QUANDO O AMOR ACONTECE (A-Relíquias de uma vida)

RELÍQUIAS DE UMA VIDA - CAP I

QUANDO O AMOR ACONTECE

Sentado diante da sua máquina de escrever em meio a um monte de serviços a serem datilografados, Tom observava o movimento na parte externa do balcão daquela agência bancária, numa cidade do interior...

Logo viu seu colega Richard na fila do caixa. De maneira cordial como sempre fazia quando chegava algum amigo, ele se levantou e dirigiu à ele. Gostava de ser gentil com as pessoas, principalmente com os seus amigos.

Olá Richard!! e aí, passou? Não, não deu – respondeu ele, referindo-se ao vestibular.

Vou tentar em Paraíso, vamos? – Disse ele.

Quando vencem as inscrições? – Perguntou Tom.

Amanhã. O Ronaldo está indo hoje à noite fazer as inscrições. Se você quiser, faça uma procuração, que ele também fará à sua. Tenho um modelo aqui. Tome pode ficar com ele.

Sem muitas delongas o Tom foi providenciar o restante da documentação ali mesmo para se inscrever.

Quisera a sorte, que do grupo de amigos apenas ele conseguiria êxito no vestibular e assim, acabou por se ingressar na faculdade.

Paraíso era uma cidade pequena, não mais do que trinta mil munícipes, edificada numa região de características montanhosa, clima agradável, rodeada por uma paisagem verdejante, espelhada nas plantações de cafezais.

A cidade se destacava por abrigar várias faculdades, se tornando o mais importante centro universitário num raio de 400 km e por assim ser, no período letivo sua população flutuante ultrapassava os trinta e cinco mil.

A maior subsistência da cidade era sem dúvida, garantida pelo movimento dos universitários, agregados aos estudantes de cursinho pré-vestibulares. Esses estudantes traziam às ruas da pacata Paraíso o burburinho nas noites de quintas-feiras, dia consagrado para se reunirem em torno da praça principal, a praça da matriz, dando sempre um ar festivo e alegre à cidade.

Apesar de todo esse movimento estudantil, a cidade era tranqüila, sem violência e os seus moradores sabiam dividir o espaço com os estudantes, e conviviam harmoniosamente.

Foi nesse clima que Tom instalou-se ali e logo estava muito à vontade naquelas terras e iniciando seu curso na faculdade.

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Não muito distante dali, uma jovem acabara de concluir o colegial e se matriculara num cursinho pré-vestibular. Ainda não havia decido para qual o curso iria prestar, embora já havia definido que seria na área biológica. Tinha consciência de que a concorrência não seria fácil, precisava se preparar muito para enfrentar o vestibular no final do ano, por isso teria que se dedicar bastante aos estudos.

Entretida entre aulas e apostilas, nem percebeu o ano passar, já havia chegado a hora de prestar o exame. Estava bastante ansiosa, não só pelo vestibular mas também em saber de como seria àquela cidade. A primeira impressão que teve ao chegar, não foi das mais animadoras, achou a cidade bastante acanhada, não ficou muito otimista. Foi assim que se viu em Paraíso para prestar vestibular.

Ao término das provas deixou a cidade com o pensamento de não mais ali voltar, pois era muito longe de casa e ela era muito ligada à família. Mas brilhantemente conseguiu êxito, sendo aprovada para o curso de farmácia.

Essa jovem era a Mel. Mesmo à contragosto, iria fazer parte por uns tempos daquela comunidade flutuante de Paraíso.

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Tom subiu as escadas meio timidamente, não se sentia muito à vontade naquele pensionato pra mulheres, mas era o caminho necessário para pegar sua marmita de comida para o almoço.

Era um jovem, de estatura mediana, sorriso fácil, cabelos e olhos castanhos, semblante inocente, de um jeito alegre e tímido, que ali estava em busca de parte dos teus sonhos, já cursando o segundo ano de engenharia.

Ao adentrar por entre as instalações, viu-se diante de um grupo de moças que conversavam animadamente, naturalmente esperando a hora do almoço ser servido.

Ele passou por elas, em direção à cozinha, porém ao seu olhar não passou despercebido àquela garota loira, falante, que estava ali no meio das demais.

