ENTRE O ALVORECER E O OCASO

As ondas quebrando mansamente na areia fina que se misturava com o mar penteado foi convite irresistível para sair para pescar. Barco novo de alumínio, remos largos, suporte para vela triangular e adaptador para as varas. O sol com raios de fogo por entre nuvens grossas, escuras, anunciadoras de tempestades, dava os primeiros sinais de sua presença e fazia soprar a brisa morna do amanhecer de verão.

Alonso pegou a caixa com a tralha de pesca e colocou o barco n’água. Remou até sentir que a brisa poderia inflar a vela e levar o barco para bem longe da praia, para o local onde dormem os peixes. E com esse ânimo deixou-se levar à deriva enquanto montava a vara com linha grossa e a nova isca grande e atraente que comprara na loja de importados. Feito o arremesso, vara presa ao suporte, cana do leme sob o braço, pensou, hora de tomar um gole d’água. Mas o garrafão ficara na praia. Mas para quem iria passar apenas alguns momentos pescando, com a pretensão de voltar logo para casa, a água não faria falta.

Num momento, como num susto, a carretilha disparou e rapidamente a linha foi puxada com força e velocidade. Vara em punho, presa ao colete de pesca, o desenrolar da linha foi contido. Devia ser peixe grande, porque tal como se estivesse sendo rebocado por motor potente, o barco adquiriu velocidade e o molinete recuperava palmo a palmo a linha que estava tremendamente tensionada. Em pouco tempo o continente tinha saído do campo de visão. Apenas uma circunferência de mar com a abóbada celeste por cima. Por maior que fosse o esforço Alonso não conseguia recolher totalmente a linha, nem diminuir o ímpeto da velocidade.

Corte a linha, disse-lhe a prudência. Nunca farei isso, respondeu a sua teimosia.

Em momentos o barco adernava quase chegando à lâmina d’água. Outras vezes empinava a proa como se houvesse potente motor de popa. As horas se escorreram, a velocidade não diminuiu até que, com ruído assustador, o casco do barco foi rasgado por um afloramento rochoso. Tudo perdido. O naufrágio era inevitável. O peixe fugiu levando a vara.

De pé, sobre o afloramento, Alonso procurou o colete salva vidas antes do naufrágio total do barco, agora imprestável. Sede e fome torturaram o corpo cansado durante todo o dia que se abandonou ao sabor das ondas quando o sol se escondeu num ocaso de sangue.