O CAVALO RAIO

O CAVALO RAIO

O relógio da igreja já tinha batido as 7 badaladas da noite

e "seu" João Quebra Queixo viu que estava na hora de ir se deitar na sua fianga, que nada mais é do que uma rede de dormir. Não ignore porque também tem rede de pescar. Por outro lado, tinha de acordar mais cedo do que de costume pois tinha de fazer uma viagem a mando do coronel João Lourenço. Iria até Fortaleza a fim de comprar feijão, arroz, açúcar e outros mantimentos, além de quer sene, bolacha d'água e iguarias para o essoal da família do coronel. Armou a rede, verificou se a corda estava bem segura no armador e deitou-se. Encheu o cachimbo de umburana com um bom fumo de Arapiraca e acendeu com um tição do fogo próximo.

Tirou grandes baforadas e as espirais de fumaça fizeram-no sonhar com a viagem do dia seguinte. Estava dormindo. Foi preciso que dona ocinha sua esposa tirasse o cachmbo de sua boca e apagasse o fogo. Roncou como um touro bravo, como bravo sempre fora e acordou às 3 horas da madrugada para ir a viagem de 130km. O cavalo era bom e marchador. Entrou em casa tomou seu café, forrou bem o estômago, despediu-se da mulher, chamou o cachorro Tubarão que iria com ele e partiu. Apenas 2 dias para ir pois o cavalo era bom; o belo alazão nunca falhara em serviço.

ASSIM, na data acertada seu João chegou em plena praia de Iracema de hoje, mais precisamente no Passeo Públco onde eram estabelecidos os maiores armazéns de secos e molhados, mas preferência para as compras era o armazem do Sr. Dório Siríaco, um galego de fala enrolada que seu João mal entendia. Mas essa era a preferência do coronel. Seu João apenas cumpria as ordens.

Era um mês de maio belo, chuvoso, chamado pelos cearenses mês de Maria, mês das flores, mês das noivas de acordo com a conveniência de cada um É um mês cheio de beleza. Os pássaros trinam muito mais e seu João adora os passarinhos que sentavam nas mãos de São Francisco, seu santo de devoção.

Pois bem, como dizia Paulo Brossard, tribuno e senador arretado, compras feitas, papo em dia, seu João resolveu retornar para Itapipoca. Selou o alazão Raio, não sem antes dar-lhe 2 litros do bom e nutritivo milho vermelho e alimentar o Tubarão com quatro quilos de bofe de boi que o turco matara. Despediu-se do pessoal do armazém e num trote elegante partiu para a sua terra.

Como já se sabe, ele sempre contava as suas belas histórias na praça do mercado público. Quando ele começava a praça ia se enchendo de gente, porquanto uns iam passando para outros que seu João estava contando uma bela história.Logo a praça do mercado ficava cheia e no meio deste povaréu estava sempre o Zé Capote um caboclo malandro que apreciava. Seu João continuou:

- Eu vinha nas alturas de Capuan acerca de 90 km de Itapipoca quando observei o céu escurecer às minhas costas. Apressei o galope e a chuva se aproximando. Apressei o cavalo, como o Tom Mix fazia para agarrar aqueles bandidos do tempo dele. Disparei o alazão e lá vinha a chuva a 2 km atrás; esporei mais ainda o cavalo que fez uma corrida desenfreada, SEM PISAR NO CHÃO. EITA CAVALO BOM. A chuva pega não pega. O Raio vapt vupt. E nesse passo ou voo chegamos a Itapipoca 10 segundos antes da chuva. Olhei para o Raio e vi que só tinha molhado o rabo. Nos 10 segundos o Tubarão chegou com a língua de fora.

Nestas alturas o Zé Capote não se conteve e falou:

- Mas seu João , então o cavalo em que vinha a chuva era pior do que o seu?

Seu João numa fúria nunca vista interpelou o Ze Capote:

- O que você tá querendo dizer cabra fila da puta.? Foi ou não foi Tubarão?

- Foi seu João, respondeu o cachorro.

Mas foi tarde, Zé Capote já estava estatelado no chão com uma tapa de seu João, saindo sangue por todos os poros. E arrematou:

- Isso é para você nunca mais duvidar da palavra verdadeira de homem sério cabra sem "servência"" e vagabundo de meia tigela.

ANTONIO Tavares de Lima

17.7.2019 -12:10 h

OBS: O sotaque todo é cearense\nordestino.

Antonio Tavares de Lima
Enviado por Antonio Tavares de Lima em 17/07/2019
Reeditado em 18/07/2019
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