Fez o seu caminho de volta, seu olhar se dirigiu para aquela garota, mas ela pareceu nem percebê-lo. Um tanto quanto decepcionado, seguiu seu caminho. A imagem daquela menina ficou povoando seus pensamentos.

No outro dia, no mesmo horário, lá estava ele fazendo seu trajeto costumeiro. Subiu as escadas a passos largos, ansioso para vê-la novamente, mas ela não estava lá...

- Talvez ainda não chegou da faculdade – Pensou ele!!

E assim, nesse dia não conseguiu vê-la. Durante o resto do dia ficou assim meio que tristonho.

No dia seguinte teve mais sorte, lá estava ela...seu olhar foi em sua direção, e se atreveu a cumprimentá-la, mesmo que ainda de um jeito tímido. O cumprimento foi correspondido e ainda, recebeu um lindo sorriso. Continuou o seu percurso.

Na volta, não poderia ser diferente, seu olhar foi em sua direção novamente e um novo sorriso o encantou de vez. Seu coração disparou... parecia que ia sair pela boca; sua alma ficou em festa...quase se atrapalhou ao descer as escadas. Atravessou a rua e foi para o seu quartinho que ficava num porão bem em frente ao pensionato.

Àquela menina era a Mel, vinda das bandas do sul, descendente de italianos, filha de imigrantes. Garota de sorriso ingênuo e franco, olhar puro, semblante alegre e feliz, que acabara de ingressar na universidade, iniciando assim, sua estadia naquela cidade.

Seus avós maternos eram vinicultores, moravam na roça e quando ali chegaram, comercializavam o vinho com o nome da família, em uma carroça puxada por burros. Com trabalho e afinco foram conquistando espaço, tornando mais tarde cafeicultores também. O nome do vinho tornou-se marca tradicional e de muito respeito na região.

Seu pai dentre os onze irmãos era o mais atirado e com mais tino para os negócios, embora tivesse pouca instrução. Homem de personalidade forte, enérgico, de muita vergonha, o que lhe impunha educar seus filhos com rigor.

Sua mãe, mulher do lar, de semblante calmo, vinda de uma família de agricultores também. Por detrás daquele semblante passivo, escondia uma verdadeira fortaleza, uma sabedoria de vida incomum, além de ter a doçura para contrapor ao temperamento enérgico do marido, ainda servia de esteio para àquela família.

Eram gente simples, trabalhadora, que procurava evoluir, sem deixar de manter suas tradições, daí o jeito simples e conquistador da menina Mel.

Os dias de Tom à partir daquele momento, tomou um colorido todo especial, àquela garota não saia da tua cabeça e ele não via a hora do outro dia chegar para vê-la novamente. A ansiedade passou a tomar conta, e se possível fosse, adiantaria o tempo para estar diante dela novamente.

Mas nem sempre era possível encontrá-la, algumas vezes ela não estava lá e a decepção tomava conta do seu ser.

A imagem daquela menina passou a povoar os seus pensamentos. Não lhe cabia de vontade de poder falar com ela, mas lhe faltava coragem. Mas de tantos cumprimentos, o gelo foi se quebrando e acabou a apresentação acontecendo de maneira natural.

Os dias foram se passando e entre eles uma doce e fraterna amizade foi nascendo. Laços de carinho, de ternura, de zelo, de confiança, de proteção, de bem querer, foi surgindo também, fazendo-os pessoas especiais na vida do outro.

Quando se encontravam, podia-se notar todo bem querer, toda satisfação, estampada no semblante, nos olhos de cada um.

Sempre que podiam ficavam à conversar, a companhia do outro lhes eram muito agradável e um dia sem se encontrarem já era motivo para que sentissem a falta.

Certo dia no início da noite de um sábado, os dois estavam à conversar, ele na calçada e a ela numa sacada meio varanda, na parte de cima do pensionato. Ela estava radiante...linda, de batom, toda produzida...seus cabelos loiros passavam dos ombros e quando ela fazia algum movimento com a cabeça inclinando para os lados, eles descortinavam feito um véu que, juntado ao seu jeito gracioso e angelical a tornava uma das mulheres mais linda e mais bela que ele (o Tom) já vira.

