A Família É O Nosso Maior Bem

Ontem eu pedi para ela me buscar no serviço. Onde eu trabalho é longe. Dá mais ou menos 1h30 entre pegar ônibus, trem e andar a pé. E eu que acordo cedo: 3 horas da madrugada... para chegar na empresa às 5h40... Ir de uma cidade para outra sempre é cansativo por mais perto que elas sejam uma da outra. E eu que faço isso todos os dias de segunda a sábado...

Estava chovendo e ela não queria. Deu uma porção de desculpas. Não poderia culpá-la por não querer ir me buscar. Pedi com mais afinco, porque eu estava muito triste, mas não contei isto para ela e ela aceitou com uma condição de levar o Caiul Harim. Caiul é o nome do meu filho com ela, Patrícia, minha mulher. Ele é totalmente traquina e talvez eu precisasse de um pouco de animação, traquinagem e amor. E quem melhor para me animar senão a felicidade do meu filho e o amor da minha mulher?

- Mas eu quero que traga o Caiul Harim! Se ele não vier contigo você também não precisa vir. Eu disse num tom já meio ríspido tal era a minha injuriação.

Minha revolta era com o serviço, com aquela miséria de salário e as injustiças que acontecem na empresa. Ficar rodando máquina há mais de cinco anos e não ter um reconhecimento não é fácil. Saber que há mais de cinco anos atrás o operador anterior já ganhava mais do que eu após cinco anos de trabalho também. Ver pessoas fazendo nada e ganhando mais é pior ainda! Isso realmente é revoltante!

Queria alguém que amo muito por perto. Não precisariam dizer nada.

"Porque pra os amigos já tão sem assuntos

Basta a companhia de estarem bem juntos."

Lembram-se desses versos? São os dois últimos versos de um poema meu que fala da Verdadeira Amizade.

Aí a Patrícia foi, acompanhada do meu filho.

O Diogo que é um amigo meu da empresa chegou me cumprimentando alegremente e dizendo que meu filho estava lá fora com minha mulher. Ainda faltavam quinze minutos para dar a minha hora.

- Traz o Caiul aqui um pouquinho. Pedi para ele. E ele foi. Menos de dois minutos o Caiul estava dentro da seção. A mulherada ficou toda animada ao vê-lo.

- Ele é lindo! Uma dizia e outra repetia atrás: - Ele é lindo!

Os homens preferiam dizer:

- Ele não é filho seu não. Você é muito feio.

E com ousadia eu respondia em tom de brincadeira:

- Mas eu sei fazer!

O dia estava feio, chovendo e garoando muito. São Paulo é fogo! A gente vive todas as estações do ano em cada dia, seja ele inverno ou verão: amanhece frio, depois esquenta, chove, faz sol, depois faz frio novamente... É uma loucura.

Quando deu minha hora a chuva já tinha estiado e deu para caminharmos pelas ruas ainda molhadas com mais tranqüilidade. O problema era aquele guarda-chuva enorme. Fomos ao Shopping Tatuapé.

Ao chegar ao shopping meu filho viu uma loja de brinquedo logo de cara e saiu correndo para ver os brinquedos. Empolgado, encheu o saco por um brinquedo que tinha na loja. Ele queria porque queria. As crianças são assim mesmo. A Patrícia estava sem paciência e eu dizia para ela ter mais complacência, pois ele era assim mesmo. Ele estava empolgado e eu era da mesma forma quando criança. Por que reclamar? Que criança não se empolga numa loja que só há brinquedos de todas as idades e tamanhos, gostos e gêneros? Eu comprei o bonequinho do Zorro mesmo entristecido e com vontade de comprar um mais caro, que era o Ninja branco do Gi Joe. Ele era tão bonito, grande e na minha cabeça o meu filho iria se divertir mais com ele do que com o Zorro, que era um boneco bem inferior ao Ninja. Mas as minhas condições não me permitiam justamente por causa da maldita injustiça daquela merda de empresa! Fazer o quê? A vida é assim para muito dos trabalhadores brasileiros.

Após sair da loja fomos para a praça de alimentação, onde ele pediu um lanche em um comércio que nunca tinha visto, porque imitava o Mc Donald: vinha com um brinquedo e tudo o mais. A Paty e eu comemos no Habby’s. A maior parte do tempo eu estava calado. Talvez fossem os meus pensamentos que divagavam entre pedir as contas na empresa e o ganhar na mega-sena; entre a alegria de arrumar – ou reformar - uma casa e a tristeza de não poder.

Quando nós chegamos a Ferraz de Vasconcelos, descemos do trem e ficamos aguardando o Circular 1. O ônibus não estava lá e de repente me deu um "piti".

- Vou comprar uns dvs. Disse para minha mulher que ficou contrariada no mesmo instante. Atravessei a passarela e fui comprar uns dvs do Naroto, mas não achei os capítulos que queria, então comprei três dvds do One Peace mesmo, porque já tinha lido quarenta mangás de um amigo e já tinha gostado muito da história. Enquanto isso minha mulher e meu filho estavam me esperando no ponto. O vendedor disse que: só a semana que vem! E eu me contentei com o One Piece.

Ao entrar no ônibus, o Caiul ficou sentado no meu colo e minha mulher se sentou ao meu lado. Ele ficou de lado, olhando para a rua, encostando a cabeça no meu ombro e ela encostou a cabeça dela no outro meu ombro, virada para mim. De modo que eu fiquei por cima dos dois.

Naquele instante me deu vontade de chorar... Os homens também choram com o coração! Era tão bom tê-los ali pertinho de mim. Mas não chorei. Comecei a fazer cafuné neles, porque eu gosto muito de cafuné. E por que não fazer uma coisa que eu gosto para duas pessoas que amo?

O Caiul brincava com o Zorro e a Patrícia se deliciava do meu cafuné. Então, coloquei a minha cabeça entre as duas: a do Caiul e a da Patrícia e disse com toda ternura:

- Eu amo vocês – e dei um beijo na cabeça de cada um, porque eu não estava conseguindo resistir. Eu tinha que dizer. De modo que saiu do profundo da minha alma.

A Patrícia me beijou no rosto... Eu não sabia que ela tinha sentido o meu amor.

Chegamos em casa e eu fui para a casa da minha mãe após ter dormido no sofá da sala, porque ela mora embaixo da minha. Depois... à noite... eu estava no pc e minha mulher me chamou do lado de fora da janela da casa da minha mãe e disse, entre a grade da janela, que tinha gostado muito do meu carinho.

Aquilo já me foi gratificante. Ver o Caiul entretido com o bonequinho, feliz e se divertindo enquanto eu pegava no sono algumas horas atrás no sofá da sala da minha casa também. Nada melhor que a nossa família unida conosco para nos ajudar em cada passo da vida.

07/02/2010 15h30

Cairo Pereira
Enviado por Cairo Pereira em 07/03/2010
Reeditado em 04/07/2010
Código do texto: T2125232
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