O PAU D'ALHO MAL ASSOMBRADO
 
        Nas décadas de 50 e 60 a fazenda de café tinha três grandes colônias cheias de famílias e muitas casas próximas a sede. Havia três caminhos para ir a pequena cidade, mas um deles era menos usado, só quando tratava-se de um grupo de três ou mais pessoas, uma sozinha não se atrevia a passar a noite por ali. Era o caminho que passava em frente a colônia nova, terminando as casas um pouco a cima ficava uma pesada porteira de madeira e mais uns cinquenta metros o velho pau d’alho.
      Falava-se muito sobre este local, diziam que era mal assombrado, que muitas pessoas já havia visto em noite de lua cheia uma velhinha sentada sobre uma grossa raiz. Embora ninguém tivesse confirmado essa estória, era apenas ouvi dizer, fulano viu, ninguém sabia ao certo quem tinha visto, mas todos acreditavam na conversa.
     Contava-se que um morador novo daquela colônia tinha viajado e chegou à cidade no trem que deveria ter chegado as 20h30, mas atrasou chegando por volta das 23h00 horas.

      Já cansado não quis ir por outro caminho porque seria mais longo, mesmo sabendo da estória resolveu arriscar.
     Da estação a sua casa era uma caminhada de aproximadamente uns quarenta e cinco minutos, saindo da cidade passava por uma cerca de arame farpado naqueles chamado virador uma passagem em curva fechada na cerca que evitava que o gado passasse.

    Andava um trecho num pasto e chegava a um caminho que transitava carroças, carros de boi e pessoas a cavalo ou a pé.
     O rapaz de trinta e poucos anos não era medroso não, acostumado a andar sozinho a noite, chegou ao caminho foi descendo pois para voltar da cidade era tudo decida, as colônias ficavam numa baixada, tinha um trecho de cava funda com barranco dos dois lados, o chão pedregoso, depois um pedaço plano e chegava numa curva, em seguida num trecho em leve declive, de onde já se avistava o pau d’alho.

      Ele não tinha relógio mas pelo cálculo girava em torno de meia noite era lua cheia, a hora que ele passou a curva e viu o velho pau d’alho que naquele momento pareceu ainda maior, porque a lua estava à sua costa de modo que clareava toda árvore projetando sua enorme sombra do lado oposto, lembrou-se da estória sentiu um gelo na barriga e um arrepio, mas o jeito era enfrentar já estava chegando e não tinha outra passagem, foi andando receoso pisando de leve como se não quisesse ser notado, ao aproximar mais ele viu um vulto na raiz da árvore, só podia ser a tal velhinha.
     O rapaz ficou paralisado, as pernas pesava não conseguia move-las, nessa hora ele lembrou de todas as rezas que sua mãe tinha ensinado e pediu ajuda para todos os santos que lembrou o nome, foi seguindo devagarinho até com uma secura na boca, não querendo olhar mas com medo de não olhar e ela vir para seu lado. Bem em frente ele olhou, o clarão da lua não deixava dúvida, era uma velhinha encurvada de cabelos branquinhos sentada na raiz, ela disse com um fio de voz, quase um sussurro que apesar de estar longe ele sentiu tão perto do ouvido que seus cabelos ficaram de pé. “mi ajuda”.
     O rapaz arrumou força não se sabe de onde, saiu numa desabalada carreira se atirou por baixo da porteira, chegando na sua casa sem folego, só depois de um tempo e um bom copo de água com açúcar ele conseguiu contar o caso a sua família.
    Passou aquela noite sem conseguir dormir, o pouco que cochilou sonhou com a velhinha, no outro dia ele foi procurar seu Joaquim um negro velho benzedor afamado na região, que morava numa casinha de tijolos atrás dum morro afastado das colônias.
     Era um domingo seu Joaquim estava sentado num toco em baixo de uma mangueira que tinha em frente à casa, ele ouviu o relato do moço sossegado pitando seu cachimbo de barro, sonolento parecia que nem estava escutando, depois de terminado ele falou com sua voz baixa de modo pachorrento. --- Vou contar-lhe um causo.
  --- Essa velhinha viveu a muitos anos aqui na fazenda, era parteira muito conhecida e procurada não só pelos moradores daqui mas também vinham de outras fazendas busca-la para pegar criança.        
 --- Quando a mulher estava mais ou menos nos dias de ter criança, ela se hospedava na casa da família para aguardar o momento, era muito querida e respeitada por todos
 --- Aconteceu que num domingo de manhã ela morreu, foram procurar um carapina para fazer o caixão, só que ele tinha passado quase toda a noite num baile e tomado muita cachaça estava numa ressaca danada, ele fez o serviço mas não com muito capricho.
 --- Na segunda feira o enterro saiu da casa que era uma dessas perto da sede, o caminho mais curto para o cemitério era subindo pela colônia nova, assim fizeram.
--- Carregado por seis homens que iam trocando entre os que acompanhavam, seguiam a passo lento rezando, a certa altura despregou uma das alças, ficando impossível de continuar, nisso o sol já estava quente eles foram com muita dificuldade até chegar a sombra do pau d’alho, pararam colocaram o caixão no chão e alguém foi correndo a uma casa mais próxima buscar um martelo e prego para o conserto.
--- É isso que aconteceu o enterro não pode parar, tem que sair de casa e ir direto até o cemitério, se parar no caminho o lugar fica mal assombrado e se ela pareceu para você e pediu ajuda, você tem que voltar lá uma noite e ver o que ela precisa.
     O moço saiu da casa do velho pensativo, após alguns dias ele pegou sua família e foi embora não falando a ninguém, com certeza de medo que a velhinha também ficasse sabendo. E até hoje não se sabe notícias dele.
João Batista Stabile
Enviado por João Batista Stabile em 24/08/2016
Reeditado em 13/08/2020
Código do texto: T5739006
Classificação de conteúdo: seguro