Os olhos do Tom não perdia nenhum detalhe dos movimentos daquela menina que a cada instante o encantava mais, até que, de repente pára um carro...

- É o meu namorado – disse ela!

Ele ficou todo desconcertado e, incontinente, se despediu e foi para o seu quartinho, meio que decepcionado...

Que idiota que eu sou – Pensou ele. Nem para desconfiar que se ela estava tão produzida daquele jeito, teria um motivo especial.

Ficou também preocupado com ela, se não seria motivo de discussão entre os dois. Mas ao que pareceu, nada demais aconteceu, ela apenas comentou depois que o namorado disse: já os amiguinhos...né?

Talvez por estarem em terras distantes das suas raízes, dos seus entes queridos, eles foram se apegando ao outro e assim, a saudade de casa, ficava amenizada.

Sentiam-se protegidos, fortalecidos quando se tinha o outro por perto. E essa ligação fazia com que um, sentisse também, meio que “dono” do outro, motivo até de ciúmes às vezes, embora jamais deixassem isso transparecer.

Certa noite, Tom estava em seu porão onde morava, estudando. Já era noite à dentro e da rua, vinha o som da voz de Mel conversando com alguém, parecia ser com algum rapaz, e pelos acordes, era uma conversa animada, alegre, descontraída... Com o silêncio da noite o som se propagava mais nitidamente e podia ouvir perfeitamente as vozes.

Ele ficou todo cheio de ciúmes. Suas unhas ficaram aparadas pelos dentes. Foi a primeira vez que ele provou desse sentimento. O seu coração só sossegou quando Mel se despediu do seu interlocutor.

Eles católicos que eram, sempre tinham o costume de ir à missa no meio de semana também. Às vezes iam juntos e se isso não acontecia, quando chegavam na igreja, logo procurava pelo outro, para assentar ao seu lado.

Tom havia iniciado um namorico com uma moça da cidade, nada de importante, mais uma paquera, de que mesmo um namoro.

Naquele dia, estavam na missa quando Mel chegou e como de costume foi logo assentando ao seu lado. Assistiram assim, os três à missa. Lógico que a Mel nem de longe imaginava quem seria àquela moça ao lado de Tom.

Ao final da missa, ele disse pra Mel:

- Essa é minha namorada!

Ela tomou um susto, mas logo se refez. Ambas se cumprimentaram e ao que pareceu, foi uma decepção para Mel, que logo se despediu e saiu.

Tom ficou todo desarrumado, porque ele sabia que Mel tinha ficado chateada, sim...E ele percebendo isso, arranjou um jeito de terminar o namorico ali mesmo.

Esse fato, estremeceu um pouco o convívio dos dois. Mel procurou se afastar. Isso causou imensa tristeza em Tom.

Já havia algum tempo, que ele deixara de pegar marmita e assim, não tinha mais motivo para entrar no pensionato e ela não mais aparecia para conversarem. Como chegar até ela e dizer que já havia terminado, precisava arranjar uma maneira de fazer isso. Os dias pareciam longo demais sem a presença dela e a tristeza tomou conta do seu coração, mas não havia nada o que se fazer, o jeito era esperar. Jamais seria atrevido ao ponto de fazer plantão na porta do pensionato, ela era muito especial pra ele e arredia que era, seria bem possível que nunca mais quisesse falar com ele.

Mas nada como um dia atrás do outro e assim, acabaram por se encontrar e tudo voltou como antes.

Certo dia em conversa ela lhe disse:

- Àquilo que aconteceu na igreja nunca mais vai acontecer...

Embora não dissesse claro o que era, Tom percebeu que ela estava se referindo ao ciúmes que sentiu.

Já terminamos – apressou ele em dizer - não ia dar certo mesmo. Mel não fez comentário algum.

E como era de se esperar, quando se tem dois corações que se gostam, superam-se as dificuldades, as diferenças, vira-se a página do tempo e vão em busca do amanhã. E assim, os dois voltaram a ser o que eram antes.

Menino Sonhador
Enviado por Menino Sonhador em 04/07/2011
Reeditado em 17/10/2015
Código do texto: T3075435
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