Até que a música os separe CAP.2

Sabe quando você sonha com algo tão bom, mas tão bom que tem medo de acordar e ver que perdeu tudo? Bem, eu estava com medo de que isso acontecesse.

Uma luz quente e forte bateu na minha cara de repente. Resmunguei qualquer coisa, tentando proteger meus olhos sonolentos da luz do sol. Quem diabos tinha aberto essa cortina?!

-Hora de acordar, dorminhoca.

Pulei da cama com um susto. Ah, eu realmente não estava sonhando. Eu dormi na casa de Shinobu essa noite. Putz, não acredito que tinha esquecido e reclamei da cortina na própria casa dele. Ele estava lindo como sempre, já com seus cabelos arrumados. Os meus deveriam estar péssimos.

-Desculpa, acho que dormi demais - me desculpei. Notei a coberta no outro canto da sala, e percebi o quanto o atrapalhei. - Você dormiu no chão?

-Sim, você não gostaria muito se nós dois dormíssemos no futon, né? - ele riu.

Bem, eu pouco me importaria, para dizer a verdade.

-Foi mal, te faço dormir no chão, reclamo da janela, acordo as... as...- fiquei pensando. - Que horas são?

-Oito e quarenta e cinco, - ele disse.

Ah, oito e...

-MERDA! - gritei a ponto de assustar o homem. Hoje era a volta as aulas, depois das férias de meio do ano. Caraca, esqueci completamente, e a primeira aula já estava acabando!

Corri feito louca para minha mala, peguei meu uniforme totalmente amassado e fui para o banheiro. Shinobu gargalhava.

-Haha, hoje é a volta as aulas, né? Pergunto-me se deveria ter te acordado junto comigo, ás sete em ponto - ele debochou. Cretino.

-Não brinque comigo, vou levar uma bronca do professor! -reclamei enquanto arrumava as pressas, saindo do banheiro. Passei em frente a Shinobu, e pensei algo que me fez parar, mesmo tão atrasada. Fiquei olhando para a cara dele, e perguntei.

-E você? Porque não foi para a escola? - ele deveria ter mais ou menos minha idade, ainda deveria estar estudando.

-Ah, eu não freqüento a escola.

O que??!!

-Você... É burro?

-Ei! Não me chame assim. Eu apenas não tive a oportunidade, só isso.Eu cresci nas ruas, lembra? Apenas fiz o ginasial...

-Você VAI para a escola, - eu exigi. Ele fez cara de assustado. - Eu não namoro gente burra. Vire-se para arrumar alguma vaga por aí.

-Ei, não é tão fácil assim, você tem que arrumar papéis, conseguir autorizações...

-SE VIRA, EU DISSE. E se os outros da banda também são analfabetos, isso serve para eles.

Ele pareceu como uma mistura de decepção, vergonha e susto. Por algum motivo, ri mentalmente.

-Ok, ok, vou procurar.

Bom mesmo. Peguei minha bolsa já com os materiais e fui correndo para a porta sem dar tchau.

-Que nojo, você não vai escovar os dentes? - ele disse, fazendo cara de nojo e divertimento.

A resposta foi uma borracha na cara dele.

Quando cheguei na escola, o meu relógio já marcava oito e meia. Olhei pela janela da minha sala, e notei que a professora Eliza já passava sua ladainha de matemática na lousa. Acenei para Angela e entrei pela porta de trás da sala meio que agachada. Mesmo assim, os risos de uns inconvenientes chamaram a atenção da professora, que me arremessou seu livro pesado. Sim, ela gostava de fazer isso.

-Atrasada em seu primeiro dia, senhorita AnnaFellows? - ela perguntou mexendo em seus óculos. Aí sim, a sala toda riu. - Já que chegou quarenta e três minutos atrasada, acho que não vai se importar em ficar o mesmo tempo na diretoria mais tarde.

-Sim senhora, - fui emburrada sentar do lado de Angela. Sério, eu odiava aquela escola. Aliás, odiava aqueles alunos.

Afinal, imagine ser aquela garota que senta lá no fundinho da sala, é uma nerd que só fica lendo livros românticos o período de aulas inteiro e é alvo de chacota de toda a classe. De toda a escola, na verdade. E a minha amizade com Angela só faz isso piorar.

-Dormiu tarde, Jade? O que estava fazendo para dormir tão pouco heim? - Angela perguntou, rindo e cochichando.

SE EU CONTASSE, VOCÊ NÃO IA ACREDITAR!

-Mais tarde eu conto - disse apenas. Não queria que ela gritasse na sala de aula. - Só te digo uma coisa, obrigado por sair de férias.

