AMOR SEM FIM

AMOR SEM FIM

Júlia nasceu no Rio de Janeiro, e foi criada em Cabo Frio, cidade do litoral norte do Rio de Janeiro, muito utilizada por turistas e moradores eventuais. Por ser um lugar de veraneio, fica muito cheia aos finais de semana e aos domingos à noite a maioria vai embora, restando somente aqueles que lá residem. Foi justamente por alguém que não morava lá, que ela sentiu brotar, pela primeira vez no seu coração, o sentimento de amor. Paixonite de adolescente, talvez. Tinha na ocasião treze anos, quando algumas de suas colegas ainda pensavam em brincar de bonecas. O alvo de sua adoração era Francisco, um estudante de medicina, primo de Otávio, o melhor amigo dela.

Em um de seus passeios pela cidade encontrou com Otávio acompanhado do primo, ela estava acompanhada de uma amiga que a primeiro momento também se apaixonou por Francisco, mas, com a ajuda de seu amigo, Júlia logo conseguiu se aproximar mais de Francisco do que sua amiga e os quatro continuaram o passeio juntos. As conversas entre Francisco e Júlia eram divertidas, um conhecendo o outro até que descobriram, surpresos, que aniversariavam no mesmo dia. Dois sagitarianos que começavam a traçar as linhas de sua história.

Os dias após o primeiro encontro eram preenchidos por muitos telefonemas e encontros aos finais de semana. Nada sério, no início, uma amizade colorida. Mas ela logo se deu conta que estava completamente apaixonada. Ao pensar nele os seus olhos brilhavam. Às vezes, durante as aulas, o seu sentimento saia da sala e ia encontrar com ele e o seu caderno se enchia de florezinhas e coraçõezinhos, com o seu nome junto ao dele: Júlia e Fran, para sempre, amor. Ela o chamava de Fran porque ele tinha que ter um apelido que não fosse: Chico, que é nome de porco. Então ela escolheu Fran. “Não é bonitinho?” – Perguntava para sua melhor amiga e confidente, a única que sabia do que estava acontecendo.

A cada dia que passava Júlia prometia a si mesma que iria amá-lo para sempre e só costumava prometer o que, com certeza, conseguiria fazer, apesar de que em se tratando do seu amor pelo seu Fran, era fácil. Assim ela pensava e ficava construindo sonhos, desenhando corações, querendo vê-lo, viajando, levada pelas músicas e balõezinhos de pensamentos de amor.

Porém, as coisas chegaram a um ponto que não fluíram tão bem como Júlia sempre imaginou: aquele amor platônico a cada dia aumentava e não recebia a esperada reciprocidade. Ele estava cada vez mais distante. Até os telefonemas que ele dava para ela amiúde, diminuíram. Ela tentava falar com o seu Fran, mas ele nunca atendia, inclusive, numa ocasião, trocou o número do celular e deixou de informá-la. Mas Júlia, sempre muito insistente e determinada, apesar de sofrer, não desiludia, com a certeza que não terminaria daquele jeito.

Alguns anos se passaram e ela perdeu o contato com Francisco e Otávio, que por causa do vestibular mudou-se para outra cidade.

Francisco era uma droga que circulava pelas suas veias, misturada ao sangue que fazia seu coração bater acelerado a cada pensamento nele. Uma droga deliciosa que aliciava os seus sentimentos e tomava conta do seu corpo de menina, mas ao mesmo tempo machucava pela falta da contrapartida. Nessa fase as garotas ficam meio bobas, mas ela tinha um sonho e tencionava fazê-lo acontecer: reencontrá-lo e serem felizes para sempre.

Após três anos, em umas das festas da cidade, Júlia, na época namorando um rapaz muito bonito e atraente, encontrou com Otávio, que deu uma notícia que lhe fez chorar de emoção: Francisco estava na Cidade, dando plantão aos finais de semana no Hospital Santa Luiza. Júlia correu para casa. Simulou uma dor de cabeça para seu namorado, entrou por uma porta e saiu pela outra, iria re-encontrar o seu verdadeiro amor. Era, por coincidência, noite de sábado, quando ele dava plantão. Em poucos minutos correndo pela cidade, chegou, exausta, ao hospital. Não o viu, a princípio, mas apressou-se em procurar a recepcionista e perguntar quem era o plantonista. Ouviu uma frase que encheu a sua vida de alegria: é o Doutor Francisco. O seu rosto estampou a felicidade que tomou conta dela e os seus lábios se abriram num sorriso amplo que deixou à mostra seu aparelho ortodôntico. Rapidamente tirou de sua bolsa a carteirinha do plano de saúde e solicitou uma consulta. Loucura? Que nada, pois quando se tratava de Francisco, tudo que fizesse não era demais. Foi num período de epidemia de dengue, mas ela estava decidida a vê-lo, esperou muito a sua vez de ser atendida, mas o motivo justificava e valia a pena.

