UMA FAMILIA RURAL DOS ANOS 40
 
Lembranças de uma meninade 7 anos

Uma casa pintada de branco, com portas e janelas azuis, muitos quartos, dois pisos, tudo forrado de tabuas de madeira e chão batido, diríamos uma construção estilo colonial. Tinha fogão a lenha, uma mesa grande com bancos dos dois lados. No terreiro, uma árvore de tronco liso onde eu podia brincar, rodar e tentar subir. Na cozinha, prateleiras cheias de vasilhas arrumadas e limpas, brilhando.
No segundo piso, onde se subia por uma escada de madeira, nas noites frias, minha mãe, eu e meus irmãos, sentávamos para ouvir os causos. Também os empregados, meu pai e colonos vizinhos colocavam os papos em dia lá no terreiro. Enquanto isso, mamãe fazia uma chaleirada de café e broa de fubá para os visitantes. O fogão de lenha era o centro das reuniões considerando que o local era muito frio.
Neste clima, muitas vezes meus irmãos improvisavam um pagode com sanfona, cavaquinho e pandeiro, onde eu participava como se fosse a rainha da festa com meu vestido branco de organza. Meu pai dançava uma valsa comigo, ele era muito alegre e gostava de dançar. Hoje, com meus 70 anos, ainda, gosto de dançar.
Mudei com minha família para esta fazenda em 1948 com quatro anos de idade. Vim de outra fazenda chamada Areal, onde nasci e meu pai era o administrador. Como sempre, meu pai era muito trabalhador e comunicativo e cá, em nossa média propriedade, não foi diferente. O antigo dono era um construtor de obras e móveis. Era uma propriedade organizada onde as pequenas cachoeiras eram aproveitadas para tocar o moinho de fubá, um engenho de cana movido por burros, um grande taxo de cobre e uma fornalha onde eram preparados o melado, rapadura e açúcar mascavo, além do caldo de cana saboroso. “Que delicia” essas minhas lembranças do tempo de criança.
O moinho próximo a casa sede fazia, um certo barulho repetitivo: toc,toc,toc. Meu pai não conseguia dormir. O barulho desse toc...toc...dava muito medo. Certa noite disse para mamãe, põe a mão aqui e veja como o meu coração está batendo; mamãe, muito calma e risonha, disse: José, isto que está batendo é o toc, toc, do moinho! Ambos riram. Mas o resultado foi que o papai mudou o moinho para mais longe. Lá em cima do morro, onde a água foi desviada através de um canal para a mudança desse moinho.
Neste casarão continha os quartos dos irmãos, o escritório do meu pai, depois uma grande mesa na copa e outra sala com mesas e cadeiras. Através de um alçapão com escada, descia-se para o lugar onde ficava o armazém. Ainda havia o quarto de minha mãe muito grande e o quarto das moças dentro do mesmo quarto. “Isto sugere que havia um controle de saída das moças”. Eu tinha meu berço separado, mas gostava de dormir com minha mãe. Lembro-me de certa vez, que acordei sobressaltada e tremendo de medo. Foi então que meu avô me disse para rezar todo dia um Pai Nosso para meu anjo da guarda. Assim o fiz e o medo sumiu. Dormi feliz e calma até hoje.
Meu pai gostava de comprar terras e plantar café. Assim, comprou um sitio por perto que foi dos meus avós paternos e de minha bisavó que morreu quando eu era ainda muito pequena e eu falava: “Bibi morreu e foi lá pro céu.” Oh!....
Minha maneira de falar fazia meu pai rir e minha vovó ficava triste, nesta época, eu tinha 4 anos. Meu tio veio morar na casa que foi de minha avó onde havia uma lavoura de café muito grande. Meus avós foram embora para outra fazenda onde um tio padrinho era administrador. Nesta oportunidade, ele fez uma casinha para sua família.
Meus avós reuniam sempre as quartas feiras para fazerem orações com a comunidade. Meu irmão mais velho (Neto) sempre me levava nas costas à noite. Ele me paparicava muito. Era sério, trabalhava muito ajudando o meu pai no dia a dia: administrava os trabalhadores. Também outros dois irmãos(Zezé e Jorge) participavam do movimento de trabalho. Aí, chegou o dia de meu irmão (Neto) fazer o tiro de guerra e ele foi para a cidade mais próxima (Alegre-ES)....
Nota: A história continua noutro capitulo.