Uma suave expectativa

Antonio estava chateado por não poder acompanhar seus filhos no feriado prolongado, na pousada que a diretoria da empresa estaria se reunindo. Quer dizer, dos três dias previstos ficaria um e meio. Mas tentou se contentar, pois podia ser pior. Mas ao analisar seus motivos se deu conta que a insatisfação maior não era por causa dos filhos desacompanhados e sim pela bela moça que estaria lá.

Finalmente encontrara alguém interessante e que não se interessou por ele por conta de sua posição social. Mas ela parecia repudiá-lo mais que o normal e ele estaria perdendo uma grande oportunidade de investir em alguma coisa. Seu filho mais velho tentou consolá-lo.

- É melhor assim, papai... acho que nunca te vi tão ansioso... Deixa que eu preparo o terreno pro senhor... assim poderemos ter uma idéia de como é o relacionamento dela com o pai do filho dela... E vou estar por perto se ela for ameaçada de ser humilhada... andei observando o cara na empresa e realmente ele tem um nariz muito arrebitado. E está noivo da filha de um dos diretores... então o cara acha mesmo que está podendo e uma secretária me falou que preferem ver o diabo que ele. Então a Sabrina não exagerou...

Assim o pai viu os filhos saírem de malas prontas no sábado de manhã. Sua chegada estava prevista para a noite do dia seguinte e ele mal cabia em si de ansiedade. Não apenas para encontrá-los, mas para saber o que teria sucedido na sua ausência, e ele também pretendia conquistar novos investidores para a empresa, que foram propositalmente convidados para o evento.

Assim, logo que deu entrada no hotel, correu para o quarto dos meninos. Já era tarde, mas sabia que seus filhos iriam esperá-lo, e foi com surpresa que encontrou o quarto vazio. No telefone falou com o mais velho e ele veio encontrá-lo. Ao pedir notícia do filho caçula, o mais velho abriu um sorriso gigante.

- Acho que nunca vi o Pedro tão feliz... ele está simplesmente radiante e andou atrás do Miguel e da Sabrina o tempo todo... Até eu e a Ângela não agüentamos ficar muito tempo longe deles... Eles são divertidíssimos, pai... o senhor tem que ver...

- E o pai dele?

- Nem olhou pro lado dela... e ela se via ele de um lado, ia pro outro... mas a família dele gosta dela... pelo menos algumas pessoas ficaram felizes por ela ter vindo... Outros a ignoraram, mas ela nem se importou já que ficamos andando o dia inteiro, ontem e hoje também...

- E o que vocês tanto andaram? Você com sua namorada e dois adolescentes e a mãe de um deles?

O rapaz sorriu muito tranqüilo. Depois ficou sério.

- ontem a tarde a gente foi na cidade e eles quiseram tomar um lanche em um bar. Depois... eles pegaram um violão de lá mesmo e tocaram várias músicas... depois passaram um chapéu e recolheram muito dinheiro... depois compraram comida e distribuíram na rua... pai... foi muito bonito... todo mundo cantando com eles e a gente lá... olhando que nem bobos...

Antonio olhava enternecido enquanto seu filho relatava. Como ele parecia querer falar mais, esperou.

- Daí eu perguntei por que ela trabalhava em um shopping se ela sabia cantar e tocar tão bem e sabe o que ela respondeu? “Não é essa vida que eu quero dar pro meu filho... ele gosta de cantar e tocar mais que eu então nós fazemos isso, mas assim, espontaneamente... e nunca, absolutamente nunca por dinheiro... e quando a gente ganha a gente distribui...”. E hoje a gente foi na excursão da terceira idade e tinha uns idosos provocando os meninos pra eles chegarem juntos nas meninas e o Pedro ficou bravo. Daí ela falou com ele que ele não precisava se preocupar pois eles já tinham opinião formada sobre o assunto então que ninguém poderia influenciá-los. Que ela havia ensinado tudo que ela sabia para o filho e que agora era por conta dele...

Antonio começou a se despir enquanto ouvia.

- E você teve oportunidade de conversar com o Alfredo? Ele trouxe a esposa?

Esse era o investidor cobiçado. Seu filho sorriu mais ainda.

- Fiz melhor, papai... convidei ele e a esposa para um passeio com a gente e eles ficaram encantados com as histórias da empresa que contamos. O Miguel os deixou impressionados com a contabilidade... eu falei dos projetos, em andamento e futuros, e eles ficaram absolutamente encantados com todos nós... Sabrina deu atenção total para a esposa dele e eu para o marido... até quando eles foram seqüestrados pelos grandões...

- E você com a namorada?

- A Ângela está sendo perfeita... ela ajudou a Sabrina com o penteado ontem e me ajudou com a esposa do Alfredo... agora nós estamos dormindo juntos por que o Pedro está dormindo no quarto com o Miguel e a Sabrina... – Antonio fez cara de assombro – é isso mesmo que o senhor ouviu... ele dormiu ontem e quando eu fui levar o remédio dele, por que ele não dorme sem ele, lembra? Cheguei lá, dois minutos depois e o moleque estava babando... Perguntei o que ela fez e ela disse que contou historinha do anjo da guarda pra ele... de como é difícil a profissão de anjo da guarda...

Antonio sorriu tentando imaginar a cena.

- E eu posso ir vê-lo?

Samuel olhou no relógio.

