Maria Eugênia

Eu não tinha a pretensão de chamá-la de "gostosa". Não só por ser muito tímido e por se tratar de um ato indelicado, mas quando me perguntaram sobre ela, de imediato, não consegui pensar em nenhuma outra característica que a distinguisse das demais. Sim, de fato havia muitas outras moças loiras e de baixa estatura, bonitas inclusive, mas naquele embaraçoso instante, por ironia do destino, vi-me mergulhado na mais completa falta de criatividade. "A neta da dona Amanda?", eu poderia ter perguntado, mas não fui capaz de elaborar nada assim naquele momento. Além do mais, eu, na privacidade de minha mente, costumava chamá-la deste modo. Dada a minha grande discrição, conhecida muito bem no meio em que vivia, acabei por sobressaltar a todos. Se fosse outro que o dissesse, não lhe dariam a menor atenção, mas como se tratava da minha pessoa, apressaram-se em dar corda. Como muito azar ainda é pouco, mal eu fechara a boca, lá estava ela a surpreender-nos.

- O Ivan acabou de dizer que te acha gostosa.

Gordinho dedo-duro de uma figa, por pouco não lhe esmurrei a cara! Aquilo era verdade, mas estava totalmente fora de contexto. Tudo bem, reconheço. Talvez não estivesse tão fora de contexto assim, mas, não sei por qual razão, não era verdade o que ele dizia; não tudo! Mas como eu poderia explicar? Fui traído pela minha mente, pelo reflexo, pelo movimento apressado e irrefletido dos lábios. Emudeci. Assim que ela olhou para mim, com aqueles belos olhos grandes, abismados e interrogativos, eu corei, ficando totalmente vermelho, como um pimentão. Comecei a transpirar. Gaguejava algo incompreensível quando, sem mais explicações, voltei-me para o canto. Quem cala consente, pensei. Ademais, nenhum dos presentes protestou. Isso soou como uma martelada contra a minha causa. Não consegui lhe pedir desculpas, não naquela ocasião, mas senti a necessidade de fazer isso quando se mostrasse mais apropriado e em condições de fazê-lo.

Certo dia, tomado por uma coragem incomum, talvez não fosse coragem, mas medo ou estupidez, dirigi-me até à loja onde ela trabalhava. Era uma pequena loja de roupas femininas que ficava na rua dos Limoeiros, número 630. Espiei-a pela vidraça por alguns minutos. Havia clientes ali e o que eu menos desejava era chamar atenção. Logo na primeira oportunidade, sem dar margem às hesitações, entrei e aproximei-me do balcão.

- O que você quer?

- Eu vim lhe pedir desculpas.

- Desculpas? Pelo quê?

- Por causa daquele dia. No parque.

Eu não queria ser muito direto, pois receava parecer descortês novamente, mas tinha o sincero interesse de que ela entendesse claramente a minha mensagem. Bem, o recado estava dado. Se não me desculpasse, eu não iria continuar a culpar-me a vida toda. Já havia feito o que a civilidade requiria e isso bastava-me.

- Ah! - murmurou ela, vagamente; depois voltou o olhar para o piso e, sem dizer mais nada, direcionou-se sem pressa até uma das prateleiras, concedendo-me as costas.

Meus olhos, até então acovardados e pendidos, ganharam vida própria e enveredaram-se para as suas nádegas. Eram lindas! Bem firmes e arrebitadas. Ela tinha sobre o corpo uma camiseta escura, entre o preto e o azul, e uma bela saia bordô justa de cintura alta.

- Gostosa! - sussurrei.

- Oh, moça - disse uma senhora corpulenta que, sem que eu me desse conta, terminava de adentrar a loja -, este jovem acabou de chamá-la de gostosa.

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