A dama da noite

Minha história tem um inicio trágico, quando completei 12 anos de idade, minha mãe morreu.

Nem cheguei a conhecer meu pai, ele embarcou em um navio antes mesmo de eu nascer e nunca mais voltou.

Aos 12 anos de idade o mundo não abre muitas opções para uma garota, as alternativas são simples ou você explora ou é explorada e eu optei pela primeira opção.

No começo eu realizava pequenos furtos, roubava algumas bolsas de moedas e corria o máximo que eu podia, mas com o tempo meu rosto foi ficando conhecido e os furtos se tornaram mais difíceis e infelizmente a fome não espera você cair no esquecimento.

Foi em uma tarde de um dia qualquer, não sei se foi a fome que nublou os meus pensamentos mas fui pega. Até os dias de hoje lembro do rosto do homem que me pegou e lembro do seu nome, Diego, o som dessas palavras ainda saem azedas da minha boca e meu corpo se arrepia todo quando lembro desse dia.

Cabe aqui dizer que apesar do berço humilde eu era bonita, meu corpo começou a se desenvolver naquele ano, o que não passou desapercebido por ele, por muitos anos lembrei dele durante meus pesadelos e de toda aquela brutalidade.

Após esse evento jurei me vingar e de certa forma obtive êxito muitos anos depois, mas contarei esse fato mais para frente.

Depois do ocorrido senti repulsa de todos os homens era um chegar próximo de mim e eu sentia vontade de vomitar, segui minha vida com dificuldade ainda realizava alguns roubos mas com uma frequência bem menor, a idéia de ser pega me causava arrepios. Comecei a trabalhar na taverna local com um pouco mais de 14 anos, o trabalho era explorador e cansativo o pagamento era desonesto mas eu tinha o que comer e aonde dormir por alguns anos.

No meu aniversário de 16 anos conheci Pablo, ele era encantador filho de um comerciante muito próspero da cidade e foi com ele que consegui me deitar com um homem novamente.

Pablo cuidava muito bem de mim, nunca me iludiu sobre casamento, ele sempre deixou claro que era comprometido a uma moça de familia tradicional e que sua família nunca aceitaria a nossa união, mas ele cuidou de mim quando eu não tinha mais ninguém e concordamos em viver um dia de cada vez.

Dois anos depois ele me tirou daquela taverna, nesta data ele já era um homem casado e pouco a pouco assumiu os negócios do pai, Pablo nunca me deixou faltar nada mesmo quando ele se ausentava por longos periodos sempre me deixava uma reserva considerável de dinheiro, nunca cheguei a conhecer a sua esposa ou saber se ele teve filhos, ele era um homem muito reservado.

Em um dos meus passeios pelo mercado encontrei o segundo homem que mudaria a minha vida, não pretendo escrever aqui seu nome e o condado onde moravamos propositalmente então vou chama lo de conde.

Ele era conhecido por suas aventuras amorosas em cada cidade que passava possuia uma amante e nesta não seria diferente, ele mandou um guarda me parar para prestar a devidas reverências a ele e assim o fiz.

O desejo foi visivel no seu olhar e eu fingi não ter visto, aquele olhar me incomoda até hoje e acho que isso transpareceu no meu rosto, rapidamente fiz um reverência e fugi.

Acho que ele se espantou com a minha reação, homens poderosos não estão acostumados com o fato que eles podem ser ignorados e ficou sem reação.

Duas noites se passarão quando ouvi baterem na porta, para a minha surpresa era o conde, ele dizia palavras doces e carregadas de paixão mais uma vez fui arredia mas de alguma forma o desafio o incitava.

Semanas se passarão e ele nunca desistia, todos os dias eu recebia presentes misteriosos e todas as noites recebia visitas inesperadas.

Dois meses depois daquele encontro as visitas cessarão, tentava me convencer que estava aliviada e agradecia em voz alta o termino daquela loucura, mas o meu íntimo sentia falta daquele friozinho na barriga.

Pablo visitou a cidade no fim do inverno, as ruas estavam vazias quando a sua caravana chegou, sai na rua para encontrar o tão esperado conforto do seu abraço, nossos olhos se encontraram assim que ele desceu da carruagem e ele rapidamente desviou o olhar.

Alguns segundos depois a sua esposa desceu, ela estava grávida e esta foi a última vez que vi Pablo.

Minha vida permaneceu solitária, com as reservas de Pablo consegui comprar a antiga taberna onde havia começado a minha vida honesta.

O conde voltou a cidade no começo do verão e mais uma vez me procurou e dessa vez me entreguei, sem promessas, sem falsos sorrisos, finalmente me entreguei e fomos felizes por algum tempo.

Com os anos me tornei a favorita do conde e essa posição me conferiu algum status na cidade, os homens mais influentes me procuravam em busca de favores do conde, a clientela da minha taberna melhorou consideravelmente e meu dinheiro também.