- Não sei... é bem capaz de eles já terem dormido... hoje foi um dia cheio... aliás, digno de nota... os dois tocaram músicas depois do jantar, junto com um grupo que tocou, e sumiram... quando chegamos no quarto eles estavam lá... disseram que não gostam de ficarem se exibindo depois do show...

- onde é o quarto deles?

- Aqui do lado, papai... como o senhor pediu... mas acho melhor o senhor deixar para acordá-los amanhã de manhã... eles são os primeiros a tomar o café, para aproveitarem bem o dia...

Antonio se deitou algum tempo depois, mas seu sono foi inquieto. Acordou com a luz do dia e tomou um banho rápido. Instantes depois estava batendo na porta ao lado. Um garoto alto e muito simpático atendeu a porta, mas ele estava sonolento.

- pois não?

Antonio sorriu ao perceber que o garoto não o reconheceu. De fato, quando o vira pela primeira e única vez ele estava formalmente vestido para um jantar. Agora de roupa esportiva e àquela hora da manhã, era perdoável. Por isso não quis se impor.

-Meu filho já acordou?

O garoto pareceu recobrar a memória e puxou a porta.

- me desculpe, senhor Antonio... mas não... ainda está dormindo e minha mãe também... então se o senhor nos der alguns minutos logo o encontramos no café...

Havia respeito e humildade na postura dele, mas ele segurava a porta numa tentativa de não expor a mãe em trajes menores. Antonio gostou dele.

- Não se preocupe, meu filho... não tenha pressa... eu espero lá embaixo... só queria saber se está tudo bem...

- sim... seu filho dormiu de um lado só... aliás todos nós...

Antonio não quis ser indelicado, pois via-se que o garoto estava pouco a vontade em trajes de dormir. Pediu licença e foi esperar no restaurante. Mas quando eles desceram, somente seu filho veio cumprimentá-lo e Antonio pode constatar que ele estava realmente muito bem. Um simples “ E aí, paizão, tudo em cima?” foi o único indício do humor do filho, o qual era sempre azedo nesses eventos.

Mas apenas pode ver de relance mãe e filho entrando na fila para se servirem, pois logo um dos sócios veio cumprimentá-lo. E se ele queria se sentar com o filho, já era. Logo sua mesa foi composta por outras pessoas, inclusive o Sr Alfredo. Mas um dos sócios o provocou. Antonio não se incomodou pois este era um dos que ele mais gostava. Mas era irmão do pai do filho de Sabrina.

- que bom que você chegou a tempo, Antonio... estamos fazendo muito progresso aqui... e seu filho ajudou muito... o Sr Alfredo me ouviu muito satisfeito... parece que ele vai fechar com a gente...

Antonio o ouviu muito concentrado, pois ele não era um homem de sorriso fácil. Apenas meneou a cabeça suavemente. Mas o quase amigo sorriu mais relaxado.

- Então... com um problema a menos, que tal uma diversão para você? Alguns sócios têm filhas muito bonitas, e algumas sobrinhas também... Nosso grupo está ocupando quase a metade dos quartos... Você quer que eu te apresente alguém? Tem muita gente que andou reclamando sua ausência...

Antonio o olhou demoradamente, com muita vontade de compartilhar seus sentimentos com alguém. Mas uma vozinha o avisou que ainda era muito prematuro. Que ela não queria se expor.

- Eu agradeço a oferta, mas eu já tenho alguém... – o homem pareceu se assustar. Antonio remendou – quer dizer... eu já estou interessado em alguém, mas ela esta me evitando...

O homem sorriu incrédulo.

- Mas como isso é possível? Quer dizer... nunca pensei...

- Nem eu... o que mais me incomoda são mulheres cobiçando o meu status... e fico até pensando se não é por isso que eu estou tão interessado nessa...

- E o que exatamente você viu nela? Se ela está te evitando suponho que você deva conhecê-la pouco...

- Sim... você está certo... estou louco de vontade de beijá-la... mas preciso ser paciente... mas eu venho observando-a bem de perto e eu gosto do jeito que ela conduz sua vida e a de seu filho...E não consigo parar de compará-la com minha ex... Ela tem muitas qualidades superiores e, no entanto, é uma pessoa simples... de hábitos humildes... ela tem os pés no chão, entende?

O homem o olhou estranho.

- Acho que não, amigo... mas isso não importa... mas enquanto estamos aqui e ela em algum lugar, que tal...

- Ela também está aqui... mas agradeço sua oferta e prefiro ficar com meus filhos, se não se importa...

Antonio precisou segurar seu sorriso ao ver a cara incrédula do outro. Mas não quis perder mais tempo para satisfazer a curiosidade dele. Quando se levantou e procurou seu grupo foi com muita satisfação que os viu sentados mais à frente, e todos, absolutamente todos sorriam.

E seu olhar se fixou na mulher almejada. Ela vestia um delicado vestido muito leve e seu cabelo estava preso frouxo. Sua pele estava limpa e não havia adornos desnecessários em seu rosto. Era apenas ela, com um lindo sorriso enfeitando sua figura. E por um momento seus olhares se cruzaram. Ela não sorriu pra ele. Mas seu olhar era profundo, de uma pessoa que não perdia tempo com frivolidades e sensações. Antonio tratou de buscar um pratinho, pois haviam deixado um lugar na mesa pra ele. E ele viu um suave sorriso quando ela abaixou a cabeça para seu prato.

Lucilia Martins
Enviado por Lucilia Martins em 05/11/2015
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