OVNIS

O André, entre os três guris lá de casa sempre foi o mais valente. Enchia a boca para dizer que não tinha medo de nada. Estava sempre querendo enfrentar, fosse quem fosse. No colégio era um terror e a mãe, seguido ia conversar com a professora. Não tinha medo de gente, muito menos de assombração, já que desde novo leva jeito pra ateu, não acreditava em Deus, nem no diabo.

Mas naquela tardinha de setembro, vi-o perder a compostura. Era um dia fechado, sem sol, e as nuvens que bloqueavam a luz do dia também deixavam á sensação do solstício de inverno nos pampas. Do ano não recordo com precisão, mas lembro que era ano de eleição, e no mês seguinte o povo ia para as urnas. O fato é que ele havia ido à venda buscar uns artigos a pedido da nossa mãe, e quando adentrou a porteira de casa, branco qual papel, voando as crinas na sua bicicleta, corria ao auxílio de nossa protetora. Com os dedos em riste, apontando para o céu escuro, fazia a denúncia “Eles estão me seguindo desde lá da venda”. Invocado, e com a coragem já refeita entrou em casa, para pegar uma arma de pressão, usada para caçar passarinho.

A gritaria alardeou a vizinhança, que não era muita, já que morávamos no interior. Uns vinte quilômetros da cidade. Todos foram para rua ver o estranho fenômeno no céu. Eram dois círculos compostos por oito luzes cada, que numa velocidade incrível iam dum extremo ao outro do horizonte em movimentos repetitivos. São OVNIS, deduzimos. Enfim a comprovação da existência de vida extraterrena, num dia que me senti dentro da guerra dos mundos. A invasão, enfim começara, e não adiantava nem mesmo os tiros da arma do André. Por horas os “OVNIS” vigiaram nossa comunidade.

O alento do André foi não ser o único a passar “vergonha”, ou fazer coisas estranhas diante o fenômeno. Antes do povo do interior descobrir que as luzes não passavam do reflexo da iluminação dum comício que acontecia na cidade, muita gente passou por sustos, ou até mesmo criou suas teorias. Numa comunidade não muito longe da nossa as beatas foram para igrejas rezar pelo fim do mundo, noutra um velhinho não agüentou o susto e teve um infarto, e teve gente pegando pá e picão, juravam que as luzes os levariam a um tesouro.

Douglas Eralldo
Enviado por Douglas Eralldo em 09/03/2007
Código do texto: T406879
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