Um certo carnaval de 1975 (Parte 2) Baile de Carnaval
Nas ruas à caminho do baile se via um Rio de janeiro mais bonito e colorido,entre blocos e marchinhas de tantos outros carnavais.A cidade ficava mais bonita entre as batucadas , e os refrões,lanças perfumes e muita alegria.
Todos cantavam duvidando da cabeleira do Zézé, sem ao menos saber se ele é, ninguém chorava a Camélia que caíra do galho, deu dois suspiros e depois morreu.
Mas josé queria saber o paradeiro daquela colombina mas era muito difícil, todos estavam mascarados e ele por sua vez dispensava máscaras para uma melhor visualização. Olhando ao redor, certas fantasias lhe chamaram atenção, um senhor dançava com um bandeja de chopp,mas não era fantasia era de fato o garçom. A mulata que sambava na calçada não era a passista era uma meretriz. Um outro jovem vestido de presidiário, não era folião, era um ladrão, que se escondia naquilo que ele era, que se escondia no óbvio imperceptível aos outros.
O turista americano acompanhado de um rapaz que falava português se fantasiava de mulher,(no carnaval certas pessoas fazem aquilo que queriam fazer o ano inteiro), e alguns moleques de pouca idade e de roupas sujas que perambulavam pelos blocos, não eram filhos de ninguém, eram filhos da rua, sem ter ao menos um lar, curavam a fome pela alegria por ter festa em casa.
Sambando e pulando o seu carnaval,num trenzinho de tantas curvas, pensou ter reconhecido o aroma do pedaço de tecido, ele olhava e olhava, e por fim perdia de vista aquilo que não conseguia ver.
Foi então que sentou num canto, sem a menor noção de tempo e visivelmente bêbado, notou que havia perdido o seu pedaço de tecido.
Cansado e fraco, sem nenhuma força , seu carnaval parecia terminado, tomando banhos de chuva de serpentinas,trocando as pernas, bambeando por toques de tamborins conseguiu se arrastar até ao banheiro.
No meio de tanta coisa que caía no salão,ele viu aquele mesmo pedaço de tecido flutuar no ar e cair no chão com o mesmo perfume.Guardou-o com toda a segurança no bolso da calça.
Saiu do banheiro e encontrou o seu amigo Fernando que estava a sua procura, a mais de meia hora. Após o baile iria acontecer uma festinha particular e algumas pessoas pra esse lugar se encaminhavam, muito cansado falou para Fernando:
_ Pode ir depóis eu vou.
_ Que isso cara! Vamos juntos, um segura o outro.
_ Eu estou precisando de um chopp.
_ Então eu já vou indo.
José se sentou no mesmo canto cativo do seu porre, bebeu seu chopp e saiu do salão, andou pelo calçadão de Copacabana, caiu no chão e por lá ficou por toda madrugada.
Foi acordado pela manhã, não pelos braços de um amigo e nem de um conhecido, mas sim por um cão que começou a lamber a sua cara, mas era um cão dócil, manto negro e uma enorme língua vermelha, se levantou assustado e percebeu que estava com a roupa toda ensopada d’água, havia chuvido e ele nem percebeu.Deu dois passos e o cão o acompanhou, parou de andar e cão lhe olhando também parou.Entrou no mar e se banhou, e o cão..., sim todos os cães nadam por extinto.
Deitou na areia mole e exausto, e o cão apenas o olhava, mas ele ouviu uma voz que chamava ao longe um nome de Garibalde, mas os cães não falam, (E se falassem, falariam as maiores verdade para um homem, já que são os melhores amigos, por esta razão eles não falam). Só que a voz era uma doce e desesperada, quase amarga voz feminina.
José olhou em direção e viu sua misteriosa menina correndo ao seu encontro, mas por estar bêbado ainda tinha dúvidas se era mesmo real ou fruto da sua imaginação, e chegando perto ela , apavorada abraçou o cão, e daí então José pôde ter certeza que a menina era real e o fruto da sua imaginação, tinha nome de fruta.Assistindo aquele encontro com o cão e a sua dona, ele reparou que era inútil a fala para os cães,(Pois toda aquela expressão e conduta canina, dispensava palavras).Mas mesmo assim a menina reclamava a seu cão:
_ Garibalde,não faça mais isso, aqui não é como na fazenda, essas ruas passam carros toda hora, fiquei louca quando vi a sua casinha vazia e o portão aberto.
_ Nossa você tem sotaque do sul? - Perguntou José.
_ Bem você as vezes é muito louco “Vadinho”!
_ Então você existe de verdade, e estava lá o tempo todo, quieta e sorrateira.
_ Amora
_ Não prefiro água gelada, ou água de coco.
_ Amora é meu nome, “Vadinho’’
_ Meu nome não é Vadinho é José de Andaime
_ Então esse andaime estava tão alto ontem que acabou caindo e hoje está todo destruído!
_ Ninguém fez uma analogia tão criativa assim com o meu nome e sobrenome
_ Nossa, que hálito é esse?
_ Um mixto de cerveja,uísque,cigarros,conhaque e..., o que mais eu bebi ontem meus Deus? Nem me lembro mais!
_ Maconha! Acertei?
_ Como amigo eu te digo nunca fume isso de novo
_ Agora é tarde agora eu já fumei
_ Quando?
_ Ontem com dois rapazes de Minas que eu conheci.
_ Como eles estavam fantasiados?
_ Santos Dummond e Guimarães Rosa.
_ Ah! Relaxa, aquilo não era maconha , o que você fumou foi cigarro de palha.
_ Tem fósforo aí vadinho?