Ela não entendeu, apenas riu e ficamos quietas até a hora do intervalo. Fui arrumar a bagunça que estava meu armário, e Ange apareceu me interrogando.

-Eu sinto cheiro de fofoca! Vamos, o que aconteceu ontem a noite!?

-Se qualquer pessoa da face da Terra, não, do universo, souber o que vou te falar agora, eu juro que te mato, Ange - falei sério na ameaça. Deus me livre disso chegar aos ouvidos de meus pais.

-Nossa, você está me assustando! O que é, você não começou a vender drogas, né? - brincou. Eu respirei fundo e contei tudo para ela em um jato de palavras que nem Einstein conseguiria decifrar.

-EUDORMINACASADOSHINOBUEAGORAESTAMOSNAMORANDO!! - cuspi. Foi bom eu ter esperado até o intervalo. Como pensei, Angela soltou um grito tão alto que fez algumas pessoas pularem e uma garota derrubar seu sanduíche no chão. Eu já estava acostumada.

-O que você disse?! Jesus, Maria e José! Para o mundo que eu quero descer! - eu estava com medo que ela realmente tivesse alguma coisa ali no corredor. - Eu acompanho aqueles caras desde seu primeiro show, e nunca nem toquei um deles! Como você em um dia...

-Ele me salvou de alguns tarados, - comentei. - Então ele me convidou para sua casa, já que eu não tinha para aonde ir. Bem, acho que posso dizer que tenho sorte, - sim, seria bem cômico se me considerasse com sorte. Angela estava frenética de emoção, dava para ver sua tremedeira de longe. Ri vendo o quanto minha amiga era fraca com aqueles caras.

-Ei, sabe o que o Shinobu me contou? - fiz ar de suspense, o que a deixou mais tensa ainda. - Ele disse que você é a fã favorita do Raka.

Agora sim, segura que lá vem madeira! Angela começou instantaneamente a chorar, colocando a mão na boca e sorrindo ao mesmo tempo. Tive medo que ela realmente desmaiasse, mas tudo que ela conseguiu fazer foi gritar novamente.

-The Dead Generation é a melhor!!!!

-Claro que é, sua estúpida!

Quem?! Ambas olhamos para trás e damos de cara com a pessoa que realmente não queríamos ver. Angela retomou sua postura ao ver nossa pior inimiga. Victoria estava no seu visual metaleira como sempre. Cabelos curtos negros com apenas uma mecha vermelha, camiseta cinza bem rasgada (que por sinal, deixava seus peitos bem visíveis) e calça jeans folgada. A outra roqueira da escola, além de Angela, e que odiava nós duas.

-Ninguém te perguntou nada, Victoria - eu disse logo. Não estava a fim daquele jeito esnobe dela - Caia fora, o papo ainda não chegou por aí.

-Quando o papo é sobre MEUS GAROTOS e a banda deles, sim, a conversa me importa, - ela rebateu. Putz, eu odiava aquela garota. Apenas porque ela também gostava da The Dead Generation, vivia enfrentando Angela. Para mim, tanto faz, afinal, eles tem tantas fãs...

-Sai dessa, VicViper - Ange debochou com o apelido "carinhoso" que nós colocamos nela. - Afinal, estamos mais próximos deles do que você pensa, hehehe...

Ange pegou minha mão e saímos correndo dali, antes que a bruxa começasse a dar piti. Eventualmente ela e minha amiga se pegavam pelos cabelos. Eu estava acostumada com isso.

-Não ligue para aquela bruxa feia - minha amiga disse quando sentamos na mesma mesa no refeitório. - Depois de um tempo, ela se toca e para de ser tão esnobe. Agora me diga, o que você vai fazer agora?

Ela tinha a feição preocupada, o que não era normal para uma adolescente rebelde que nem a Angela.

-Como assim? - eu realmente não tinha entendido.

-Jade, estou muito feliz e tal pelo seu namoro com o Shinobu, mas... Você e ele são apenas adolescentes, e não é fácil assim vocês viverem juntos. - pela primeira vez na vida, Ange realmente parecia se preocupar com algo. - Você não tem um emprego, ele depende da situação turbulenta da banda... E se você acha que seus pais vão deixar isso como está, o rock está fundindo seus neurônios. - a parte dos pais saiu como um deboche. Bem, eu realmente não havia pensado em nada disso.

Afinal, seria como se Shinobu e eu fossemos casados, e nenhum de nós tínhamos dinheiro para pagarmos as contas. Eu nem sabia como Shinobu sobrevivia, aliás. Tentei não pensei em coisas como roubo e furto.

E meus pais... Bem, acho que eles realmente teriam um treco.

