A HISTÓRIA DE PETER

Não sei quem foi o desumano que me apartou de minha mamãe e jogou-me numa estrada escura e perigosa cheia de monstros "rodantes", com roncos assustadores. Perambulei por dias através dos matos onde os carrapatos iam se atarracando aos meus pelos e sugando meu corpinho com uma fome voraz. Eu também estava com a barriguinha roncando, então nem me importei em servir de alimento aos infelizes. Olhava para cima, numa imensidão escura, via pequenas luzes zombeteiras piscando para mim. Ah se eu pudesse alcançar uma delas... talvez conseguisse um lugar quente para descansar e me aquecer daquele frio cortante. Pedi ao "Grande Cão" que me amparasse porque estava com muito medo. Um par de asas reluzentes cobriu meu corpo e encaminhou-me para um foco de luz onde o vozeirio de humanos se fazia ouvir em meio uma festa. Todos se abraçavam desejando "feliz Natal". Não sabia o que significava mas o cheiro de comida era irresistível. Uma criança de cabelos longos correu para mim trazendo o "manjar dos deuses". Ela se curvou e foi logo dizendo que eu era lindo. Lindo? Estava todo sujo de barro, infestado de pulgas e carrapatos, com uma barriga enorme cheia de vermes. Fiquei envergonhado mas minha fome era maior. Também nao rejeitei a caixa de papelão onde dormi gostoso agradecido ao "Grande Cão".

O dia se fez claro e a pequena menina já estava comigo numa coleira passeando no meio das caixas de abelha do apiário e, tão logo, implorava para a mamãe aceitar ficar comigo. Nunca tinha visto uma mamãe assim. A minha tinha quatro patas, mas essa se locomovia sentada numa caixa com quatro rodas. Deu um sorriso de compaixão e, com um olhar muito triste disse que ia pensar, mas antes eu tinha que tomar um banho. Desceu da caixa esquisita, sentou no chão do banheiro e a água morna correu nos meus pelos cheio de uma espuma com o cheiro das flores. Quanta tristeza naquele coração... estava tão abandonada e perdida quanto eu. Fiquei fingindo que não entendia nada, sentindo-me muito seguro naquelas mãos.

Num outro dia de sol meu sonho de segurança se esvaia em meio as lágrimas da minha criança se despedindo enquanto a mamãe dizia que eu não caberia no apartamento, que assim que tivessem uma casa com quintal viriam me buscar. Entedi que " meu gato subira no telhado". Os dias passavam. Tomei umas injeções, alguns comprimidos. Meus pelos pararam de cair. Um menino feliz tomava conta de mim. Estava resignado junto aos outros três cães que me acolheram mas a saudade me atormentava. Sentia a falta do carinho da menina e das mãos cuidadosas que me deram banho. Fui perdendo a esperança pois enquanto crescia também perdia a graça que os filhotes tem, ainda por cima estava com um furo na bunda por causa de um verme safado que tentou me devorar. Me acostumei ao perfume do mel e a fujir das abelhas, aprendi a dar a pata com meus companheiros mais velhos.

Ouvi vozes na entrada da casa e reconheci aquele rosto com cabelos longos e claros perguntando por mim. Elas vieram me buscar!

Meu tio era o motorista legal. Minha tia nem me deu bronca quando vomitei nela no caminho para minha nova casa.

Estradas novas. Novas estradas. Vi minha nova mamãe deixando um apartamento onde não cabia um cão nem uma vida onde buscou e não encontrou. Hoje ela me cuida quando adoeço, me salva de envenenamento, afaga minhas orelhas, contente por ter feito a coisa certa, deixando equivocados amores para trás e, rindo de felicidade, "roda" atrás de mim enquanto fujo do banho correndo pela casa com quintal.

Seu coração foi liberto no momento em que permitiu-me amá-la.

Meu nome é Peter Augusto Dezute

sonia dezute
Enviado por sonia dezute em 18/01/2013
Reeditado em 24/04/2013
Código do texto: T4090957
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