O MONGE E O POETA
Sentado numa pedra, no alto de um penhasco, o poeta olhava para o céu estrelado. Tão inebriado com a visão ele estava e tão absorto em seus pensamentos, que não percebeu a presença do monge que o observava. Ficaram os dois a fitar o firmamento até que uma exclamação do poeta quebrou o silêncio.
- Ela piscou! Tu viste, meu amigo?
Assustado e surpreso o monge respondeu que nada tinha visto e indagou, o motivo de tanta euforia.
- Como não viste? Ela piscou para mim! Respondeu o poeta.
Ainda mais intrigado, sem nada entender, pergunta-lhe o monge:
- Ela quem, meu amigo? Estás bem? Estamos sós, cercados por montanhas...
Ainda assim, o poeta vibrava e apontava para o infinito.
- Ela, a minha estrela! Há horas que estou a lhe admirar e enviar vibrações de amor. Finalmente ela as recebeu e retribuiu com uma piscadela!
Compadecido do amigo, que parecia ter perdido a razão, o monge, arriscou um conselho:
- Ah! Poeta, achas então que podes possuir uma estrela? Perdeste o juízo? Não vês que estão a quilômetros e quilômetros de distância? Já calculaste quantos anos-luz seriam necessários para aproximar os dois? E o brilho dela? que faria com ele para que não te ofuscasse a visão? Não, meu amigo, decididamente não estás de posse da tua sanidade mental. Imagine! Possuir uma estrela! E estás tão cego de paixão que não vês o absurdo que dizes e que estás a desejar. Ela não piscou para ti. Apenas cumpriu o seu papel no firmamento, brilhou. Esquece, para o teu bem, deste despropósito ou te julgarão louco.
E o poeta, que até então permanecia ouvindo em silêncio, falou:
- Estás enganado, meu amigo, se pensas que enlouqueci. Continuo mais do que nunca, dono da minha mente, cônscio dos meus limites e da realidade, mas, que lei me proíbe de contemplar e amar uma estrela, mesmo à distância? Nunca falei em possuí-la, isso seria impossível, bem sei. Que prejuízo este sentimento traria para qualquer um de nós? Portanto, meu caro, não tires conclusões equivocadas e fique tranquilo, não estou louco, estou apenas apaixonado por uma estrela.
Tal foi a convicção com que o poeta defendeu seu argumento, que o monge entendeu que aquela era mais uma lição que ele havia aprendido. Sim, o amigo tinha razão, não podemos possuir as estrelas, mas nada nos impede de amar e contemplar o seu brilho da solidão de um penhasco, nas noites de céu faiscante.
Fatima Almeida
09/04/16