RIO DOURO - IMAGEM GOOGLE




 
VIAJANDO...
 
 

 
Anna pegou na sua mala-trólei e entrou no barco, arrastando-a. Sentia-se maravilhada com a viagem até essa altura.

Trabalhara muito, poupando durante quatro anos, para fazer o que considerara ser uma viagem de sonho.
Considerando o salário médio no Brasil, o seu até que era muito bom, trabalhando como secretaria de administração numa multinacional no Rio, cidade onde morava com a mãe e uma irmã, felizmente uma pessoa calma e doce.


Um casamento sensaborão e uma mãe possessiva eram o resumo da sua vida. Tinha outra irmã, a viver em Belo Horizonte, casada e com uma filha adolescente.

Fora à agência de viagens e decidira mesmo fazer essa deslocação, caríssima por ser por encomenda, isto é, um grupo de pessoas resolvera pedir um roteiro fora do habitual e assim, a troco de uma nota preta, fariam quinze dias de viagem, passando uma semana em Portugal e outra em Paris. Não conhecia nada fora do seu país e entendeu que o esforço compensava. Para além da despesa obscena, também teve de enfrentar a chantagem da mãe, sempre com medo de morrer, egoísta, apenas pensando nela. Felizmente teve o apoio da irmã que vivia com elas e assim decidiu mesmo levar a viagem por diante.

Agora, depois de ter passado três dias em Lisboa, conhecendo os encantos da capital, maravilhara-se com a gentileza e hospitalidade dos portugueses. Depois seguira viagem de autocarro com o grupo, tendo parado em Coimbra, fazendo uma visita guiada que terminou com o almoço de leitão na Mealhada.

Chegados a Gaia, em frente ao Porto e na margem esquerda do rio Douro, embarcou num barco-hotel onde dormiria nas quatro noites seguintes e conheceria as maravilhas que aquele rio lhe guardava.

A tripulação recebeu o grupo, bem como as outras pessoas que embarcaram nessa viagem… Após um cocktail de boas-vindas, o capitão apresentou a tripulação e seguiu-se a socialização dos presentes. Excetuando um casal de meia-idade, espanhol, todos os outros eram na maioria portugueses ou então brasileiros, os do grupo dela.

Depois do jantar ficara algum tempo na conversa com o capitão, bem como com um casal oriundo de Santos e que se revelou ser simpático. Durante a amena troca de palavras, ela reparou melhor no capitão, chamava-se Pedro, não usava aliança, de cabelo grisalho e barba aparada curta, também branca. Alto, elegante, atraiu-lhe logo a atenção aquele olhar, sempre atento e inquisidor.
Deitou-se logo porque a viagem fora cansativa.

Acordaram cedo e depois do pequeno-almoço navegaram até ao Pinhão, tendo almoçado a bordo. A paisagem era soberba, os vinhedos em socalcos organizavam-se tendo por finalidade a produção do mundialmente famoso vinho da região.

Continuaram para a Régua, tendo ido visitar o Palácio de Mateus e os respetivos jardins, uma delícia para o olhar. Todos tiraram fotos e ela foi alvo da atenção de Pedro, o que muito a lisonjeou, tendo também reparado num ou noutro olhar de inveja de algumas das mulheres.

Depois de jantarem numa quinta produtora de vinho, também na região de Pinhão, regressaram ao barco. Ela andou pela amurada da proa, pensativa e olhando o belo luar. Pressentiu Pedro por perto graças ao sexto sentido que sempre a acompanhara e agora, perante aquela presença, sentiu o coração acelerado, não sabia explicar porquê.

Estiveram a conversar durante algum tempo até que Anna reparou que mais ninguém andava por ali pelo que pediu licença e se retirou. Ele acompanhou-a até à porta do quarto e gentilmente beijou-lhe a mão, depois afastou-se, deixando-a entrar.

Na manhã do terceiro dia navegaram até Barca d’Alva, mesmo junto da fronteira com Espanha. Depois de almoço fizeram uma visita guiada a Castelo Rodrigo, sempre com Pedro de perto, acorrendo solícito e esclarecendo alguma dúvida sobre a história do lugar. Pernoitaram no barco, ancorados no pequeno ancoradouro daquele simpático lugar.

