Dagoberto não gosta de futebol?

Casaram com aquela vontade férrea de felicidade, se não fosse um porém:

Dagoberto não gosta de futebol!

- Jura amiga?

- Juro por tudo que há de mais sagrado nessa vida.

- Mas você é doente colorada!

Dagoberto conheceu Simone numa das arquibancadas do Estádio Beira Rio em Porto Alegre, estavam lado a lado. Ele a paisana e ela em trajes completos do Internacional, só não calçou chuteiras porque não conseguia caminhar com elas.

Ele sentado e ela em pé vibrando freneticamente a cada jogada. Naquele dia Simone saiu sem voz de tanto gritar “golaço” oito vezes, quatro em cada tempo e chamar o Juventude de “timinho”. Vitória memorável. Simone nem via Dagoberto, em compensação Dagoberto não tirava os olhos de Simone, e quando ela pulava loucamente roçando sua pele na pele dele, que frenesi percorria o corpo de Dagoberto, já desejando que ela tropeçasse e caísse em seus braços.

Imaginou a cena todinha, dela caindo em seus braços, a troca de olhares fulminante, a purpurina caindo do céu, ela vestida com um vestido branco esvoaçante, sem aquela indumentária tão... tão... masculina por assim dizer. A balbúrdia do estádio desapareceu, uma suave sinfonia e o piar de passarinhos transparentes e saltitantes fazia eco em seus ouvidos, e o coração de Dagoberto quase parou de amor.

Entorpecido e sonhador, foi sugado das profundezas da paixão com um:

- Filho da puuuutaaa! Reverberou Simone com o resto de voz que lhe sobrara.

Era o gol do Juventude... Aquele salva-alma.

Era a deixa de Dagoberto, se ele não aproveitasse agora que Simone tinha sentado, nunca mais na vida conseguiria falar com ela.

- Quer sair comigo?

- Assim, na lata você me pergunta? Nem te conheço.

- Dagoberto Pires.

- Você torce para quem?

A resposta de Dagoberto foi mais importante que tudo o que se seguiu dali para frente. Era a resposta para o resto da vida.

E assim, depois de 1 ano de namoro e torcidas e vitórias e derrotas, casaram-se. Ela com um vestido branco suntuoso e o buquê feito com broches do Internacional - como era de se esperar - e ele de terno.

Mas estavam em pleno campeonato Brasileiro e eis que Dagoberto sumiu com os controles remotos.

- Dagô, viu o controle da TV?

- Vi sim, ta aqui comigo.

- Me dá que vai começar o futebol.

- Nem em pensamento.

- Bom, vou ligar direto.

- Tente.

- Dagoberto! Você desligou a energia elétrica?

- Aham...

- Mas você gostava de futebol, foi no estádio que nos conhecemos!

- Foi só para te conquistar, eu odeio futebol e não quero mulher minha assistindo.

- Vou para a casa da minha mãe.

- Pode ir. Mas pense bem, porque se você for, não volta mais.

Essa foi a primeira desavença.

- E agora, amiga, o que você vai fazer?

- Vou comprar um radinho a pilhas e na hora do jogo digo que vou ao mercado.

- Não vai colar Simone.

- Pelo menos consigo ouvir até bolar alguma coisa contra o Dagoberto.

- Você vai se vingar?

- Lucrecia, fique aguardando...

A segunda desavença foi a descoberta do radinho a pilhas.

- E agora, amiga, o que você vai fazer?

- Vou comprar os fones de ouvido...

- Simone! Acho melhor você ter um papo sério com o Dagoberto, porque assim não vai dar. Todo mundo tem que ceder um pouco.

- É verdade Lucrecia, vou fazer isso.

Chegando em casa, Simone, toda cheia de amor para dar, não querendo que a felicidade que sentia quando estava ao lado de Dagoberto fosse jogada fora pela janela; e disposta a tudo para que o casamento desse certo, começou com uma voz meio chorosa, meio carente:

- Dagoberto... o que você tem contra o Internacional?

- Nada Simone, nós não precisamos viver brigando por causa de jogo não é?

- Claro que não amor! Vamos viver em paz. Eu realmente gostaria de saber porquê você é tão contra o Internacional e eu torcer por esse timão campeão!

- Eu sou gremista.

Michele CM
Enviado por Michele CM em 03/07/2009
Código do texto: T1680573
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