A Casa - Aviso Noturno

Toda vez que aparecia um primo lá em casa era uma festa. Correria, traquinagem, coisa de menino espoleta... Melhorava ainda mais quando insistíamos com as tias para que os primos dormissem por aqui e muitas vezes elas respondiam:

- Mas não tem escova de dente e nem roupa...

- Escova com o dedo – falava com a cara mais lambida – eu empresto minhas roupas...

Acabava que de tanto encher o saco as tias deixavam os primos dormirem aqui em casa.

Um dia desses vieram dois irmãos, e mais uma outra prima dormir aqui. Depois de um filme bem leve, fomos pegar mais um colchão no "quarto abandonado", como costumávamos chamar, para um dos primos, pois os outros dois necessários estavam debaixo do meu colchão, o que facilitava muito.

Lá no quartinho, quando peguei o colchão, tive a impressão de ver alguém me chamando para o fundo daquele quarto, o que significava frio nas espinhas e cara arregalada. Tirei os óculos na esperança de embaçar a imagem, mas piorou, virou um borrão nítido que agitava os braços freneticamente...

Puxei o colchão com força, fui arrastando até o meu quarto, já todo arrepiado.

Estendi o colchão lá no meu quarto, o que seria o quarto dos homens, enquanto a minha irmã estava lá no quarto dela com a minha prima. Fechamos a porta para poder falar mais a vontade. Conversamos sobre muitas coisas, principalmente para eu esquecer a visão que tive ainda há pouco. Não quis comentar com ninguém, pois muitas vezes o nosso orgulho é tão grande que preferimos comentar quando estamos a dois, e se os dois vissem a mesma coisa (o famoso você viu isso?)...

O tempo passando e o sono vindo devagar até que nós três capotamos, mas fui acordado por um chamado.

Acordei assustado olhei para o lado e meu primo de pé pulando no colchão...

- Me ajuda a pegar esse vaga-lume?

Olhei e não vi nada.

- Vaga-lume?

-É... Está me atrapalhando a dormir

Coloquei os óculos, fiquei caçando o maldito vaga-lume sem nem ter noção naquela época de que meu primo era sonâmbulo. Até que de repente meu primo para olha para seu irmão dormindo do seu lado e diz:

- Ali, pousou em cima do meu irmão.

Quando olho para o outro, vejo uma mão saindo do peito dele, provavelmente da mesma pessoa que eu vi no quartinho abandonado. Olhei de novo para meu primo e perguntei

- Você está realmente vendo isso?

- O vaga-lume?

- Não, a mão...

- Para de tirar sarro – falou e deitou na cama caindo em um sono como se nem tivesse acordado.

Volto a olhar para o outro primo e a mão saindo cada vez mais, apontando para a porta. Não gritei por que faltou voz que deve ter saído correndo de mim. Fiquei só naquele instante. Até que pensei “ou eu vou até a porta ou acordo um deles e peço ajuda”, mas não deu tempo de fazer nada.

A porta do meu quarto abriu violentamente e aparece a minha prima branquinha.

- Deixa-me dormir no seu quarto?

- O que aconteceu?

- O quarto da sua irmã faz barulho como se alguém quisesse entrar pelo lado de fora.

- Tudo bem pode ficar sim!

“Que bom”, eu pensei... "Agora pelo menos eu tenho alguém que está mais branco que eu". Olhei para o meu primo e nada da mão.

Passada algumas horas, percebi que o tempo passou rápido demais para eu perceber, e ao mesmo tempo não conseguia dormir até que:

- Psiu... – era a minha prima

- Que é?

- Você está dormindo?

- Não.

- Você está escutando a porta da sua irmã?

Fiquei em silêncio e realmente escutei aqueles “nheeeeec”, como se alguém balançasse a porta o tempo todo, para lá e para cá.

- Deve ser o vento – eu disse para acalmar a minha prima, mas eu estava tão gelado quanto ela.

- Você a fecha pra mim?

- Vai você, já que está mais perto...

Nenhum de nós teve coragem para levantar da cama. Um barulho mais abafado chegou em nosso ouvido, parecia que alguém havia deixado cair alguma coisa... E novamente, quando olhei para a porta, lá estava a figura que eu já havia visto duas vezes naquele dia.

- Você escutou o barulho?

Não respondi, estava sem voz de novo. Minha prima deve ter pensado que eu havia dormido, e virou para o outro lado e tapou a cabeça. Para completar a noite meu primo fala novamente:

- Não precisa levantar mais!

Minha prima descobre a cabeça, olha pra ele. Eu olho pra ele e ele com os olhos abertos olhando para o teto. Ele fala outra coisa que não consegui entender e depois fecha a cara e os olhos. E dessa vez fui eu quem chamou minha prima:

- Você está dormindo?

- Não vou conseguir

E não conseguimos, mas pelo menos não aconteceu mais nada naquela noite.

No outro dia, todo mundo estranhou o porquê de minha prima estar no meu quarto e meu pai estava super nervoso porque eu havia esquecido a porta do quartinho abandonado aberta e alguém havia entrado lá e roubado não sei o que (o objeto roubado estava lá no fundo)... Minha prima olhou pra mim e perguntou se eu havia escutado um barulho à noite e eu disse que sim. Ela ficou mais calma e ligou os fatos ao gatuno que apareceu naquela noite.

Para eles, um ladrão... Para mim um aviso...

Ferrachi Abdtzen
Enviado por Ferrachi Abdtzen em 05/12/2008
Reeditado em 07/12/2008
Código do texto: T1319562
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