198 – A ÚLTIMA CAÇADA...

Em uma pescaria lá alto do rio Xingu, estávamos acampados na sombra de uma velha figueira, o areal sob a árvore estava muito limpo ao que tudo indica o vento constante na região havia varrido as folhas e até os gravetos caídos.

Início de pescaria era só animação, uns preparavam os anzóis, outros disponibilizavam canoas, motores, mas um companheiro que alardeava gargantas quanto a sua pontaria na arte de atirar lubrificava pacientemente a sua carabina, e a tentação fez a ocasião, foi quando no alongado da praia em que estávamos acampados apareceram algumas capivaras, desconfiadas, umas logo mergulharam no rio, outras esticavam o focinho em nossa direção, amedrontadas, pensei.

Foi quando o nosso amigo querendo demonstrar toda a sua falácia de exímio atirador, carregou a espingarda com algumas balas e mirou...

Mirou...

Mirou...

Dormiu no ponto...

Por fim atirou...

E ele era realmente bom na arte de atirar, era o melhor de todos...

A capivara atingida pelo tiro rodopiou e se estirou, não morreu de imediato contorcia de dor, ciscava, e na tala do seu pescoço já escorria um grosso filete de sangue em meio a tufos de pelos.

Querendo exibir o seu troféu de caça ele exultante foi correndo buscá-la, e sempre alardeando a sua exímia pontaria, com ele era tiro e queda, mas vejam só as surpresas que o destino nos reserva, melhor seria se tivesse errado aquele tiro, melhor ainda seria que nem tivesse atirado naquele animal, mas a vida é assim mesmo, é em nossos erros que aprendemos as mais duras lições...

Ao chegar perto da sua vítima ele notou que a capivara ainda se contorcia de dor, tremulava, e na ânsia da morte ela havia abortado vários filhotes, toda a sua alegria foi se desaguando, foi murchando, suas pernas fraquejaram, ele ajoelhou ao lado da capivara já morta, e um arrependimento fulminante e atroz tomou conta do seu coração, avassalou toda a sua alma, e com a voz embargada, enrouquecido, com os olhos marejados em lágrimas perguntava ao vento o por que de tanta maldade...

- Deus! Meu Pai! Me perdoa por tamanha ignorância, por tanta maldade, por tanta crueldade...

Desesperado, num choro incontido atirou a sua espingarda nas profundezas do rio, jurou por tudo o que é sagrado, jurou pelos seus filhos, pela sua família, que nunca mais em sua vida mataria qualquer ser vivente para satisfazer a sua crueldade, que nunca mais caçaria, e que esta seria a sua última caçada, e continuou pedindo perdão a Deus e para o animal assassinado...

Se recolheu no acampamento, amuou, não pescou, silenciosamente caminhava pelas beiradas do rio, enfurnou em si, das vezes grossas lágrimas escorria pela sua face, estava se autoflagelando, foi quando um companheiro penalizado pelo seu desespero:

- Amigo, o que aconteceu é porque tinha que acontecer, pense bem se você tivesse matado aquela capivara e ela não tivesse abortado, você continuaria matando capivaras, pacas, papagaios, quatis, jacarés... Agradeça a Deus pela lição aprendida, você não é mais o mesmo, você se libertou daquela selvageria...

E ele se levantou num repente, abraçou o amigo com toda a sua força, não teve palavras para agradecer o conselho, mas as suas lágrimas falaram e agradeceram por ele...

Magnu Max Bomfim
Enviado por Magnu Max Bomfim em 08/07/2016
Reeditado em 08/07/2016
Código do texto: T5691512
Classificação de conteúdo: seguro