Cartas de amores são ridículas
Sei que vai achar estranho, mas era exatamente isso que eu achava depois de uns acontecimentos na minha vida, na adolescência para ser mais específica.
Depois de algumas situações da vida, acabamos nos paralisando de tudo o que nós gostamos e começamos a reparar, mesmo que sem querer, no que os outros dizem, no que os outros pensam e no que eles fazem. Mesmo sem querer, começamos a fazer o mesmo para sermos de alguma maneira inclusos, aprovados, aceitos nos critérios deles. O medo de fazer algo que gostamos começa aí.
Tá! Mas e aí? O que tem a ver com cartas? Tudo! Quando eu era adolescente, sonhava com aqueles amores que duravam a vida inteira, aquela de novelas antigas nas quais mandavam cartas de amor relatando todo sentimento que permeia o coração. Aquele suspiro de apaixonados, aquela coisa quente que vem de dentro. Eu precisava disso, mas tive minha primeira decepção.
Não foi muito longe, foi na família. Para começar a história, minha família tem um apego emocional com primos; minhas tias casaram com primos, meus primos casaram com primas, meus pais são primos e assim por diante. Eu pensei que me casaria com um primo, afinal, todo mundo foi assim, e pensei que fosse com ele, mas me decepcionei feio.
Estou te contando isso para você não desistir das cartas e nem do amor; calma que daqui a pouco você entenderá bem.
Como disse antes, éramos primos e convivíamos entre nós desde crianças, daquelas que não se desapegam nem na hora de dormir. Quando voltei da cidade onde morava, o encontrei, e ele estava grande e forte, era outra pessoa, mas algo me dizia que ele ainda permanecia o mesmo de antes, cheio de amores e desejos.
Era um dia qualquer, estávamos conversando bobeiras na rede, eu, ele e nossa outra prima mais velha. Começou com uns olhares bobos, daqueles que nos envergonham, depois com carinhos escondidos. Na mesma semana, me ensinou a tocar violão e nesse dia especificamente falando, ele me beijou. Não sei se fazia parte da trama, mas aquilo foi um beijo que me mudou.
Depois disso, segui apaixonada por ele mais do que antes, algo ali tinha me mudado para sempre... será que ele queria mesmo algo sério comigo? Aquilo dizia que sim, mas suas ações decaíram com o tempo, como um tempo ruim...
Em outro dia de outras semanas, resolvi escrever-lhe uma carta de amor, fiz com todo carinho do mundo falando todos os meus sentimentos que não poderiam ser ditos com ele me olhando de cima a baixo. Sentiria vergonha. Estavam todos lá, minhas tias e minhas primas, alguns conhecidos e ele. Ele em cima de uma moto conversando alto como toda família fazia.
Cheguei de mansinho, mas ninguém percebeu, ninguém percebia quando chegava porque eu era a invisível da família, ou pelo menos era isso que eu achava. A boca tremia, o coração afundava em medos sem fim e estava batendo na garganta, ardendo sem parar, e mesmo assim, com medo, eu fui.
Me encostei nele e pus a mão para a frente com o pequeno papel escrito em uma embalagem daquelas fofinhas de filme de romance, e ouvi um som sarcástico saindo da voz dele. Não o conhecia mais. Ele pegou o papel e olhou um pouco, parecia que ocorria na câmera lenta, ele jogando o papel no chão e falando "eu lá quero por** de carta", todos olhavam fixamente para nós como se não entendessem nada do que havia acontecido ali, e eu muito menos. Estava travada nos meus sentimentos pisoteados de uma maneira terrível, e foi ali que tudo começou.
Corri para casa sem chão, com a sensação de que tudo desabava em cima de mim, minha boca tremia, meus olhos não brilhavam mais, eles estavam cansados e assustados com o sentimento de rejeição. Meus olhos doíam e ardiam de uma maneira inquietante, e meu coração estava em pedaços, sentada na calçada eu chorava sem parar desamparada.
Não lembro como cheguei em casa tão calma, normalmente agia de uma forma que ninguém notava, se notava ou não, ou se eu era boa em esconder as coisas, nunca vou saber.
A partir dali criei um vazio em mim e declamei que todas as cartas eram ridículas, ridículas de serem feitas tão perfeitamente e entregues ao caos e ameaçadas como laranjas podres no carro do lixo. Ridículas ao ponto de me fazer chorar e quebrar meu coração de uma maneira tão ridícula, ao ponto de me fechar para qualquer situação de amor que me visse pela frente. Ridículas ao ponto de não me interessar por amores de novelas, cartas escritas de uma forma tão doce, mas que naquele momento só sentia o amargo das situações jogadas a mim de cabeça fora. Ridículas ao ponto de não me permitir escrever mais nenhuma.
Se estou escrevendo isso, declamando como uma carta... Não sou ridícula porque os tempos passaram e entendi que as cartas não são ridículas e os amores também não e muito menos as novelas de cartas de amores. Ele sim que era ridículo e ele quem me magoou e me fez duvidar das minhas próprias verdades. Ele sim era ridículo, e o meu amor por ele também.