ZEREFINO DA BURRA

ZEREFINO DA BURRA

Thereza Poesia

Todo “bixim de urêia” que vivia mas imediações de Santa Cruz do Imbuzeiro, conhecia, ou sabia quem era Zeferino da burra. Braço direito( e esquerdo) do Dr. Clodovil , sujeito rico e de família tradicional, prefeito a cidade, casado com a mulher mais bonita(ele era baixinho, careca e feio de dar dó), que não dava um passo,nem pra frente e nem pra traz, sem o respaldo e a segurança do seu escudeiro Zeferino, que diga-se de passagem, era mais conhecido como Zeferino da burra de Clodovil.

Era sujeito simpático, falava com todo mundo, dava uma de cabo eleitoral do prefeito e era respeitado entre os mais humildes como se fora ele próprio, parte integrante daquela família.

Mas queimava as sete turbinas se alguém lhe chamava “da Burra”. Ele apreciava ser Zeferino de Clodovil, mas esse apelido, lhe perseguia há muito tempo, ninguém se lembrava mais quem o havia dado, mas todo mundo, logicamente, pelas costas, era assim que a ele se referiam.

Eu e mais dois sonhadores iguais a mim, resolvemos fundar um jornal semanal na cidade de 25.000 habitantes aonde quase não acontecia nada e sempre acontecia tudo debaixo dos panos. Resolvemos fazer uma matéria sobre os apelidos curiosos do povo da redondeza. Olhe que não eram poucos: Fugão, Juvenal pé de quenga, Alexandre guelão,Lobinha, Chico Priquito, Frei chinelo, Maria taboca, e por aí vai, até que chegou a vez de Zeferino da Burra.

Tentei uma entrevista com o referido alcunhado e ele não quis falar sobre isso, então o jeito foi tentar saber dos mais antigos da cidade, de onde veio “da burra”.

Fui procurar dona Tica, vizinha da família de Zeferino por toda vida.

-Dona Tica, me conte, a senhora sabe de onde vem o apelido de seu Zeferino da burra?

-Hi, mia fia, derna que eu me entendo de gente que o povo chama ele assim. Dissero que o pai dele drumiu cum uma burra e que a burra ficou prenha, mas a mulé dele tombém tava prenha e as duas deram cria no mermo dia.Correu buato que o fio a burra tinha nascido morto com a cara e o coipo de uma criança de gente, mas outros dissero que quem morreu foi o fio da mulé, e truvero o minino que a burra teve e punharo nos braço dela. Eu só sei que o coitadim derna pequeno, se chama assim.

Saí da casa de dona Tica mais confusa do que entrei. Escutei tudo estupefata, mas confesso que é uma história meio difícil de se acreditar.Dona Tica era a mãe de santo da cidade, todo mundo tinha um pouco de medo dela e eu não era a exceção, mas resolvi procurar outra fonte:

-Boas tardes, seu Aprígio!Sou neta de seu Elpídio, trabalho(?) no jornal da cidade, queria que o senhor me desse uma pequena entrevista.(Era o vaqueiro de Dr. Clodovil, amigo de Zeferino).

-O que diacho um vaquero veio, reado que nem eu tem a dizer prunha mocinha que nem tu, minha fia?

-É sobre seu Zeferino. Sobre o apelido dele. Queria saber de onde veio.

-E pruquê tu num pregunta a ele?

-Já tentei, e acho que ele tem vergonha de falar.

-Ele divia de ter veigonha era de fazê.

-Fazer o que, seu Aprígio?

-Eu vou dizer , que eu acho isso uma pouca veigonha, vice?Zeferino é meu amigo, mai o que ele fai com cumade Lurdinha num é certo não.

Fui ficando muito interessada na conversa:

-E o que é?

-O causo da burra, minha fia, é que o sem veigonha do Zeferino, veve amigado cum uma burra de dr. Crodovil já faz pa mais de dez ano.Ele se casou mode acabá cum isso, mai ô paxão disgramada pela burra, que acabar que nada, o povo inté fala que ele beja a bicha, faz carinho e que ela todo ano tem um burrim fio dele.

-Vige, como é que pode isso, alguém tem prova?

-Prova pra que, essa menina,palavra de homem eu tenho, preciso prová nada não.

Agradeci e fui para a nossa minúscula redação que ficava na praça da cidade. Contei aos outros a minha saga. Os meninos (eram dois rapazes) , quase caíram os queixos, mas resolvemos não publicar essas histórias malucas e pusemos o seguinte texto:

Apelidos curiosos de pessoas famosas em nossa comuniade:

Zeferino da “Burra”- Assim chamado, por ter ganhado de presente uma burrinha a quem era muito apegado em sua infância.

E assim, encerramos o causo do apelidos. Dois dias depois, encontramos Zeferino na feira enquanto distribuíamos o jornal;

-Já li o que vocês anotaram aí!( nos confidenciou Zeferino), vim dizer que estou muito sastifeito de vocês falarem a verdade.Só num contei antes porque não queria mexer nessas coisas, mais eu era só um menino e ganhei a burrinha de dr. Clodovl que é meu padim, me apeguei a ela e só. Inté.

Ah, mas enquanto falava da burra, os olhos do homem brilhavam tanto que eu não tive mais dúvida nenhuma: Aquilo sim é que era AMOR!