O FUNERAL
O Funeral
Vou narrar aqui uma história verídica, aconteceu de verdade numa cidade onde nasci, no interior do estado de São Paulo, que tem o nome de Flórida Paulista.
Na época eu tinha 11 anos e a cidade era pequena (ainda é), pacata, bonita, onde praticamente todos se conheciam.
Alguns moradores mais engraçadinhos diziam que era uma cidade de primeira, pois bastaria um motorista engatar a segunda marcha para já sair da cidade rapidinho.
Ela era uma cidade pequena, mas ajeitada. Saiam da praça principal
as principais avenidas da cidade. Uma que ia para a estação de trem,
outra que ia para a Santa Casa e outra que era a avenida de entrada
e saída principal da cidade e também uma que seguia até o cemitério.
Estou narrando isso, porque a história que vou narrar se passou
exatamente neste trajeto do centro da cidade para o cemitério.
Na cidade, somente os mais ricos possuiam telefone. O telefone
mais utilizado era o grito, era uma gritaria danada de um vizinho
de uma janela chamando, gritando ou conversando com o outro.
Era assim dessa maneira, sem necessidade de telefone.
Cresci e me acostumei, ouvindo essas gritarias, mas no fundo
eu até gostava porque também acabava sabendo da vida de
todo mundo, o que é ainda normal em uma cidade pequena.
De todas as avenidas, duas eram as principais, onde ficavam os comércios e claro, o Bradesco e as Casas Pernambucas.
Se em uma cidade não existissem estes dois, não poderia ela ser chamada ainda de cidade.
O Centro da cidade ficava em um local alto, onde existia uma linda praça e na parte central um lindo chafariz. Uma grande igreja que ficava fora da praça, e ao redor próximo à praça e a igreja tinha um Hospital, a Casa de Saúde (apesar de pequena, eram dois
os hospitais da cidade). Algumas casas belas de pessoas mais abastadas, ficavam tudo ali na área central da cidade onde tinham as casas mais lindas de serem admiradas na cidade. Até o prefeito
morava nas proximidades.
Já o cemitério ficava no outro lado da cidade, em um local também alto.
Cemitério! Por que aqui estou citando o cemitério? Bem.... o caso que irei narrar se refere exatamente de um funeral rumando ao cemitério.
Esse caso é real!
Havia falecido dona Lula, uma professora que já estava aposentada,
mulher muito querida pela população da cidade, foi uma professora estimada pelos seus alunos, sendo até uma vez candidata a prefeita, não se elegendo por um voto. Dizem todos ainda na cidade que houve fraude naquela eleição.
Que coisa, não é? Desde àquela época já existia esse tipo de procedimento.
Nunca vi tanta gente em um funeral, vieram pessoas até de outras cidades para o enterro.
Vou tentar explicar como foi o acompanhamento do enterro....
Havia um caminhão que servia sempre como transporte até o cemitério. Em cima do caminhão ia o caixão com o corpo da dona
Lula e ao lado do caixão, o padre Josias. O padre ficava de costas para a cabine do caminhão e de frente para o caixão e também
para o povo que ia em sua maioria acompanhando tudo a pé.
Alguns que tinham carros seguiam na frente do caminhão.
Eu achava bonita essa formação....os carros na frente, o caminhão logo atrás, as senhoras de negros véus e os senhores sem os seus habituais chapéus, depois a bandinha e logo atrás o povo acompanhando.
Então seguia tudo naturalmente assim, umas senhoras de negros véus
e senhores sem os seus chapéus todos rezando, a bandinha tocando
e depois o povo sem tropél, alguns rezando e outros simplesmente caminhando e a tudo observando. Eu era um desses.
Vou voltar para o acompanhamento do enterro....
O padre Josias em cima do caminhão ia conduzindo e rezando: AVE, AVE, AVE MARIAAAA!!!
As senhoras dos negros véus e os senhores sem os seus chapéus repetiam: AVE, AVE, AVE MARIAAAAAA!!!
E assim, rezando e cantando todos seguiam o caminhão rumo ao cemitério.
O caminho rumo ao cemitério era assim. Havia uma descida imensa e
depois uma pequena subida e já era a entrada principal do cemitério.
Assim que o caminhão e o povo tinham acabado de descer e começava
a subida para a entrada do cemitério, o padre Josias notou que descia um pequeno ônibus (que chamávamos de jardineira), no mesmo sentido em que estava o caminhão e do povo que o seguia.
Pela ampla visão que ele tinha de cima do caminhão, ele percebeu que pela velocidade desenvolvida pela jardineira, provavelmente ela teria perdido os freios.
O padre Josias, nervoso e desesperado para avisar a aquela multidão
do perigo, visto que ela se encontrava rezando e de costas para a jardineira, gesticulou e gritou:
A JARDINEIRAAAA!!!
A bandinha imediatamente obedecendo a condução do padre Josias,
começou a tocar e o povo feliz a cantar:
Ó jardineira por que estás tão triste.....
Claro que não chegaram ao final da música.
Nesse dia aconteceu na cidade o maior atropelamento coletivo jamais visto na região. Claro, comigo não aconteceu nada. Somente passei por imenso susto mesmo, pelo barulho e gritaria e também por
causa de um chapéu que voou para a minha cabeça e encobriu toda
a minha visão. Por isso que eu não vi muita coisa naquele exato momento.
Não morreu ninguém a não ser a dona Lula que já estava morta dentro do caixão.
Reafirmo aqui. Este caso é real! Claro que pela minha idade na época posso até não ter narrado tudo direitinho, mas o que as minhas lembranças e o que ouvi depois do povo (claro que sempre existem exageros), me permitiu a narração desse fato muito real mesmo.
Até hoje o povo ainda conta esse caso aos seus filhos, netos, amigos, etc.
Antonio Pizarro