UM AMOR E UMA DOSE DE CONHAQUE....

Acordara com uma sensação estranha. Um perfume adocicado se espalhava por todo o ambiente. Sem ter a mínima noção de onde vinha este inebriante perfume, percorre todo o flat. Optara por morar em um flat. A facilidade, o conforto, a individualidade, a prestação de serviços, lavanderia, garagem, enfim tinha tudo que um excelente conforto lhe proporcionava. Dispensou o café da manhã que lhe era servido todas as manhãs, no seu flat. A ducha um pouco fria, para despertar de forma total. Agasalho próprio para uma boa caminhada, calçado confortável, protetor solar, boné que ganhara de um amigo quando esteve em Ibiza, óculos Vogue de sol, celular e relógio. Estava equipado para uma caminhada. Mas era uma segunda-feira. Inicio de semana. Por e-mail comunicara a diretoria que não se faria presente e que a reunião fosse transferida para terça-feira. Tinha este direito de contrariar as regras.

Sol, céu azul, ar gostoso de respirar. E foi caminhando, caminhando até que ao passar por uma farmácia, foi abordado de forma intempestiva, quase que agressiva. Aquela mão segurou-o pelo antebraço. Assustado com tal atitude pensou em assalto. Não era. Mulher morena, cabelos pretos, alta, maquilagem discreta e mão firme a pressionar o antebraço que foi logo falando: Porque você está me evitando?

Surpreso. Assustado. Sentia um desconforto intenso. Como evitando? É ! Agora faz que não me conhece. Seria mais uma daquelas loucas desvairadas que andam por ai? Desculpe não a conheço. Momentos de indecisão, de espanto. Vamos fazer o seguinte, por favor, me acompanhe até aquela panificadora e vamos tomar o café da manhã e você então me explica esta situação constrangedora. Por favor, café completo para dois.

A garçonete indagou a respeito do tipo de suco. A moça, primeiro. Suco de Açaí com Guaraná. O senhor? Mamão com laranja. Mais alguma coisa? O meu café expresso e uma dose de conhaque. Conhaque, a estas horas da manhã? Sim. E daí? De fato aquela manhã estava se tornando um tanto esquisita. Primeiro o perfume adocicado que envolvia todo o ambiente, depois aquela interpelação um tanto estapafúrdia e para completar a interpelante pede um café com conhaque. Então não vai me dizer por que está me evitando? Não responde as minhas chamadas por telefone, e-mail’s. O que mais quer que eu faça para você voltar a me dar atenção? Lhe peço. Calma, vamos conversar em um lugar com menos pessoas. Está com medo que eu me exceda? Não..

Estava atrasada como sempre, o trânsito para variar um caos. O vôo para Fortaleza, sairia às 11,30. Há exigência uma hora antes do embarque. Apressada, pagou o táxi. Mala com rodinhas, rumo ao balcão. De repente o inesperado: quebra o salto do sapato. Tinha que ser agora? Com licença. Posso ajudar? È, quebrou o salto do meu sapato, agora tenho que abrir a mala para tirar outro par de sapatos. Mas porque não compra um novo? Não dá tempo. Estou super atrasada. Olhou para o relógio de pulso, com uma pulseira de couro, um tanto desgastada. Já estão fazendo a chamada de embarque. Não se apresse. Eu a acompanho. Conseguiu as duras penas se desviar das inúmeras malas e pessoas que faziam daquele aeroporto uma válvula de escape para suas angústias e frustrações. Quando conseguiu chegar ao balcão da companhia e apresentou a passagem, a atendente informou que já estavam encerrados os embarques. O que fazer?

