SABER EM PEDRA

Gostaria que esse texto tivesse um estilo naife, não sei se pode.

O certo é que estava tentando puxar assunto, entabular uma conversa com o sujeito, quando me falou que, quando era criança, gostava de ler. O senhor sabe o que é sabão em pedra?, sim, sei. Então, quando era criança, minha mãe me levava na venda pra comprar sabão em pedra, então o homem lá da venda pegava um pedaço de jornal, de uma pilha que ficava no chão, e embrulhava o sabão, ele vinha todo enroladinho até chegar em casa.

Depois que minha mãe desembrulhava, eu pegava o pedaço do jornal e lia ele todinho, as letras, os desenhos, as figuras; depois de ler tudinho eu guardava ele numa pilha, junto com os outros, tudo com aquele cheirinho de sabão em pedra. De vez em quando eu pegava um deles e voltava a ler, era bom. Depois, minha mãe morreu.

Quando era criança ele gostava de ler. Aqueles pedaços de jornal rasgado eram seus livros infantis. Morava na roça, a escola ensinava bem pouco, feito hoje, mal sabia soletrar, mas fico imaginando o tanto que esperava e torcia para que o sabão em pedra findasse pra que pudesse ganhar mais um pedaço de jornal, mais um livro infantil. E ao chegar na venda, talvez observando, meio que por detrás da saia da mãe, qual pedaço o homem retiraria da pilha, ou um com muitas letras, ou cheio de figuras, ou mais parecido ou bem diferente dos que já tinha em sua própria pilha.

Do sabão em pedra ao saber em pedra, feito essas que a gente encontra largadas nas ruas. Ele nasceu e mora em São Francisco Xavier, lugar onde acontece anualmente o festival da Mantiqueira, encontro de escritores e literatura, coisa que ele não sabe e nunca ouviu falar.

Pois é.