R A S C U N H O C O N F U S O-C O N V U L S O

Sinto falta de teus ombros escancarados, clamando meu corpo quente, simplesmente meu estar, ali encolhida, com meus pés entre tuas pernas, ou talvez todo meu ser no teu ser.

Agora se faz presente a ausência de teus olhos, calmos, rígidos, certeiros, teus olhos belos, olhos de proteção, olhos cuidadosos e admirados, de uma paixão respeitosa.

Por uma vez só tive a ousadia de soprar-te no ouvido, ainda que baixinho, toda a intensidade de meu amor por ti. Sopro que veio da alma.

Ainda ontem olhei teus dedos, tuas mãos másculas que se incorporavam em meu corpo, tão intensas, que me escarnavam as entranhas, que abriam meu peito de amor e prazer, que recolhiam as cortinas dos meus pudores, que me pegavam como alguém que não pergunta e lançavam tão alto quanto pode para fazer-me ver algo que nuca tinha visto antes: o limiar entre a mais completa ternura e um incêndio que não posso explicar.

Ainda ontem também, pude ouvir tua voz, mesmo que completa de mágoas, ressoando branduras, me amolecendo os pés, me acariciando o rosto, morna brisa partida de ti.

Em meus devaneios oníricos, tu apareces acordado, como um guerreiro, num combate de relâmpagos entre nossos corpos. Desvestes tuas armaduras e enfeitas cada povoado do meu corpo com serpentinas cintilantes. Precipitam então doces partículas de mel, sobre cada recanto do ambiente cor-de-fogo, gosto-de-pele, cheiro-de-nu, cujo ornamento de tua autoria foi minuciosamente planejado antes da batalha.

Então, ao ninar nas sombras de teus relâmpagos, escuto a melodia de tuas asas. Asas que me salvaram de um vôo mortal.

Ainda não tinha sido me dado o momento de dar-te meus beijos inteiros e molhados, porque te dera apenas meus lábios que falam, mas não os que beijam. Não tive o tempo de mostrar-te meu mundo de infâncias sublimes, cor de todas as cores e dono de todos os cheiros, porque o tempo me foi fel, infiel tempo.

Provastes apenas das geleiras de meus encantos. Descalça no vento forte, procurei errante por meus sentimentos congelados, e não senti a culpa, apenas a responsabilidade de soprar, soprar, soprar o quão forte eu pudesse, e o quão rápido, para que tu não cansasses de me esperar ao sol. Tarde demais.

Agora, sinto eu, uma pergunta e você, saudade.

Me afasto espontânea da minha ânsia de estar. Tudo se espreguiça diante de mim. Mal acordo e já me sinto finita.

Se disseres que somos incompatibilidade, digo que excluir-me de explicar o que me era o ato de brincar, e o quão fundamental se faz em meu cerne. Talvez não entendestes mesmo.

Meus cabelos mudaram tantas vezes de cores por ti, assim como meu olhos. E mudaram sim, meus sorrisos esbaldados de desespero, angústia ou de alegria, como elétrons que dão saltos quânticos, porque não somos mais que pura energia, fazendo-se desta forma na vida.

E mais uma vez fui traída ferozmente por meu medo que se esconde em castelos de metal, mas que quando algum ser, como uma borboleta, ou um tigre silencioso sopra sutilmente e o castelo cai, a carne se mostra crua e corre em pavor.

No meu silêncio escondia de ti duas coisas, no qual você denominava de Meu Mistério: meu medo de entregar-me e estragar-me e minha absoluta tentativa de tentar entender-te. É que tentando entender-te, me entendia também, e respeitava teu momento gerado por tuas palavras, mas que muitas vezes não alcançavam teus sentimentos, e compreendia o meu momento. Assim, esse era o meu caminho traçado para incorporar-te ao meu eu, de forma que teu eu fosse meu eu, sem deixar de ser o teu eu e o meu eu seria o teu eu, sem deixar de ser meu eu. Difícil de entender, né? Mais difícil de explicar e mais ainda de se por em prática. Tola, não percebi que te afastava essa minha essência estreitamente científica, mas carregada de sentimentos e espiritualidade. E o que tirei de proveito disso? Entender não é o caminho. Viver sim.

Se aquilo que fui com tanta veemência te violentou, não era minha intenção. Eu só tinha medo de que te perdesses em mim.

Pergunto-me por que o deixei partir? Porque pari muitas de tuas dores, estraçalhei teu sono, corrompi tuas lágrimas e não quis carregar o fardo de mendigar tua glória que eu mesma havia apodrecido. E sim, é preciso coragem para deixar livre aquele que entende como o amor, porque ele, está sofrendo o ato de amar.

Porém aqui, não poderia deixar de dizer que também entendo que essa responsabilidade é nossa. E se posso deixar que enxergues aqui o que eu vi partir de ti, colocarei simplesmente: relutei tanto em não mais, nunca mais, me perder de mim.

Soa como um eco na caverna escura e vazia a ausência de tua alma em minha cama.

Sinto muito, muito mesmo, por não ter alcançado tua estrela.

Com todo o amor que talvez não encenei.

DaliaTerra
Enviado por DaliaTerra em 23/12/2007
Reeditado em 23/12/2007
Código do texto: T789021