Um Amor Platônico - ou não

Os anos fazem grandes mudanças. Há alguns anos atrás eu tinha longos cabelos negros, era um pouco gordinha e fazia faculdade de um curso pouco conhecido, do tipo que ‘não dá muito futuro’ e, ainda por cima, era caloura. Em contrapartida, estagiava na Biblioteca de Direito da melhor instituição que oferecia o curso de Direito. A Universidade Federal do meu estado. Lá, eu tinha contato com o mais alto escalão da sociedade. Pessoas que tinham muito poder e posses, diferente de mim, que ajudava a pagar as contas de casa com o meu baixo salário.

Como eu era jovem, é obvio que acabei me apaixonando por um dos alunos, o Aloísio. Era um belo acadêmico, dono de lindos olhos azuis, e pelos comentários que ouvia na biblioteca, ele tinha um futuro promissor, e descendia de uma família de advogados. Nossos círculos sociais eram completamente diferentes, unidos apenas pelos livros da biblioteca, que ele lia e eu os emprestava. Conversávamos algumas vezes, mas era óbvio que ele sempre me enxergou como uma funcionária que estava ali para servi-lo.

Mas como disse, os anos fazem grandes mudanças. Formei-me, e acabei prestando concurso público para investigador de polícia, e acabei por passar. O meu novo trabalho me exigiu freqüentar academia e praticar lutas marciais. Acabei por emagrecer, comecei a usar cabelos curtos e loiros. Ou seja, passei por uma drástica mudança, ficando praticamente irreconhecível da mulher que era antes.

E lá estava eu, junto com dois colegas de trabalho, investigando um novo caso. Uma tentativa de homicídio, numa residência num bairro nobre da cidade. Fomos até o local, para coletar digitais e coisas do gênero. Minha colega estava conversando com a vítima e eu estava procurando evidências quando ela me chamou. Queria que eu coletasse o DNA da vítima para possíveis comparações. Então, vi pela primeira vez a vítima, que escapou da morte por pura sorte. Minhas pernas ficaram bambas e me faltaram palavras quando percebi de quem se tratava a vítima. Era o Aloísio. O meu Aloísio, que eu nunca mais tinha visto desde o meu ano de estagiária, mas nunca consegui esquece-lo. Contou-me que haviam invadido a sua casa, em que morava sozinho, o agrediram fisicamente e quando ele caiu no chão dispararam uma arma na sua direção. A bala pegou em seu celular, desviou a trajetória e acertou-o apenas de raspão, e o acusado havia partido.

No dia seguinte, voltei à cena do quase crime, dessa vez fui apenas devolver alguns pertences do Aloísio, e fui sozinha. Ele, como na noite anterior, não me reconheceu. Comecei a conversar com ele, quando repentinamente o agressor entra no recinto, e atira no Aloísio, acertando-o na perna. Fico tensa, acho que a próxima bala será minha, irá me matar. Mas o agressor comete um erro. Aproxima-se de mim, deve ter achado que era a namorada do Al, abaixa a arma e parece querer violentar-me sexualmente, pois deve ter achado que isso faria o advogado sofrer ainda mais, pois ele estava ali, vivo, e nada podia fazer, não conseguia sequer levantar do chão. Lamento profundamente não ter levado a minha arma. Mas esperei ele chegar mais perto, e quando menos imaginou, dei um soco nele, e consegui tirar a arma da mão dele. Entramos em briga corporal, mas tive muitas aulas de luta e consegui rapidamente imobiliza-lo. Como estava sem minhas algemas, amarrei-o com uma corda que estava ali perto. Coloquei a arma em um local seguro e pedi reforços, e uma ambulância, pois o Aloísio estava baleado, e eu também havia me machucado.

Com o agressor preso, não havia mais com que me preocupar. Soube que o Al havia se recuperado bem, sem seqüelas e que havia se mudado. E eu continuei a trabalhar na polícia, lamentando o fato de não ter falado nada para ele, que eu havia gostado dele e estava feliz em revê-lo.

Mas para minha profunda alegria, eis que numa tarde qualquer entra o Aloísio, com um buquê de flores, pela porta da delegacia, olha para mim, me agradece por ter salvado a vida dele, me entrega o buquê de lindas rosas vermelhas. Meus olhos lacrimejam, e ele não hesita em me beijar... Um beijo que eu espero há muito tempo...

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E eu acordo. Vou até o banheiro, lavo o rosto, e me olho nos espelho. Aqui ainda estão os meus longos cabelos negros, e eu tenho que ir para o meu trabalho na biblioteca... E vou rezando, para que o meu Aloísio apareça hoje na biblioteca...

Amores platônicos são assim. Nos fazem sonhar...

Espero que um dia meu amor deixe de ser platônico...

Majoare
Enviado por Majoare em 17/04/2010
Código do texto: T2203654
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