foto (Sintra, 2009)


Antonietta casou-se com Romão, ambos veneravam a música. Tudo dava mostras de que seriam felizes para sempre. O destino fez outros traços.

Após dois anos de casados, dia a dia sua saúde tornava-se mais frágil,  seus pulmões não conseguiam apreender o ar necessário para transformá-lo em energia. Contudo não desesperançou.  Carecia dos jovens ao seu redor, com os quais dividia sua música, os únicos momentos em que não sentia aquele ‘frio’ que lhe invadia a alma.

Os dias pareciam evaporar como gotas d’água sob forte calor. Nada poderia contê-los. Entregou a Romão um pequeno embrulho, um presente, disse-lhe. Assim, despediu-se da vida e de Romão.

Romão, jamais quis saber o que continha aquele pacote.

Por anos conviveu com esse misterioso embrulho sem tocá-lo. Agora que a vida também começava a lhe escapar decidiu pedir ao fiel Pai José, para trazer-lhe. Estava solitário, no armário.

- Sim senhor, respondeu receoso o negro senhor de cabelos brancos encaracolados.

Finalmente a caixinha de música pôde sair do casulo e mostrar sua beleza. Um soluço quase imperceptível se fez presente na cena. Emocionou o velho Pai José. Romão acabara de ler a inscrição: ”Devo partir, mas nossa música ficará para sempre.”

Com muito esforço abriu a delicada caixa e uma música celestial tomou conta daquele ambiente nu e melancólico. Romão ouviu sua própria música, a mesma que por anos e anos havia tentado compor para sua amada esposa. Agora, ela estava ali, concluída. E era exatamente a melodia que há poucos dias tinha sido cantarolada pela jovem, que vivia debruçada sobre a janela do casarão vizinho.

Soube naquele momento, que ela havia sido uma das frequentes ouvintes dos recitais que Antonietta costumava produzir.

Nunca havia apreendido em Antonietta, a alma de compositora...

 Romão sentiu uma forte dor no peito. A música ainda ecoava no quarto quando deu o último suspiro.

 

 
heleida nobrega
Enviado por heleida nobrega em 06/03/2011
Reeditado em 06/03/2011
Código do texto: T2831578
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