Sofrimento de uma amante

Todos me falam para te esquecer, mas seria insuportável não lembrar de você.

Ouço o silêncio da madrugada e sinto o barulho da sua ausência em minha cama.

A tristeza bate em meu ser e todos logo deduzem que a culpa é sua. Há tantos motivos para ficar triste, mas sempre sobra para você. Aliás, tudo em minha vida sobra para você. Você é sempre o culpado de tudo. Mas, não dê ouvido a eles, eu te absorvo. Não é sua culpa eu te amar, você só é culpado por ter permitido isso.

Me deixar ficar com as sobras de seu tudo fez tudo em minha vida

sobrar para você.

Que infelicidade é essa que nos assombra?!

Sim. A nós! Você pode até não perceber, mas você também está infeliz. Desde que nos separamos nada tem sido fácil na minha vida, na sua eu até imagino que esteja sendo assim também, mas não irás admitir.

Meu sofrimento é mais visível porque é de minha natureza, a sua natureza é fazer sofrer com barulho e sofrer em silêncio, talvez sofrer, mas sempre em silêncio.

Só sinto dor.

Não pretendo te esquecer.

Não está nos meus planos deixar de te lembrar toda vez que nossa música toca, toda vez que abraço o travesseiro bem forte e ainda sinto seu perfume nele, nas vezes que vou dormir com frio e sinto seu calor pertinho de mim, que logo me traz a lembrança do seu hálito quente em minha boca e que faz todo o frio sair de dentro de meu corpo.

Seria insuportável, sim, eu ter que fingir que não lembro de você nos momentos felizes, raros em minha atualidade; no choro de todo o dia, onde era você quem me consolava... Não sei mais o que fazer. Todos me dizem o que fazer: te esquecer. Mas ninguém diz como. Já tentei os livros de autoajuda, mas eles fracassam, não me auto ajudam em nada.

Ninguém quer ouvir o que eu penso disso tudo ou que eu pretendo fazer.

Por que você não atende mais minhas ligações? Deixei recado várias vezes. Liguei no seu trabalho, na sua casa, para sua mãe...

Queria que você falasse para todo mundo que você não é o culpado disso tudo, eu não sofro por sua causa. Amor, fale para eles que eu não preciso te esquecer, que você não quer que eu pare de lembrar de ti.

Eles não me ouvem. Eu sou invisível, somente meu sofrimento é visível para eles.

Volte, por favor. Responda pelo menos o sms carinhoso que deixei após a nossa última noite juntos, em que eu acordei e você já não estava mais do meu lado, saíra apressado para o trabalho quando eu ainda dormia como um anjinho (ainda ouço você falando isso como num sonho).

Se o despertador do meu quarto tivesse tocado para nos despertar nada disso teria acontecido: as suas letras no bilhete que você me escreveu não sairiam tão rabiscadas (só o desenho do coração que ficou perfeito), você não sairia tão apressado, eu ainda te veria partir, poderia despedir-me de ti, eu daria o nó na sua gravata (que você mesmo me ensinou a fazer), eu te beijaria no queixo e você daria aquele longo beijo na testa em que eu fechava os olhos o sorria largamente, e esse gesto se eternizaria por aquele momento. E viriam tantos outros momentos eternos como esse. Mas não.

Era rotina. Uma rotina boa, pro coração, para a alma. O que custaria isso se repetir por mais uns duzentos anos?

Mas não. O despertador não tocou. Eu não te vi sair, não nos despedimos e nada disso aconteceu.

Por que esse maldito despertador não tocou? Você não podia ter saído correndo daquele jeito. Sei que era a manhã do seu futuro, do nosso futuro, como você mesmo dizia, você seria promovido na reunião. Ganharia bem, mudaríamos para uma casa maior, sustentaríamos nossos filhos, eles estudariam na melhor escola, as meninas fariam ballet, contemporânea, leriam de tudo e amariam música, como a mãe, os meninos seriam expert em tecnologia, tocariam violão, assim como o pai, teriam os olhos castanhos da mãe e os cabelos encaracolados do pai; seria o nosso futuro. Mas você saiu muito rápido, sempre foi tão prudente e logo nesse dia, o dia em que o carro forte abastece o caixa eletrônico do supermercado da esquina de casa, você resolveu pisar mais fundo no acelerador, sem lembrar dos nossos sonhos, dos nossos planos, dos nossos futuros filhos, sem lembrar que o carro estaria estacionado na frente do supermercado e que você não o veria, pois as mangueiras e ipês não o permitem ver, eu já tinha te falado sobre isso e você sorriu dizendo que era impossível.

Não deixe eu ficar com as sobras do nosso amor, não quero construir nossos planos sozinha. Por favor, não. Ter que te esquecer seria castigo, eu não quero fazer isso comigo, nem contigo.

Começou tudo tão depressa, foi tudo tão depressa, acabou tudo tão depressa...

Taillany Mesquita
Enviado por Taillany Mesquita em 08/01/2015
Reeditado em 08/01/2015
Código do texto: T5094427
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