ASSOMBRAÇÃO SABE PRÁ QUEM APARECE

Coimbra e Funaro saíram de Mariana, terra natal, para estudar em Belo Horizonte, capital do Estado.

Um cursava na Faculdade de Farmácia e o outro na de Educação, ambas na UFMG.

Aos fins-de-semana, retornavam à cidade para o convívio de seus familiares e de seus amigos., deixando sempre no ar uma ironia por estarem estudando em Belo Horizonte

Dona Dejanira, muito preocupada com os filhos, sempre pregava palavras de Deus, pedindo proteção aos meninos.

Na segunda-feira, pela manhã, uma matula era preparada para que os meninos trouxessem para passar a semana. E uma oração sempre saía;

_ Vão com Deus meus filhos! Peguem com Deus, sempre! Repitam comigo o Salmo 23: ”O Senhor é meu Pastor e nada me Faltará”

_ Ôh, Glória! Ôh, Glória!

E os meninos pegavam o ônibus e deixavam Mariana.

Certo dia, rolou uma história, na cidade, de que algumas almas estavam aparecendo no cemitério municipal. Os garotos ao chegarem lá, começaram a zombar da conversa;

_ Você ouviu o que estão falando por aí, Funaro?

_ Sobre as aparições, Coimbra?

- Sim! Estão dizendo que as almas estão de prosa, à noite, lá no cemitério.

Dona dejanira de nada gostou do tom zombeteiro de seus filhos e foi logo dizendo:

_ “Não se deixem enganar: de Deus não se zomba …” Está no capítulo 6, versículos 7 e 8, meus filhos! Todo cuidado é pouco com as coisas e palavras de Deus!

_ Ôh, Glória! Ôh, Glória!

Os irmãos não se dando por satisfeitos, resolveram ir, à noite, no cemitério para testemunharem que a aprição era uma lenda.

Caminhando bem de leve por entre as sepulturas, pararam a uns cem metros da portaria.Olhando para trás, já não se via uma viva alma.

_ Não olhe para trás não, Coimbra!

_ Por quê, Funaro?

_ Lá, no Morro Vermelho, dizem que na “Procissão das almas”, quem olha para trás, vira pedra!

_ Que bobagem é essa, Funaro? Aqui é Mariana! E não há “Procissão das almas”, alguma! Deixa de ser tolo! Olhe para frente!

_ Éh! Aqui não é Morro Vermelho, não. Não há procissão alguma, mas estamos dentro de um cemitério, à noite, e com duas sombras se mexendo ali na frente, Coimbra!

_ Deixa de besteira, irmão! “À noite todos os gatos são pardos”; ou seja, todas as criaturas são pardas, à noite. São muitas sombras.

_ Só que, meu irmão, será que as sombras se mexem? Pois aquelas ali estão se movimentando. Parecem mais criaturas, não do aquém, mas do além. Julgo que aquelas sombras já se converteram em assombrações; mudaram de grau!

_ Fique quieto e vamos chegar mais próximo, Funaro!

Os dois começaram a caminhar e se esconderam por detrás de um mausoleu e fixaram suas atenções no fato.

_ Sombra fala, Coimbra?

_ Que eu saiba, não Funaro!

_ Pois então estamos diante de almas penadas! Estou com medo!

_ Silêncio! Se elas estão conversando, vamos ouvir o diálogo!

E passaram a ouvir o que aquelas criaturas estavam confaulando.

_ Estou com dores nos quartos. Não temos por entre nós, ninguem que sabe manipular drogas; que saiba fazer remédios.

_ Éh, verdade! O que sinto falta é de alguém conhecedor das letras. Aqui, a única coisa que lemos, é o que está escrito nas lápides.

Os irmãos Coimbra e Funaro se esconderam rapidamente por detrás da sepultura e ficaram pasmados por alguns momentos.

As criaturas do outro mundo continuavam a conversa descontaridamente:

_ Seria interessante virem dois que sejam enterrados separadamente, pois assim teriam mais valor – suas almas - para nós.

_ Pois sim! Dessa forma, quando um quisesse descansar, um outro poderia sair para prosear conosco. Em sepulturas separadas, as almas têm mais valor.

Não precisaram ouvir mais nada. Coimbra e Funaro saíram a galope por detrás do túmulo como se fossem uma ventania.

Mas o que eles não esperavam, é que o coveiro, durante o dia, abriu uma cova, aproveitando as horas livres, adiantando seu serviço, para não ser tomado de surpresa num falecimento de alguém.

_ Tibummmm!

Cairam os dois na mesma cova e com a queda, desfaleceram.

Passados alguns minutos, aos poucos, foram recobrando os seus sentidos e percebendo o que havia se passado.

_ Coimbra! Gritou Funaro

_ Diga aí, meu irmão!

_ Eu morri, Coimbra?

_ Não sei!

_ Será que estou vivo, Funaro?

E eles começaram a se apalparem procurando tato. Quando de repente, Funaro grita:

_ Sai prá, Coimbra! Estamos dentro de uma cova! Sai prá lá que quero ficar sozinho.

_ Mas por que você quer ficar sem a minha presença, Funaro?

_ Uai! Você não se lembra que as almas queriam um em cada sepultura? Então! Quero que minha alma seja mais valiosa!

E nisso, Dona Dejanira, dando fé da ausência de seus filhos saiu à procura deles, indo até o cemitério, conforme orientação de sua vizinha.

Chegando à beira da cova, a mãe estendeu a mão a eles e dizendo-lhes:

_ A bíblia diz em Provérbios 21, versículos: 23-24 que:

“ O que guarda a boca e a língua guarda também a sua alma das angústias. Quanto ao soberbo e presumido, zombador é seu nome.”

_ Ôh, Glória! Ôh, Glória!

Eles se levantaram e foram para casa ouvindo sua mãe dizendo-lhes, caminho afora:

_ “Não vos enganeis: as más conversações corrompem os bons costumes”. Está em Coríntios, 15:33

_ Ôh, Glória! Ôh, Glória!

_ Êh! Êh! Êh! Êh!

_ Ôh, Glória! Ôh, Glória!

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