Demasiadamente, por muito tempo.

Hoje não encontrei um velho amigo. Não encontrei, também o que vim achar depois de tanto tempo. Fui até a casa da colina, aquela velha casa onde todos os sonhos se realizavam. Não encontrei sonho algum. Talvez todas as lembranças tenham fugido com a sensibilidade dos seus olhos cor de mar, como quando o sol toca e dá vida aos pequenos salpiques de amarelo nos seus olhos. Não sei como descrever o ar de vida que isso me tomava, não sei se quer descrever o que tínhamos à um ano atrás. Parece que tudo se perdeu em meio as suas vontades, e própria-mente dito, as minhas culpas. Culpas de um ser inanimado, culpas de buscar uma reacção inanimada, de ser uma reacção demasiadamente não eu. Queria poder cortar todas essas tábuas, mas já nem sei mais se elas desatariam todas as más lembranças. Algo corroei por todo o assoalho, algo que não é a razão para toda essa ruína. Ainda posso ver você escorado na entrada, e eu estou lá à alguns passos, competindo com toda a serração, imóvel, mas ainda disputando por todo o espaço. Você consegue me olhar e é difícil distinguir, pela grande voracidade do espaço que nos divide, se você ainda me olha nos olhos. Eu apenas consigo ver um velho sorriso. Um sorriso difícil de distinguir da ficção, mas um sorriso que ainda me comove só por consegui-lo arrancar para mim.

Ando perdendo todas as lembranças. Talvez todo esse tempo julgue por toda a nossa vontade. Eu consigo descer as escadas, mas você não está lá. Acho que perdi a visão de você quando me pus a olhar onde meus pés tocavam. Não há espanto, apenas sinto o sangue me chegar à face, coagulando enquanto volto a me permanecer imóvel, sem vida. Já vimos essa prática algumas vezes e eu sei como você deve se divertir brincando de viver com outras pessoas. Mas, eu só não sei como me locomover a partir daí. Então me movo para um possível passo de trezentos e sessenta e cinco dias. Não há forma de escapar. Eu consigo visar a saída, mas começo a sentir os seus dedos taparem meus olhos. Posso sentir seu sorriso aquecendo a minha nuca, então você me faz acreditar novamente em mais futuros anos. Mas o alarme da mensagem toca, meu coração dispara, e não é você.

Entro no carro e você não me ver querer ir embora. Você não acredita que eu possa estar indo de verdade. Embora você seja apenas uma sombra e eu esteja consciênte disso, eu posso sentir sua mão marcando todo o meu vidro lateral. A chave não vira e minha respiração ofegante te deixa manchar os dedos no vidro. Eu não vejo mais o sorriso, agora tudo o que eu sinto é o desespero me tocando por uma vontade só minha. O meu egoísmo não deixou de te ver seguir e voltar. Não consigo dar a partida, então mesmo que o crepúsculo manche o céu, eu não consigo desistir de me manter ali. Pego a lanterna no porta luvas - a sombra que toca meu vidro tentando entrar começa a cobrir todo o meu carro no entardecer. Não há mais rajadas de sol, e o verde nos seus olhos toma um tom negro possuído pelo gramado que cobre apenas onde estamos. Então com a mão nas chaves eu me permaneço paralisado até que o ser em que demasiadamente me encontrei veja no que nos restou por muito tempo.

Yuri Santos
Enviado por Yuri Santos em 15/11/2011
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