As manias de João Aquino

Eu entrei cedo na casa, lá eu encontrei muita gente, chorano, conversano, lembrano das coisa. Me escorei perto de uma senhorinha, ela era pequena, parece que o tempo fez ela derreter. Eu sempre gostei de visitar falecido. Eu ficava lá até a meia-noite, depois eu ia me embora, andar por aí. Eu ficava toda a madrugada andano, me picava pro mundo, só voltava pra casa quando não tinha mais ninguém na rua. Minha casinha, no fim de uma rua deserta, era pequena, velhinha e é claro, verde. Adoro verde. Sempre quando eu chegava em casa, acendia meu candeeiro, que era bem velho. Colocava os balde nos lugar certinho dos pingo e ia dormir. A noite era longa, minha barriga, parecia que queria me engolir, faz três dias que eu não enguli nada, assim fica difícil.

Bem cedinho, eu vou pra uma padaria, escutar o rádio de lá. As vezes eles me davam resto de pão, ou então não me davam nada, eu também não fazia questão. Depois, meio-dia, eu pulava sete vezes na encruza e ia direto pro cemitério. No cemitério eu pedia licença, baixava a cabeça e entrava. Eu ficava conversano. Conversava com um povo véi branquelo, as vezes mais amarelo que eu e as vezes azul. Eu não perguntava por que eles tava tudo daquela cor, me disseram que era falta de etiquete. E eu lá sabia que diabo era isso? Muita vezes esse povo me perguntava.

-João Aquino, pode falar com Josefina Alves por favor? Fale que quero falar com ela. - Oh João! Avise a Dona Ceição que de hoje, que tô com minhas plantinhas tudo seca.

Eu falava que ia, mas era só pra disfarçar. Aonde é que eu ia procurar saber achar tanta gente assim? Logo depois eu ia para a praça da cruz. Eu sentava numa cruz de madeira comida de cupim e molhada da chuva, pra assiti de longe a missa do padre. Eu não era de nenhuma religião, mas ficava achano graça, aquele povo tudin, sendo roubado pelo próprio sacerdote, como esse povo que é falante diz. Eu nunca fui falante, e não tenho vergonha de dizê que não sou, eu não gosto de menti, pra quê? Pra ganhar mais um luga no inferno? Tô fora!

Ágatha Ternurie
Enviado por Ágatha Ternurie em 02/11/2023
Reeditado em 03/11/2023
Código do texto: T7923188
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