BOIOLA BRIGÃO

Depois de fazer a costumeira caminhada pela manhã, recebi a incumbência de comprar alguma coisa já pronta para o almoço, uma vez que era domingo e, conseqüentemente, folga da secretária doméstica.

A manhã estava ensolarada, um convite generoso para os apreciadores de praia.

Tirei o carro da garagem e fui até Camburi. Como eram onze horas, resolvi estacionar nas proximidades do Clube dos Militares. Com dois objetivos: um, de olhar as beldades que freqüentam aquela praia; outro, de jogar conversa fora com um amigo que vi em pé no calçadão e com o qual não falava já fazia tempo.

Depois dos cumprimentos, passamos a falar sobre os mais diversos assuntos. Resolvemos problemas internacionais, nacionais, locais, enfim pusemos em dia os temas que estavam em suspenso, sem, é claro, deixar de prestar atenção nas belezas femininas que desfilavam com classe e rara elegância, exibindo os seus corpos bem delineados e bronzeados, numa clara evidência de que, ao contrário dos lamentáveis acontecimentos políticos, nada têm a esconder.

Em dado momento, porém, uma forte frenagem de um veículo atraiu a nossa atenção. Do carro que freou, saltou um sujeito esbaforido e caminhou em direção a um outro veículo em que estava um casal. O cara tanto rebolava como desmunhecava. Corrigia sem parar os longos e desalinhados cabelos. Os seus trejeitos eram seguidos de palavras de baixo calão. Enfim, o seu descontrole era total. Já o casal, que continuou dentro do carro, nada dizia, mas demonstrava estupefação.

Um garotão que passava, ao perceber aquele imbróglio, parou, saltou do carro e caminhou em direção ao espetáculo, gritando:

--Zaqueu, Zaqueu, Zaqueu, você se meteu em outra ? Para com isso.

--Não paro, não paro, não paro – dizia Zaqueu, desmunhecando as duas mãos ao mesmo tempo. Eu vou matar esse bofe, quer ver ?

Zaqueu se dirigiu ao seu carro, no que foi acompanhado pelo garotão, que usou de todos os recursos para impedir que o boiola praticasse um desatino.

--Zaqueu – disse o garotão – pelo amor de Deus, você tem arma aí no carro ?

--Tenho sim, tenho uma pistola.

Neste momento eu olhei para o meu amigo, que olhou para mim e pensamos juntos: -pistola, que cretino!

Mas a verdade é que o garotão conseguiu, com muito sacrifício, mas com competência, “dobrar” o “valentão”, retirá-lo do local, evitando, assim, um desfecho desagradável.

Zaqueu reclamava de que o bofe com o qual estava irritado teria feito uma direção perigosa, em conseqüência do que quase o jogara para fora da ponte de Camburi.

Bem, como entre mortos e feridos todos escaparam, despedi do meu amigo e fui, bem devagar, até o final de Camburi.

Às 12h30m entrei no “SÓ NA BRASA” e qual não foi minha surpresa quando me deparei com o Zaqueu, um pouco mais calmo, mas rebolativo da mesma maneira. Chegava até a esbarrar nas mesas ao passar por elas.

Ao ser atendido por um funcionário da casa, perguntou se tinha frango assado e, obtendo resposta afirmativa, perguntou Zaqueu:

--Os frangos são grandes ou pequenos ?

--Temos grandes e pequenos. Temos, também, galetinho, pouco maior do que um pinto.

--Pinto! Ai que bacana. Pinto – repetiu Zaqueu. Me dá um.

--Mais alguma coisa ? – indagou o funcionário.

--Tem tropeiro ?

--Tem, sim. Vai querer uma porção ?

--O que vem no tropeiro ?

--Ovo, torresmo, cebola, tempero verde, lingüiça...

O funcionário não terminou de enumerar os ingredientes que compunham o feijão tropeiro, pois quando falou em lingüiça o Zaqueu deu um gritinho, acompanhado de um pulinho, fez um trejeito e disse que queria, sim, uma porção.

--Quero também uma salada, é possível ? Pode dar uma sugestão?

--Pois não. Sugiro uma salada mista – disse o funcionário.

--O que compõe a salada mista ?

--Tomate, alface, brócolis, rúcula, chuchu, cenoura, etc. Ah! Posso colocar pepino também.

--Nossa! Maravilha! Ponha inteiro, de preferência.

Fiz a encomenda e enquanto esperava comecei a ingerir uma latinha de cerveja, porque, afinal, ninguém é de ferro.

Lá pelas tantas o caixa chamou o baitola e lhe fez entrega do pedido, recebendo um cheque como pagamento.

--Senhor – dirigiu-se a mim o caixa – faz favor. Que estranha coincidência, dizia ele. O freguês, sem qualquer dúvida, é bicharoca; o carro dele, olha lá estacionado, um reluzente Picasso (vige!) cuja placa termina em 24; a conta dele deu 24 reais e o número de série do cheque dado por ele (ou ela?) termina em 24.

--O pior - disse-lhe eu - é que a boiolagem não termina aí. Sabe quanto do mês é hoje do mês?

--Vinte e quatro – murmurou o caixa.

levy pereira de menezes
Enviado por levy pereira de menezes em 08/11/2006
Código do texto: T286052