O Rádio

Num dia de setembro de 1956 meu pai chegou a nossa casa trazendo um rádio e o instalou num canto da sala de visita. Cercado pela mulher e os filhos ele ligou o aparelho que demorou alguns segundos para funcionar. Antes, avisou que o rádio precisava de um tempo para esquentar. De repente, um sorriso vitorioso apareceu no seu rosto. O rádio chiava. Logo depois, ouvimos indistintamente uma música no meio da estática. E, à medida que o meu pai girava o botão na tentativa de sintonizar a emissora, a música ia aumentando de tom, encorpando-se. Depois, ganhou volume e todos nós, alimentados por uma imensa alegria, ficamos fascinados ante aquela maravilha da eletricidade.

Inicialmente, só os adultos podiam usá-lo. Havia o medo de que as crianças pudessem tomar choques ao manuseá-lo. Com o tempo, porém, o radio deixou de ser proibido para nós e então, passamos a ter acesso a ele e até escolher nossos programas favoritos. Na verdade, passou a fazer parte de nossas vidas e devo dizer que se tornou uma necessidade.

Era a maneira mais rápida de ficar em contato com o mundo e, principalmente, com o Rio de Janeiro, sede das melhores emissoras de rádio do Brasil. Havia as radios Nacional, Tupi, Tamoio e Marink Veiga. Mas a Radio Nacional era a preferida. Nela, encontravam-se os melhores programas de músicas, radionovelas, além da melhor transmissão dos jogos de futebol, esporte que tanto gostávamos.

Os programas preferidos do meu pai eram o de Luís Gonzaga, o Rei do Baião e o Repórter ESSO. Ele não o perdia por nada, as noticias do Brasil e do mundo. Nesta época, o Brasil vivia sob impacto do inicio da construção de Brasília e todo mundo queria saber as noticias da cidade que começava a surgir naquele ano de 1956.

O programa de Luiz Gonzaga, nós ouvíamos juntamente com o meu pai, e não me esqueço do jeito que ele ficava ao ouvir as músicas do Rei do Baião. Ora cantarolava ora assobiava, batucando com o indicador da mão direita na mesa. E durante um bom tempo, após o fim do programa ele ainda continuava cantando, principalmente, as músicas que ele mais gostava.

As mulheres preferiam as radionovelas. Oito horas da noite e todas ficavam ao pé do radio, emocionadas, algumas choravam até. Havia ainda uma novela na Rádio Nacional, chamada Jerônimo o Herói do Sertão que era a preferida das crianças. Passava diariamente às seis horas da tarde, com exceção do Sábado e Domingo. Presos nas cadeiras, diante do rádio, atentos e silenciosos, nós acompanhávamos passo a passo as aventuras de nossos heróis, Jerônimo o Herói do Sertão e o Moleque Saci, seu ajudante, na luta do bem contra o mal. Eles enchiam os nossos sonhos de fantasias, e até modificaram nossas brincadeiras.

A novela invadiu as nossas vidas e transformou inteiramente as nossas fantasias de criança, de tal forma, que em nossas brincadeiras foram incluídas a representação das principais cenas dramáticas do dia. Todos, porém, queriam ser Jerônimo o Herói do Sertão ou Moleque Saci os principais mocinhos da trama e sempre vitoriosos. Ninguém queria ser os bandidos.