Um ano em Pereirópolis VI - "As barreiras do espaço-tempo"

Vi uma notícia há pouco no telejornal – sim, eu assisto telejornal... – que me deixou apavorado: aquelas maquininhas de colar etiqueta de preço estão de volta aos supermercados. Comecei a sentir uma vertigem, como se as paredes começassem a virar gelatina, luzes piscaram, o chão tremeu e me senti de novo em 1987. Eu juro que vi um senhor com um bigodinho dizendo “brasiléiros e brasiléiras” na televisão. Juro que ouvi coisas como “inflação galopante”, um termo mais antigo que o hit “Entre tapas e beijos” da dupla Leandro (que Deus o tenha) e Leonardo. Me senti com sete anos, quando distribuíam-se os “tiques do leite”. Eu não lembro de nada que acontecia na política e na economia da época, mas sei o que é viver com inflação, e não ter idéia de quanto custam as coisas no mercado, porque o preço era sempre mais alto que o dia anterior (às vezes, até mais alto do que era horas antes). Se for para voltar ao passado, eu preferia que voltássemos para uma época mais feliz.

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Mas falando em voltar no tempo, em Pereirópolis existem localidades aonde os visitantes dizem “Que lugar encantador!”. Um desses lugares é a Estrada Vinte e Cinco de Julho, ou apenas Linha 25. Mais que encantador, esse lugar é encantado. E não é só pela beleza da paisagem, um belo pedaço de mato nativo, muito parecido com a vegetação da Serra Gaúcha, mas muito mais parecido ainda com a Floresta Negra de Württemberg. E também não é por causa do clima exótico – eu diria alienígena – que, quando é verão está frio e o chão está coberto de neve, e em junho, quando era para começar o inverno, brilha um gostoso solzinho de fim de primavera. A Linha 25 estacionou em 1888, e isso não é uma metáfora.

A única coisa desagradável é que pouquíssimas pessoas conseguem ver ou interagir com seus habitantes: os colonos alemães. Sim, os originais, que estão lá até os dias de hoje, vivendo exatamente do mesmo jeito que se vivia no século XIX. Os afortunados que conseguiram atravessar barreiras metafísicas e percorrer as estradas embarradas, voltaram de lá trazendo salames, cucas e alguns barris da melhor cerveja artesanal do mundo.

Também são raros os moradores da comunidade que saíram de lá. A propósito, a única pessoa de minhas relações que nasceu nesse lugar chamava-se Fritz. Era um jovem aventureiro cujas posses resumiam-se a um cavalo falante, um acordeão e um retrato do Kaiser Guilherme I. Fritz casou-se com uma china paraguaia que amava os Clássicos Latinos. Dessa união nasceu um menino tipicamente pereiropolitano, mistura do sangue europeu com o dos bugres. Seu nome é Horácio Ritter.