-Eu vou arrumar um emprego, - eu disse. - De meio período, não deve ser tão difícil...

Angela bufou. Esqueci completamente o que ela passou por causa da palavra emprego. Sua família não era melhor que a minha, no fim das contas. Ange já ficou sem comer por um dia inteiro, por seus pais jogarem na cara dela que ela apenas dava prejuízos e gastos. Mandaram ela arrumar um trabalho quando tinha quatorze anos, e claro que ela não conseguiu. Ange realmente passou por maus bocados por causa do dinheiro.

-Você sabe que não assim. Uma colegial como você não vai conseguir algo decente para sustentar duas pessoas, aliás, nem uma só.

-Putz, falha minha Ange. Desculpa, eu devia saber que não é fácil... -me senti péssima vendo Angela realmente triste ao lembrar do passado. Vendo minha preocupação, ela tratou de sorrir novamente; era um péssimo hábito dela esconder sua dor.

-Ei, qual são s chances de você me apresentar para a banda pessoalmente?! - ela perguntou agitada. Eu ri alto com a súbita mudança de humor.

-Tudo bem, tudo bem. Vamos passar na casa dele depois da aula...

Angela me abraçou tão forte que quase me enforcou. Eu gostava de ver ela assim feliz, já que Angela estava sempre tão triste.

-Obrigada, Jade! Você é a melhor amiga do mundo!

Como prometido, eu e Angela fomos para a casa do Shinobu depois da escola. Ela se agarrou no meu braço direito e não soltava. Ok, eu gosto de afeto e carinho, mas não tanto!

-Ei Jade, o que acha de minha roupa? Estou bonita, né? Talvez eu devesse passar em casa...

-Você está LINDA, - interrompi logo, antes que precisássemos voltar bons quilômetros porque Angela acha que não está bem arrumada. - E se você visse o cabelo desarrumado de Shinobu, não iria ligar tanto para isso.

Ela riu alto com a imagem na mente.

-Você realmente tem sorte por ver essas cenas.

Andamos por mais alguns minutos, e finalmente chegamos a casa do Shinobu. Por fora, você não daria nem um real pela moradia. Era um prédio pequeno, com paredes sujas e bastante lixo pela frente. Peguei as chaves que meu namorado havia me dado noite passada, e abri a porta olhando por uma fresta pequena. Quando abri toda a porta, tive uma surpresa.

Toda a The Dead Generation estava sentada na sala de estar. Ange abriu a boca em um formato oval que nunca achei possível ficar, e deixou cair sua bolsa.

-Yo, olha aí a garota que manda no Shin! - Raka gritou o me ver. - É isso aí, ele é burro, a gente não.

Entendo, acho que deveriam estar surpresos por eu estar mandando no Shinobu no primeiro dia de namoro. Pensando assim, é verdade! Nada folgada, heim?

-Seja bem-vinda de volta, Jade - apenas agora vi Shinobu, que estava sentado atrás da roda. Eles jogavam algum jogo de cartas. - E que criatura petrificada é essa atrás de você?

Putz, esqueci da Ange. Virei-me para ver, e minha colega estava branca.

-Angela?! Angela, respira! - eu disse, chacoalhando minha amiga levemente. Após rir por alguns instantes, Raka levantou-se e andou em nossa direção.

-Acorde, princesa. - e incrivelmente, ele pegou Angela pelos braços e beijou levemente sua bochecha. Ao mesmo tempo que a garota voltou a si, começou a chorar. Todos riram alto, inclusive eu.

-E então, o que estavam aprontando? - eu perguntei. Agora todos estávamos sentado em um círculo, no sentido horário, Akai, Sora, Ange, Raka, eu, e Shinobu.

-Estávamos vendo isso, - meu namorado jogou um panfleto na minha frente. Peguei e vi que se tratava de um evento musical.

-"Grand Rock Week" - li o título em voz alta. - "O maior festival de bandas iniciantes e independentes. Shows de estilos diferenciados em um semana inteira."

-Sim, uma banda rival vai participar, - Sora disse com sua voz de criança. Ele apontou para um nome em específico. Vanguard Blood, estava escrito.

Uau, saber que The Dead Generation tem um rival me fez ficar um pouco surpresa.

-Ah, então o Bob está vindo para o cá?!- Ange perguntou.

-Bob? - eu estava confusa.

-É um amigo nosso, e o vocalista da banda. Nós nos conhecemos no mesmo tempo em que formamos a nossa banda, e ele formou a dele. - Raka explicou. - Angela, você já foi em um show deles, certo?

-Sim! - ela disse animada. - Eles são muito bons também, mas o estilo é um pouco diferente.

