DOCE LOUCURA (conto)

A hora da chegada das correspondências é a mais esperada. É um alvoroço geral. Enfermeiros extras são escalados para a chegada do carteiro, que se veste de Napoleão. Ele é o único responsável pela nobre missão, pois foi coroado o responsável vitalício por tomar todos os remédios sem se queixar.

No entanto, poucas cartas são entregues, pois os familiares estão na louca luta pela própria vida fora dos muros do hospício. De repente, na entrega de hoje uma surpresa geral: Einstein, recebeu depois de vinte anos de internação a sua primeira carta. Einstein é ele mesmo, não o cientista e nem é o seu codinome: Foi uma homenagem do pai quando do nascimento: Einstein Januário dos Anjos. O pai lhe ensinou que foi uma homenagem ao tal astronauta Albert Einstein que numa tal nave Relatividade pôs o pé direito na Lua pela primeira vez, obrigado que foi pela tal Humanidade louca para dar um grande passo.

Eis o Einstein Januário sorrindo depois de tanto tempo: Pegou o envelope com doçura de saudades, com a Teoria de Tudo descoberta pelo orgulho por ter alguém lá fora pensando em sua pessoa. Os outros? Bom! eles largando mão de todas as insanidades, juntaram-se aos enfermeiros e médicos, além do diretor chamado às pressas para presenciar o momento tão raro.

E, o Einstein, sentou-se com os pensamentos de alegria, rasgou lentamente o envelope com as mãos trêmulas de ansiedade, retirou deslumbrado a folha como que descortinando o cenário de uma peça de reencontros. Abriu-a e...

Lá estava a folha branca na frente e no verso, mas com três pontos enrugados. Para ele o sorriso era largo de felicidade e acentuado pelo olhar brilhante. Cheirou a folha sentindo a presença familiar e amiga, e suspirou profundamente agradecido por encontrá-la. Passou a mão sobre ela como se fosse a mais pura seda da sua esperança; e que era. Abraçou-a, apertando-a contra o peito como sentindo o coração do remetente; e o sentiu. Olhando a todos, com lágrimas nos olhos impregnados do amor recentemente despertado, foi logo dizendo melodiosamente:

— É a carta do meu irmão Zé Calígula. Meu único irmão.

Os presentes entoaram júbilos, cada um na sua maneira louca de ser. Bateram palmas e pediram para pegá-la, também. Malgrado a...

A mais velha hóspede, a Marilyn Monroe Paranhos, chama pela atenção ao perguntar na sua parca lucidez: — Se a folha está em branco como você sabe que é do seu irmão? Pode ser de qualquer outro.

Ele sorri respondendo como um sábio, pois afinal, sendo o Einstein, só poderia é responder com sabedoria:

— Por isso mesmo! A folha está em branco porque ele não sabe escrever, e eu não sei ler. Mas, vejam os pontos enrugados. São as marcas da suas lagrimas por mim.

Ah! Agora sim estava muito bem explicado. E o Einstein a dobrou com cuidado, recolocando-a dentro do envelope. Guardou a carta na doçura da sua loucura, somente, como os sábios de doidices sabem fazer.  

Arabutã Campos
Enviado por Arabutã Campos em 24/06/2023
Código do texto: T7821259
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