A GOTA D'ÅGUA QUE TRANSBORDA
A gota d'água que ele esperou, finalmente caiu. Melhor dizendo: jorrou. Abundante, com cheiro de azedume e consistência de água amarelada misturada a restos de comida. Fragmentos ainda não digeridos do jantar. Quantidade suficiente para deixá-la com a blusa emporcalhada e sujo também, o pequeno retângulo do assoalho em direção ao qual ela encurvou o tronco, na tentativa de não manchar a poltrona. Ou não chegara a ter esse tipo de preocupação? Tudo foi instintivo, talvez...
Para ele, pouco importavam detalhes, não ia se perder - nem deixaria que o tempo se esvaísse - em conjecturas. O relevante era a certeza, sua convicção de que as suspeitas dos últimos meses acabavam de ser confirmadas. GRÁVIDA! E não era ele, o pai. Submetido a vasectomia depois do nascimento do segundo filho, não podia ter gerado aquele. Mesmo sabendo que seus espermatozoides não caiam no útero da esposa, tinha feito um espermograma depois que surgiram aqueles vômitos repetitivos e a palidez da pele se fazia acompanhar de indisposição física. Fora assim nas duas gestações anteriores.
Objetivo e magnânimo, telefonou para a cunhada. Levaria a irmã para dormir na casa dela; ele ficaria com os meninos.
- Não seria melhor um hospital? Você a leva e eu trago as crianças para dormir comigo.
- Não é caso de hospital. Problema bobo, resolve com um chazinho...o importante é ter companhia e se sentir segura. A babá está de folga, os meninos acordam no meio da noite...
-Tudo bem. Sem problemas...chego já aí.
Foi para o quarto dos filhos. Tinha que fazê-los ir para a cama. Não assistiu a saída das duas irmãs. Ficou entregue à dúvida entre o divórcio consensual e o litigioso. Tinha que ponderar. Não queria traumatizar os filhos nem se expor a um escândalo.
No dia seguinte, o espanto com o inusitado da presença da cunhada em seu escritório. Mais ainda em face do terror estampado no semblante da irmã de sua mulher.
- O câncer, que o médico pensara ser localizado no estômago, praticamente já devastou o aparelho digestivo como um todo. Expectativa de vida curta e com muito sofrimento. Preferi não lhe dizer nada até a confirmação, sei o quanto é sensível e...
O entorno da cadeira onde ele estava sentado, sua própria roupa, não comportaram a abundância do vômito que deixou o bigode encoberto sob papa e gosma azeda.
A gota d'água que ele esperou, finalmente caiu. Melhor dizendo: jorrou. Abundante, com cheiro de azedume e consistência de água amarelada misturada a restos de comida. Fragmentos ainda não digeridos do jantar. Quantidade suficiente para deixá-la com a blusa emporcalhada e sujo também, o pequeno retângulo do assoalho em direção ao qual ela encurvou o tronco, na tentativa de não manchar a poltrona. Ou não chegara a ter esse tipo de preocupação? Tudo foi instintivo, talvez...
Para ele, pouco importavam detalhes, não ia se perder - nem deixaria que o tempo se esvaísse - em conjecturas. O relevante era a certeza, sua convicção de que as suspeitas dos últimos meses acabavam de ser confirmadas. GRÁVIDA! E não era ele, o pai. Submetido a vasectomia depois do nascimento do segundo filho, não podia ter gerado aquele. Mesmo sabendo que seus espermatozoides não caiam no útero da esposa, tinha feito um espermograma depois que surgiram aqueles vômitos repetitivos e a palidez da pele se fazia acompanhar de indisposição física. Fora assim nas duas gestações anteriores.
Objetivo e magnânimo, telefonou para a cunhada. Levaria a irmã para dormir na casa dela; ele ficaria com os meninos.
- Não seria melhor um hospital? Você a leva e eu trago as crianças para dormir comigo.
- Não é caso de hospital. Problema bobo, resolve com um chazinho...o importante é ter companhia e se sentir segura. A babá está de folga, os meninos acordam no meio da noite...
-Tudo bem. Sem problemas...chego já aí.
Foi para o quarto dos filhos. Tinha que fazê-los ir para a cama. Não assistiu a saída das duas irmãs. Ficou entregue à dúvida entre o divórcio consensual e o litigioso. Tinha que ponderar. Não queria traumatizar os filhos nem se expor a um escândalo.
No dia seguinte, o espanto com o inusitado da presença da cunhada em seu escritório. Mais ainda em face do terror estampado no semblante da irmã de sua mulher.
- O câncer, que o médico pensara ser localizado no estômago, praticamente já devastou o aparelho digestivo como um todo. Expectativa de vida curta e com muito sofrimento. Preferi não lhe dizer nada até a confirmação, sei o quanto é sensível e...
O entorno da cadeira onde ele estava sentado, sua própria roupa, não comportaram a abundância do vômito que deixou o bigode encoberto sob papa e gosma azeda.