-De qualquer forma, veja isso! - dessa vez foi Akai que colocou o dedo em um nome no panfleto. Li em voz alta, "Girls Bravo!". - A banda da ex-namorada do Shinobu também está vindo!

Meu namorado engasgou com saliva.

-Ah, a Anna também está vindo! Que bom, faz tempo que não ouço Girls Bravo! - Ange bateu palmas.

Caramba, havia algo que Ange não sabia??!! Dei um tapa nas costas de Shinobu para parar a tosse fingida dele. Ele me olhou de lado.

-Bem, eu não disse sobre isso, veja bem, não deu tempo e.... - ele estava muito nervoso.

-Eu não perguntei nada, - disse friamente, e ele gelou. - Aliás, conversei com Ange essa manhã, e decidimos que será melhor se eu voltar para minha casa. Afinal, somos dois pirralhos.

Levantei-me sem dizer nada e fui arrumar minhas malas. Consegui, mesmo estando longe, ouvir Raka debochando de seu colega.

-Nossa, já deu B.O.? - ele levou um tapa leve do Shinobu.

-Tenha calma Angela. Se é por causa da Anna...

-Não é isso, eu nem estava pensando nisso, - eu disse. Mas era mentira. Eu não sei porque estava com tanto ciúme de uma garota que nunca vi. Putz, só de pensar que o Shinobu tinha uma ex, e que ela estava vindo para cá... Fiquei nervosa. - É porque ainda não somos independentes para vivermos sozinhos. Vou passar um tempo na cas dos meus pais, depois nos falamos.

Ele ficou quieto, o que me doeu um pouco no coração. Peguei minhas coisas, me despedi de Ange e dos outros meninos, e fui para casa sem dizer mais nada.

Narração Angela

O que foi isto?

Mais do que eu, Shinobu estava com cara de que não havia entendido muita coisa. Raka se divertia, e Akai e Sora já se entretiam com outra coisa.

Que merda! Será que fiz mal ao falar aquelas coisas para a Jade? Tudo o que falta é acabar com o namoro entre os dois.

-Se deu mal, Shin! - Raka jogou na cara sem nenhuma cerimônia. - Eu te falei para esquecer a Anna.

-Eu já esqueci! - o guitarrista gritou, perturbado. Meu vocalista predileto se divertia. Ele levantou, e com pouca força, moveu uma pequena estante da parede. Isso revelou um pôster de Girls Bravo! com Anna em destaque.

-Maldito, esconda isso! - Shin gritou, indo até a peça e rasgando com força. - Eu esqueci de tirar, apenas!

-Shinobu, você não está com jogo duplo, certo? - interroguei. Mesmo sendo meus heróis do rock, eu não iria perdoar ninguém que machucasse minha amiga.

-Shin, eu acho muito estranho você e essa garota começarem um namoro assim, do nada. - Raka parecia sério, pela primeira vez hoje. - Não é bom brincar assim com suas fãs.

Ambos ficaram quietos, e o guitarrista agora parecia nervoso.

-Quem é você para falar alguma coisa, Raka? Você adora levar as garotas que vão para o show para sua cama, no mesmo dia que as conhecem.

-Inveja agora, só porque eu sou o membro mais querido?

A situação estava bem tensa. Senti como se ambos estivessem prestes a cair em socos. Akai e Sora observavam tudo como filhos que olham os pais brigarem. Shinobu começou a olhar para mim como se tramasse algo.

-Como se eu me importasse com aquela garota, - ele disse. - Eu tenho garotas por aí me querendo para dar e vender. Até parece que irei correr atrás de uma.

Não agüentei, e dei um belo tapa em sua bochecha direita. Isso assustou até Raka.

-Escute. Vocês são bonitos, tocam bem, e fazem sucesso. Mas não são melhores do que ninguém. - eu falava com uma autoridade que não sabia que tinha. Shinobu parecia amedrontado. - Não vou deixar que falte com respeito a minha melhor amiga. Ela não é uma vagabunda qualquer, como as garotas que você leva para seu quarto.

As palavras jorraram na cara dele, e saí daquele lugar rapidamente.

Putz, eu estava frustrada. Nunca pensei que os caras que sempre idolatrei fosse esse tipo de gente. Eu já deveria saber, afinal. Eles só devem pensar em dinheiro, e em mais nada.

-Com eu sou emo, - eu disse sozinha na rua, ao notar que as lágrimas desciam. Eu me sentia triste pela Jade. Eu iria proteger minha amiga como se fosse uma filha.

Eu não deixarei ela passar pela dor que eu já passei por amor.

RA(in)
Enviado por RA(in) em 29/03/2011
Código do texto: T2877497
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