Tenho que embarcar em outro vôo. Todos lotados. Desculpe, só para confirmar, estaria indo para Fortaleza? Sim, para um congresso. Senão se incomodar posso lhe dar uma carona. Carona? Sim. Por coincidência estou indo para Fortaleza, também para um congresso. Acredito que seja o mesmo. Então, aceita a carona? Mas de que forma? No meu avião. Quando você estava entrando no saguão do aeroporto eu estava me dirigindo para o terminal em embarque particular. Vamos então? Mas... . Não se incomode. Não acreditava, pela vez primeira embarcava em um jato particular. Lindo, decoração maravilhosa, silencioso. Deslumbrada. Esqueci de lhe falar. Vamos pousar em Vitória, onde tenho que assinar uns documentos e logo a seguir voaremos ao nosso destino. Hotel reservado. Então nos encontramos na abertura do congresso. Posso vir buscá-la? Às 20,30 horas. Olhou para o relógio, quanto tempo havia comprado. Pulseira de couro, já desgastada. Não, não é trabalho algum. Será um prazer. Abertura formal, coquetel, encontro de velhos amigos. Aceita jantar comigo? Sim. Noite fresca, enluarada. Boa noite e passo para lhe apanhar amanhã? Palestrante principal. Assunto do momento. Muito aplaudido. Destaque na imprensa. Três dias, três noites e finda o evento. Volta a amanhã? Sim. E você. Não. Vou para os Estados Unidos para acertar um contrato novo para a empresa e aproveitar para fazer a revisão do avião. Tem o meu cartão. Me liga por favor.Que horas são? Novamente olhou para o velho relógio e para a pulseira. Coincidência o meu marca a mesma hora do seu. Sorria de forma elegante. Os dias passaram. Uma semana, duas semanas. Como foi a viagem? Boa, melhor do que esperava. Estou telefonando, pois pretendo fazer um jantar amanhã, para uns amigos e gostaria muito que você viesse. Que tal? Não posso garantir. Mas vou fazer o possível para ter o prazer de vê-la novamente. Não foi. Boa noite é da portaria. Um motorista deixou uma encomenda para senhora, posso subir para entregar? Por favor. Uma rosa vermelha e um pequeno embrulho acompanhado de um cartão. Para você ver as horas da vida, de uma forma mais feliz. Abriu. Um relógio Catier modelo Baignoire S. Ficou feliz. Mostrou aos amigos. Mais um dia, mais outro. Por favor, um café expresso. Abriu a bolsa, retirou a pequena garrafa metálica e despejou o conhaque, na dose habitual. Tentou entrar em contato de várias maneiras. Telefone. Torpedo. E-mail. Não respondia. Puxa pensei que havia me esquecido. Não. Viagens, viagens, reuniões. Como tem passado? Imagine. Você me deslumbra, com sua educação, simpatia, seu charme, presente, viagem de avião se bem que de carona, jantar e depois. Depois o que? Some. Fica mudo. Mas o que você quer de mim? Você é professora da Universidade, bem apessoada. Resolvida financeiramente, assim espero. Na realidade houve uma coincidência feliz. Um salto de sapato quebrado. Um congresso. Jantares e nada mais.

Pois é. É bem ai que reside o problema. Que problema? Oh...nada mais. Será que você não entendeu ainda, que eu estou a fim de você? Por favor, vamos ser sensatos. Eu sou empresário. Tenho uma equipe enorme de funcionários. Viajo o tempo todo. Não tenho família. Solteiro por convicção. Mas e... a vida sexual e afetiva? Nada de anormal. Vivo feliz da forma e maneira como sou. Você não entendeu ainda. Eu estou a fim de você. Eu desejo você. Eu estou cantando você, de forma direta e descarada. Estou louca por você. Garçom por favor, mais um café expresso e uma dose de conhaque. Não acredito que você continua com este costume. Não é costume. É vicio. No seu apartamento, às 21,00 horas. Para quê? Para jantarmos. Combinado. Olhou para o Cartier, pensou. Que bom gosto. Preto básico. Salto 15. Maquilagem discreta. Decote idem. Cabelo ondulado nas pontas. Estava pronta. Senhora, visita. Por favor, mande subir. Esperava vê-la assim. Estava imaginando-a desta forma. Aceita uma taça de champanhe? Não obrigado. Não consumo álcool. Mas um suco natural sim. Então vamos tomar um suco nas taças de champanhe. Brindaram. Olhou no pulso. Gostou do presente? Lógico. Já lhe agradeci. Não por isso. Então por quê? Por você, por seu corpo, sua boca, seus seios, suas coxas, suas pernas, seus pés. E quando deu por si, estava nua totalmente. Não usava calcinhas por baixo do preto básico. Sobre um par de saltos alto quinze e um Cartier de ouro branco, com os ponteiros em platina e os marcadores das horas em brilhantes, estava linda e sedutora. Vá com calma. Sou virgem. Silêncio. Por convicção, assim como você é solteiro por convicção. Primeira vez, primeiro ato, primeira sensação de mulher. A noite foi maravilhosa. Acordou. Procurou pelo apartamento. Nada. Sentou-se preparou um café e adicionou uma dose de conhaque

De fato havia bebido além da conta. Tudo não passara de um dos seus devaneios. Carona de avião, congresso, jantares, o convite para um jantar com amigos, a forma brusca como o abordou pedindo uma satisfação, o jantar, o preto básico, a noite de sexo e amor. Tudo era um barato. Esta história de tomar café com conhaque estava deixando-a meio baratinada. Notou que estava nua andando pelo apartamento. Não havia taças de champanhe, não havia vestido preto básico, não havia suco.

Olhou-se no espelho. De fato tinha um corpo sedutor. Coxas firmes. Nada de celulite e estrias. Barriga tanquinho. Seios empinados e firmes. Fora tudo sonho, ilusão, confusão mental ou seja o que.

Olhou mais uma vez para o espelho e notou que no pulso esquerdo, um Cartier Baignoire S, era a única jóia que usava que adornava aquele corpo escultural.

Voltou para a cozinha, preparou um café expresso e ... colocou mais uma dose de conhaque.

Fora sonho ou realidade? O Cartier continuaria a marcar as horas felizes da vida...

ROMÃO MIRANDA VIDAL
Enviado por ROMÃO MIRANDA VIDAL em 07/08/2010
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