Algumas coisas as pessoas nos ensinam, outra é a vida que assume a responsabilidade e eu aprendi que a influência e os favores valem muito mais que dinheiro, encontrei Diego sentado em uma mesa no fundo da taverna, provavelmente ele não tinha ideia de quem eu era ou até mesmo se lembrava que havia violentado uma ladra a tantos anos atrás, amigos duram anos e inimigos duram uma vida, outra lição que aprendi.

Me sentei na mesa ao seu lado, bebemos, rimos, comemos e pouco tempo depois estavamos subindo para um quarto, ele com verteza achava que teria a melhor noite de sua vida afinal iria sair com uma mulher de um conde, mal sabia ele que aquele quarto seria o último lugar que ele veria em vida e eu finalmente passei a dormir direito.

Os anos foram passando criei algumas amizades muito boas e cultivei algumas inimizades que duraram até o fim dos meus dias. A maior delas obviamente foi com a mulher do conde, eu e o conde estabelecemos uma relação duradoura, ouso dizer que nos amavamos, cada um do seu jeito e cada um cedendo o que podia.

Toda vez que ele passava algum tempo na cidade dormiamos juntos e nessas noite conversavamos bastante, sobre negócios, sobre política, mas evitavarmos falar sobre sentimentos acho que era melhor assim. Estabeleci diversos acordos comerciais para ele, toda vez que ele não podia se envolver em alguma intriga diretamente era a mim que ele recorria e com isso minha fama e influência foram aumentando.

Mas como tudo na vida, o que sobe tem que descer e comigo não seria diferente.

Em uma das suas visitas o conde veio acompanhado do principe, era um jovem um tanto quanto arrogante e impetuoso, era o tipo de homem que eu destestava que conseguia o que queria e quando queria e mais uma vez eu fui alvo dos desejos de um homem.

O conde e o príncipe passaram algumas semanas na cidade, o conde me alertou sobre o interesse do príncipe a meu respeito e me alertou que ele não era do tipo de homem que desistia de algo facilmente, que era melhor para nós dois que eu cedesse.

Me senti ultrajada, me senti um objeto, me senti horrível, mal sei explicar ao certo o que eu senti.

O príncipe começou a frequentar meu estabelecimento por inumeras vezes me desviei meio sem graça dos assédios, ofereci garotas mais jovens, mais exóticas, mas infelizmente ele não desistia. Nunca deixei espaço para dúvidas da inexistência de interesse da minha parte, mas ele simplesmente ignorava e continuava aquilo de alguma forma sádica o excitava.

Me recordo da noite em que joguei tudo para alto, era em torno das 2 horas da manhã quando cheguei em casa de uma noite chuvosa e sem lua e la estava o principe me esperando, bêbado.

Ele não havia trazido seus guardas, acredito que ele pensava que uma mulher não seria uma ameaça, assim que o vi insunuei que me retiraria até a taberna para pegar algo a sua altura para que ele se alimentasse, talvez um vinho digno, como um gato ele se interpôs entre mim e a porta com um sorriso cínico nos lábios me disse que o que ele queria estava bem ali.

Fui na outra direção dizendo que me sentia elogiada pela sua atenção mas que infelizmente não podia retribuir sua atenção e afeto pois estava comprometida com outro homem.

Ele riu, disse que eu nada mais era que uma puta de luxo e que não possuía o direito de recusa lo, disse que não seria possível uma pessoa da minha estirpe esperar ter alguma relação com conde, quando percebeu em meu olhar, que eu possuia alguma esperança de isso acontecer ele gargalhou até quase perder o ar.

Naqueles dias poucas coisas me embaraçavam e muito menores eram as coisas que me feriam, mas aquela situação me feriu. Senti o ódio me queimar por dentro, inicialmente uma faisca mas que pouco a pouco me tomou por completo.

Avancei sobre ele com as unhas buscando os seus olhos, fui possuida por algo muito maior que eu, naquele momento senti todas as mulheres que foram agredidas ou injustiçadas por aquele homem e todas me deram força, ele tentou se esquivar mais foi em vão. Arranhei sua face e senti o ódio brilhar em seus olhos.

Ele me esbofetiou e cai desamparada no chão. Tentei agarrar qualquer objeto que fosse para me defender mas para um homem treinado para o combate eu não passava de uma distração .

Me defendi como pude mas meu corpo exigia que eu desistisse e me rendesse. Depois disso me lembro de pouca coisa, lembro dos pontapés, dos socos, lembro da voz do conde na porta e da faca que perfurou o meu ventre. Lembro do grito de dor do principe e do rosto do conde aos prantos tentando me socorrer, lembro das juras de amor e do beijo de despedida e depois disso só me lembro das trevas e do cheiro da dama da noite que desabrochava no meu jardim.

Não se esqueça de sonhar...

Marcelo Rebelo

Marcelo Rebelo
Enviado por Marcelo Rebelo em 10/12/2014
Reeditado em 30/03/2015
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