MÃO BENDITA

O show-mem religioso pela primeira vez veio abrilhantar a festa de Trindade, por onde passava uma nova romaria se fazia, todos queriam cumprimenta-lo, pedir uma benção especial, tocar em suas vestes, roubar um pouco de sua bondosa energia. Ainda bem que o arcebispo não quis, o se o fez não fiquei sabendo, uma fila própria para apertar-lhe as mãos.

A fila para beijar a fita do DIVINOO desta vez se fez mais quilométrica, muito mais de que em romarias anteriores e não seria a concorrência de outra fila para pegar na mão do Padre Marcelo que lhe poderia tirar o brilho.

Na casa que eu estava em toda romaria reúne uma multidão de gente. Ali se tornou um ponto familiar, muito mais para filar o café da manhã, o almoço, uma cerveja gelada, para mim tem de ser natural graças a um alergia que tenho, Alergia ao Século Vinte, adjetivou-a meu médico, eu não podia tomar nada gelada, pegava uma faringite com febre e tudo, se insistisse ficava afônico.

Quarenta anos vos contemplam, assim é a minha romaria. Eu ficava por lá jogando conversa fora e quando a minha mulher queria que eu fosse eu o fazia, acompanhava a procissão, assistia a missa de pé, e não raras vezes emocionava com a beleza do por do sol, o louvor com as velas acesas, aos milhares, os hinos entoados e o festival de fogos de artifício. Tudo igualzinho todo ano, até a falta de água na cidade, começa de madrugada e termina depois do entardecer...

De volta ao abrigo costumeiro encontro um dos filhos da casa, radiante de felicidade. Geraldo o seu nome, cumprimentei-o com um forte aperto de mão quando ele me disse:

- Vou ficar um mês sem lavar as mãos...Achava eu que era pela falta de água na cidade e que a seca se prolongaria.

Perguntei-lhe:

- Falta de água?...Devolveu-me ele:

- Que falta de água nada, é que com essa mão que você pegou, pegou antes na mão do Padre Marcelo...

Retruquei:

- Parabéns. Em solidariedade com você e de perceber a sua alegria, eu vou ficar um ano sem lavar as minhas...

Goiânia, 02/01/14.