Amor+imaginação=Ilusão

Eu precisava urgentemente ligar para ela. Era uma vontade que vinha do fundo do meu ser. Só não sabia como, ainda. Meu celular estava quebrado e eu era novo no bairro, o que significava que ninguém me emprestaria um. Mesmo com esse empecilho, tinha de ligar pra ela. Agora. Como se minha vida dependesse disso.

Eu a tinha conhecido há umas duas semanas. Mas pareciam anos. Ela era doce, meiga, gentil... Todas as qualidades que eu procurava. Não sabia onde ela morava. Na verdade, o nosso primeiro contato se dera por uma situação embaraçosa: estávamos na fila de um banco e eu furei – faço isso com frequência –, entrando na frente dela. Ela ficou irritada comigo e começamos a discutir. Quando percebemos o ridículo da situação, rimos. E eu a convidei para almoçar.

Nos encontramos mais algumas vezes, suficientes para eu me apaixonar. Sou intenso em relação aos sentimentos. A certeza de que a amava só aumentou a minha vontade de ligar e confessar meus sentimentos a ela. Percebi, inconscientemente, que amassava o pequeno papel com o telefone dela (com se eu já não tivesse decorado...), escrito com letras elegantes. A única coisa concreta que eu tinha dela.

Subitamente me lembrei de outro tipo de comunicação: os orelhões. Quase bati em mim mesmo por esquecê-los. Sai do apartamento, rumo à missão de comprar um cartão telefônico e achar um orelhão, o mais breve possível.

Circundei os mercados do bairro, em busca do cartão. O meu ânimo, que tinha melhorado um pouco, diminuiu drasticamente. Eu não achava um cartão em nenhum lugar. Essa escassez me angustiou, e pela primeira vez na vida, amaldiçoei a tecnologia.

Passei para o outro bairro e depois de visitar algumas lojas, finalmente consegui o cartão. Comprei dois, por segurança.

Vi alguns orelhões quebrados, mas foi fácil achar um sem dano. Agarrei-me a ele como se fosse um tesouro. Arfante, enfiei o cartão e disquei nervosamente os números.

Um toque. Dois toques. Três toques. Quatro toques. E no quinto atenderam. Escutei um “alô” e instantaneamente reconheci sua voz melodiosa. Me identifiquei imediatamente. Não pude deixar de notar um murmúrio de surpresa dela, seguido de um “como vai?”.

Isso foi como uma deixa. Abandonei a minha decisão de falar calmamente sobre os meus sentimentos, e desabafei tudo num só fôlego.

O silêncio se interpôs na linha, e ela, tristemente (eu acho), se desculpou, falando que tinha adorado me conhecer, mas já tinha um namorado. Pedindo mais desculpas, desligou.

Fiquei atônito, com o telefone ainda nas mãos. Me dei conta de que ela nunca tinha dado sinais de interesse em mim, mas eu fui suficientemente tolo para acreditar que sim.

De repente, comecei a rir, o que se transformou numa enxurrada de gargalhadas. Ainda ria quando entrei em casa. Eu tinha criado um amor que só existia na minha mente. Isso quer de dizer que além de intenso, sou imaginativo. Que maravilha.

Olhei o relógio. 15h30 da tarde. O banco ainda estava aberto. Hesitante, saí novamente. Chuviscava um pouco, mas não me importei. Estava devaneando. Sorrio para mim mesmo, animado. Dessa vez, daria certo.

Elaine Rocha
Enviado por Elaine Rocha em 23/11/2011
Reeditado em 30/06/2012
Código do texto: T3352332
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