Espiral

André saiu do estúdio satisfeito com o resultado da tatuagem. Do alto do ombro a cobra descia sinuosa enrolando-se em seu braço até quase atingir a altura do cotovelo.

Nunca se achou muito vaidoso, mas aquela figura desenhada no corpo o fez sentir forte, invencível como imaginava que deveria ser naquele dia.

Caminhou pela praia exibindo o tórax desnudo pelo simples prazer de mostrar a figura recém tatuada. Sentiu vários olhares em sua direção, mas nenhum deles da pessoa na qual não parava de pensar.

Elizabeth o encontraria ao entardecer para uma conversa definitiva e era aí que estava a tensão pelo desenrolar das próximas horas.

Se conheciam desde a infância, mas acontecimentos que só a vida é capaz de explicar acabaram causando sua separação. Não era uma separação entre amigos ou namorados, era mais do que isso, era uma separação de almas.

Quando se reencontraram, alguns anos mais velhos e maduros, André chegou a imaginar que não conhecia mais Elizabeth. Ela não era mais a sua Liz, doce e meiga. Ela continuava linda, isso era óbvio, mas a doçura no olhar, nas palavras já tinham deixado de existir.

A reaproximação foi imediata e o novo afastamento, inevitável. E era o ponto final dessa história que eles estavam planejando colocar naquele encontro que marcaram para o pôr do sol na praia.

O lugar e a beleza do momento nada teriam a ver com a escuridão dos sentimentos que seriam expostos.

Caminhando ele avistou aquela que um dia foi a personificação do seu ideal de mulher, mas que àquela altura deixara de ser. Por quê? Ele não sabia, apenas aprendera com as novas atitudes dela que não seriam mais um para o outro o que foram há tempos.

- Oi. – Disse ela friamente assim que percebeu que André seria capaz de ouvi-la.

- Como vai Elizabeth?

O assunto que começou morno, sem emoção, foi tomando corpo e quando menos esperavam estavam falando e gesticulando nervosamente. Palavras ásperas feriam como chicotadas. Sarcasmos e ofensas machucando.

Disseram tudo o que queriam e muito do que não queriam, até as palavras silenciarem. Até os argumentos desaparecerem, até....... até suas bocas secarem.

O silêncio que seguiu foi ruidoso, não que pudesse ser ouvido, mas porque deixou pensamentos estressados e conclusões desagradáveis na mente de ambos.

Como se as palavras não fossem voltar, André deu as costas e partiu abatido, arrependido.

- Sua tatuagem ficou bonita.

Ele ouviu a voz doce e melodiosa que há muito não ouvia.

- Seu cabelo ficou ótimo. – Respondeu demonstrando ter notado o novo corte de cabelo da bela jovem.

O sol se entregando ao mar deixava o céu com tons alaranjados vivos, contrastando com o azul prateado da água mansa.

André voltou os passos que havia dado na intenção de partir. Elizabeth avançou alguns centímetros e quando deram por si já estavam a centímetros de distância.

As respirações na mesma cadência, a aproximação dos corpos, a brisa que os envolvia, tudo os levou ao desfecho, ao beijo ardente que os fizera esquecer as diferenças, que os fizera lembrar dos momentos agradáveis de outrora.

Elayne Sampaio
Enviado por Elayne Sampaio em 16/03/2011
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