era a força de maior expressão que eu podia classificar o meu estado de espírito com Júnior. Não tínhamos vícios, bebíamos socialmente, ele curtia Rock e eu nem tanto. Júnior não falava muito do nosso futuro e nem do dele, nenhuma projeção, nada... Era do tipo, trabalho hoje e quem sabe amanhã eu fico rico para assim poder pensar em sonhar algo.

Por outro lado, Rafael tinha a mesma idade que Júnior e era mais novo poucos meses de diferença. Morava em outro estado. Na época morava sozinho com sua mãe de 72 de anos que era extremamente doente . Ele comia ovos cozidos e bolinhos de água e sal. Bebia pouco, uma vez por semana, mas essa única vez, era o suficiente para dar abertura aos seus demônios do mais baixo limbo. Também fumava muitos cigarros e já tinha sido usuário de drogas. Trabalhava em uma empresa do seu irmão e ia com muita dificuldade para o trabalho. Era um jovem depressivo, porém, muito possessivo e ambicioso.

Me ligava umas cinquenta vezes por dia se eu não o atendesse. Era um medroso, mas bem sagaz. Durante as noites me perturbava e só se acalmava quando eu ficava grudada com ele. Por sentir que eu não o amava, exigia o meu término definitivo com o Júnior e eu pedia tempo, mas ele era extremamente egoísta para entender. Isso me confundia mesmo sabendo que seria outro relacionamento tóxico, mas que eu poderia reverter a situação se verdadeiramente quisesse.

Em contrapartida, a inércia e falta de atitude de Júnior em relação ao nosso relacionamento perante a sua família, era proporcionalmente o oposto à voracidade, agilidade, empenho e ansiedade de Rafael para ter uma família comigo e meu filho. Júnior ou era muito metódico ou muito desinteressado, pois nos falávamos duas vezes ao dia por telefone. Se ele me ligasse e por alguma razão eu não pudesse atender, ele não ligava uma segunda vez.

Eu sentia uma mistura de raiva e pena por Rafael, raiva por seu desrespeito para com os meus sentimentos por Júnior, pena porque via que era uma pessoa extremante fraca e perdida espiritualmente falando, além de ser muito carente. Muito confusa e com a mente embaralhada, começou a surgir apesar de muito remota, a ideia de poder ajuda-lo, reabilitando-o e prosseguir com melhores condições de vida com ou sem ele. Voltando quem sabe até em melhores condições para um futuro ainda em aberto com Júnior, dependendo de como os nossos problemas individuais e cotidianos fossem resolvidos com o passar de alguns anos. Sim, essa esperança passou a acender futuramente no meu coração, mesmo sendo tão ousada e tão arriscada.

Muitas coisas me revoltavam na situação em que eu me encontrava naquele momento. Uma entre tantas era com o fato de mesmo estudando em um colégio particular de seus padrinhos, meu filho não se sentia amado pelos mesmos, pois não o procuravam. Sentíamo-nos rejeitados entre nossos parentes e pela a família de Júnior que sonhamos em fazer parte. E foi dentro deste contexto que nos surgiu a possibilidade de viver a paz tão sonhada, a realização de um sonho, um recomeço longe de pessoas que nos fizeram mal ou que nada de bom fizeram. Apesar de não ter entrado de cabeça, entrou sim em minha cabeça a possibilidade da mudança.

Ainda assim todo esse processo de ir contra os meus sentimentos e partir para uma questão mais racional, exigia uma frieza e falta de empatia da minha parte e que não fazia parte da minha natureza. E todo esse conjunto liquidificando a minha mente, resultaram na época e ainda por muito tempo depois em flashbacks perturbadores...

(Continua...)