_ Meu nome é Andaime, aqui o fósforo
José se encantava com a menina e ainda mais por ser real, aquela fala tímida, o nome de fruta ganhava cada vez mais o José, tinha todo um doce e leve em seu gestual, sua face era um balé combinativo entre boca, mãos e expressões na sombrancelhas, e o perfume era o mesmo daquele pedaço de tecido, um rio de fios de cabelos descia pelas suas costas, onde ele aos poucos se afogava levemente
Cada frase dela eram doses degustativas de desejo de algum doce.
_ Notou o meu perfume?
_ Estava pensando nisso agora.
_ Eu pus mais perfume no pedaço de tecido e te devolvi quando estava saindo do banheiro com outra garrafa de cerveja.
_ Você pegou do meu bolso e pôs de novo e eu nem te vi, Como pode ser se eu te procurava pelo baile?
_ Bom, você bebeu demais e fumou macoha, já eu bebi muito refrigerante e fumei cigarro de palha, isso talvez explique.
_ Isso explica tudo,faz todo o sentido do mundo.
_ E qual é o gosto do asfalto, doce ou salgado?
_ O que?
_ Eu vi você saindo do baile e cair na rua e quase foi pego por uma brasília que passava em alta velocidade, e assaltado por dois pivetes.
_ Você me salvou sozinha, como você me aguentou o meu peso, me parece tão frágil?
_ Nunca subestime a força gaúcha, sendo homem ou mulher, eu nasci na terra de Anita Garibaldi, por isso que o meu cachorro se chama Giusseppe Garibalbi.
_ Tudo bem, mulher!
_ Está bem, vou falar a verdade.Os dois mineiros me ajudaram com o peso, e eu lhe mandei que te pusessem na calçada embaixo de um coqueiro.
_ Daí eu fiquei ali e você foi embora e só está voltando agora, você me abandonou?
_ É,eu fui pra casa.
Isso foi um choque pra José, tava tudo muito bom pra ser verdade, de certa forma isso foi uma apunhalada, daquilo que ele já estava apelidando de sentimento, pôs seus sapatos e se levantava para ir embora, quando Amora pega em seu braço e lhe diz:
_ Espera, não vai.
_ Claro, que vou. Eu não sou tão importante,por um momento pensei que você era especial, depois que eu te vi no banheiro, uma coisa acedeu dentro do meu peito, e desde então o que fiz foi te procurar, pensei ter achado alguém , mais isso talvez funcione nos filmes ou novelas, e como dizem: amor de carnaval é sempre passageiro, que se acaba as cinzas, em plena quarta feira de cinzas.Deixa eu ir.
_ E fui mas voltei! Acredita em mim, por favor.
_ Se você foi embora, então por que voltaria?
_ Pra cuidar de você, e desse curativo que está na sua testa.
José pôs a mão na sua testa, e percebeu o curativo, notou que na face dela tinha um ar de desespero, e pelas suas tensas sombrancelhas, e sua face ligeiramente avermelhada, percebeu uma sinceridade jamais vista, sentou- se de novo e lhe fez uma pergunta:
_ Como eu sofri esse fermento,algum coco caiu na minha testa ?
_ Não tocaio, quando você caiu no chão, a garrafa se quebrou e te cortou.
_ Muito obrigado, guria.Mas ainda assim você me abandonou!
_ Cheguei até o meio do caminho, mas fiquei com medo de acontecer alguma coisa, eu iria morrer de remorso,continuei o caminho de casa e voltei com o Garibalde para minha segurança e a tua.Foi então que fazendo o curativo vi em seu peito uma cicatriz, olhei mais atentamente para o seu rosto e comecei a te reconhecer, até que lembrei de você. No dia da passeata os militares cercou eu e uns amigos, saímos correndo quando tacaram uma pedra que vinha na minha direção, cheguei a fechar os olhos esperando a dor e foi então que eu ouvir um grito, sem perceber você vinha correndo e entrou na trajetória da pedra que te acertou, seus amigos te pegaram e te levaram antes da chegada dos militares, mas chegando em casa percebi a dor que também estava no meu peito, como se tivesse me acertado.
_ Foi sim, demorou um pouco pra cicatrizar, mas eu nem tinha te visto na passeata, como as coisas podem acontecer desse jeito?
_ Certas coisas que eu sinto não consigo descrever em palavras, mas em certas ocasiões, essas mesmas não se fazem necessária.
_ E por que você chegou com um tom de assustada fingindo ter perdido o seu cachorro.
_ Pra enfim, falar com você, cheguei a te procurar na faculdade e no comitê,mas te achei, e de repente me deparo com você no banheiro da minha casa, e na cama com a minha irmã.Mas nada disso me importava, o que eu sentia transcendia tais coisas e ontem a noite eu pude enfim, ficar mais perto de você, te fazer companhia, te tocar, e ver se você era real, cheguei até pensar que você nem existia,como um escudo que me protegeu, e um personagem saído de um livro, vindo de outros carnavais vestido de alecrim.
_ E eu que cheguei a pensar que você era uma alucinação, efeito da erva e consequência da embriaguez, e a minha única esperança foi um mero tecido de pano aromatizado pelo seu perfume.
O cachorro corria inutilmente atrás dos pombos que voavam na areia, ou seja, os cachorros não voam.José de Andaime e Amora, estavam numa outra flora ritmados por corações em folia, sem fantasia, sem máscaras, com uma trilha de lábios e lábios, adocicados em alegria.
Entraram no carro e foram para a casa, se encontraram outras vezes, e tantas vezes dançaram as mesmas marças de carnaval, ela sempre colombina e ele sempre alecrim, nos salões, nas ruas e sambódromo e também para sempre nas areias de Copacabana.