O Pindoba
Aqui, na minha cidade, existe uma lenda intrigante. Não sei bem se é uma lenda, um caso histórico ou crença religiosa, talvez um pouco disso tudo.
Diz-se que antigamente, quando as fazendas eram terras a perder de vista, um rico fazendeiro, senhor de escravos e que era tratado por coronel tinha entre os seus, um negrinho apelidado Pindoba.
Como o negrinho era esperto, o tal fazendeiro deixava que ele ficasse ajudando dentro da casa, arriando cavalos para o patrão, engraxando as botas do coronel, tratando das criações; e sendo poupado do envio ao sobre-humano esforço do trabalho na roça de café.
Acontece, que o tal negrinho, um dia, foi acusado de ter se engraçado com a filha do coronel, chegando a beijá-la, com o consentimento dela, é claro.
O coronel, sabendo do acontecimento, mandou três de seus capatazes amarrarem o negrinho em anca de burro e arrastarem por algumas léguas, e terminarem o serviço bem longe dali.
Os capatazes assim o fizeram, e chegando a uma mata densa, procuraram uma clareira, onde notaram um enorme formigueiro de lavapés. Com Pindoba ainda esboçando vida, fizeram um enorme buraco no chão, e enterraram-no bem no formigueiro, deixando apenas a cabeça do negrinho de fora. Passaram melado no rosto do pobre coitado e deixaram as formigas lavapés fazerem o serviço.
Diz-se que após alguns dias, apesar de terem sobrado apenas alguns músculos numa face semi-devorada, Pindoba permanecia vivo.
Seu sofrimento foi inenarrável, já que ele agonizou cheio de dor até o último sopro de vida.
O povo daquela época, ao passar por uma estrada próxima ao local, conta em antigos escritos que até o mais valente dos varões, chegava de cabelo em pé em casa depois de presenciar coisas estranhas naquelas bandas. Várias vezes ouviu-se histórias de gente que teve o cavalo chicoteado, sem ter ninguém por perto; ouviam vozes, choro, gritos e ficavam apavoradas, alguns não ousaram falar nunca mais sobre os mistérios do lugar.
Hoje, no local que dizem ser o mesmo do ocorrido, ergueu-se uma capela, já que muitas pessoas passaram a atribuir milagres ao escravo Pindoba.
Todos os anos, no dia de São Sebastião, é organizada uma caminhada que percorre dezoito quilômetros, simbolizando o percurso que Pindoba sofreu sendo arrastado amarrado em anca de cavalo e reza-se um terço na capela, que marca o local do sofrimento de um inocente.