O atendimento pelo Médico ganhou justificativa, pois seu coração pulsava mais do que o normal, em estado de repouso chegava a cento e vinte batimentos por minuto. Era nada menos, do que seu coração dizendo que o amava. Ele lhe perguntou o que sentia e ela respondeu: “É amor por você! Uma doença aqui, no meu coração, que provoca palpitações e muita saudade quando não te vejo.”

Ela estava certa do carinho que ele lhe dedicava, mas queria ter certeza se não era resultado do desejado sentimento de amor contido, pois ele nunca se revelara por inteiro. Ele inventou um monte de desculpas. Tentou mostrar para ela que o amor deles seria impossível, que viviam em mundos diferentes e que ela deveria aproveitar bastante a vida antes de se prender a alguém. Mas ela não aceitou as justificativas. Francisco não tinha ideia do amor que ela sentia por ele, das loucuras que ela era capaz de fazer só para estar ao seu lado. Saiu de lá triste, mais certa, ainda, de que o amava loucamente.

Quantas vezes a moça, a pretexto de ir aos bailes com as colegas, passava horas durante a noite, até a madrugada, perseverava sentada nos bancos da emergência do hospital, pois ela não desistia, só para estar junto do seu amor. Somente a troca de olhares e sorrisos era suficiente. Consolo que justificava para suas amigas, que esperançosas do seu sucesso, trabalhavam em conluio para que a sua mãe e eventuais namorados não soubessem das suas escapadas para ir ao encontro do homem que amava.

Ela sentia um carinho muito forte por seu namorado, na época, mas por muitas vezes pensava: “Eu sei que ao lutar pelo que eu sinto posso magoar outras pessoas, mas eu não tenho como obrigar o meu coração a gostar mais deles do que do Fran. É um sentimento muito forte e diferente. Eu tenho que pensar no que é melhor para mim e eu vou seguir sempre o que o meu coração mandar.”

Ele deixou de dar plantão em Cabo Frio, mas não deixou o coração de Júlia e continuaram a se comunicar como amigos.

Ela também saiu da sua cidade natal e foi morar em Niterói. Certo dia, ela amanheceu com o peito e a cabeça cheios de Francisco. Não parava de pensar nele, alguma coisa estava acontecendo. Para se acalmar, queria ficar sozinha com seus pensamentos, sem ninguém que a incomodasse, muito menos seu namorado. Não o queria por perto enquanto pensava no Fran. Ela já havia namorado alguns rapazes, mas o seu amor verdadeiro, aquele que morava dentro dela e que a teria quando quisesse era ele. Resolveu patinar na Lagoa Rodrigo de Freitas, na zona sul do Rio de Janeiro e lá passou o dia, sozinha, até que o seu telefone tocou. Era quem esperava: o seu verdadeiro amor. Disse que precisava falar com ela sobre um sonho ruim que teve. Queria saber se ela estava bem. Marcaram para se encontrar em Icaraí, Niterói, e ficaram a noite toda passeando de mãos dadas, como se fossem namorados. Ela estava radiante, pensando que finalmente iria realizar o sonho da sua vida. Ela acha que nada acontece por acaso e pensa que por causa dele aprendeu a sonhar, a acreditar nos sonhos, a amar, a sofrer e apesar de tudo a ter esperança.

Mas não foi naquele dia. Ele ao deixá-la em casa disse-lhe: “Foi muito bom ver você outra vez e passar essas horas juntos, estava sentindo saudades e o sonho tinha sido um bom pretexto. Quem sabe um dia a nossa história possa ter um final feliz.”

Júlia, com a cabeça mais adulta e o pé mais no chão, entendeu o que ele quis dizer, apesar de não entender o porquê dele sempre fazer questão de manter acesa a chama da esperança. Foi a última vez que ela chorou por causa daquele amor. Os anos passaram e ela soube que ele está vivendo em Portugal. Nunca mais se falaram ou se encontraram.

Ela casou, descasou e agora está namorando uma pessoa de quem gosta muito. Tem muito receio de se apaixonar novamente por alguém como era apaixonada por ele e sofrer de novo. Mas, amor igual ao que sente por ele, sabe que não se repetirá. A peça que se encaixa, nesse jogo, definitivamente, está com ele. Júlia ainda guarda no coração aquela semente do amor sem fim.