Anna sentira-se desconfortável pelos olhares intensos e de animosidade que algumas das viajantes lhe dirigiram desde o dia anterior e para evitar maiores males, retirara-se cedo para o quarto. Teve insónias e não conseguiu dormir, tentou a leitura e também ver um pouco de TV mas nada… Fora até à varanda mas recolhera-se logo porque a aragem era fresca. Deitou-se de novo e após algumas voltas na cama finalmente adormeceu, já a madrugada era invadida pelos primeiros raios solares.

No início do quarto dia, após o pequeno-almoço, navegaram de novo rumo à Régua.

Depois do almoço, Pedro colocou-se ao seu lado e não mais a largou. Foram todos visitar Lamego, bem como o seu Santuário, de Nossa Senhora dos Remédios.  

Pedro desdobrou-se em atenções enquanto Anna se dividia entre dois sentimentos contraditórios: por um lado lisonja pela atenção, muito agradável para ela, de que era alvo por parte de Pedro; pelo outro lado, a aparente animosidade de algumas das mulheres, o que a deixava exasperada pois ele era livre e ela também.

Após o jantar navegaram para Porto Antigo. Houve depois um pequeno baile de despedida, dançou com um dos tripulantes até que Pedro se aproximou e lhe pediu uma dança. Ela não tinha motivo nem vontade de recusar e dançou com ele três músicas conhecidas. Sentiu-se voar nos seus braços, parecia-lhe um sonho, que estava numa fortaleza, protegida de todos os males. Fechou os olhos e deixou-se ir.

Mais tarde, ela pediu licença, alegou sono e depois encaminhou-se para o quarto. Quando abria a porta, sentiu-o perto… Demais, pois ele enlaçou-a e junto a ela entrou, fechando os dois no quarto. Ela olhou-o, sem saber o que dizer ou fazer… Na realidade, queria muito fazer aquilo que o coração negava. Como sempre, seria a razão versus coração.

Anna olhou-o, aflita, quase numa súplica. Pedro tomou-lhe o queixo nas pontas dos dedos e beijou-a suavemente nos lábios. Ela sentiu-se quase a desfalecer, ele amparou-a e deitou-a na cama.
Anna fechou os olhos e deixou que ele a despisse.

Lembrou-se depois da boca dele lhe ter incendiado o corpo, de ter gemido muito, sobretudo quando ele a invadiu suavemente, com doçura.
Adormeceu com o rosto sobre o peito peludo dele, nua e colada ao seu corpo.

Manhã cedo ele amou-a mais uma vez e desta vez ela soltou-se, tomou iniciativa nas carícias e surpreendeu-se a si própria pela audácia. Em vinte anos de casamento insonso com Aldair nunca sentira nada de semelhante e mesmo antes, apenas sentira algum prazer com Paulo, o seu colega de Faculdade. Mas esse tempo também já era passado e arquivado nas suas memórias mais remotas, nunca mais o vira. Tal como ao marido, do qual não tinha nenhumas saudades.

Pedro virara uma loucura, queria ficar toda a vida com aquele português doce e lascivo, que a fizera soltar a verdadeira Anna, tantos anos reprimida. Amava-o, desejava-o muito, pelo menos era isso que pensava, apaixonara-se insanamente nesses poucos dias e agora que se entregara, tinha esperança que a relação frutificasse. Não sabia como, mas o sonho desconhece a racionalidade.

De manhã seguiram em navegação de regresso ao Porto, tendo à chegada sido recolhidos por um autocarro que os levou até ao aeroporto Sá Carneiro. Antes, na despedida, trocaram contactos, prometeram escrever,  telefonar um ao outro e ela despediu-se dele com lágrimas nos olhos.

Embora percebendo que as hipóteses de relacionamento com Pedro seriam remotas, não iria perder a esperança. Tudo era possível até prova em contrário, mas agora queria sobretudo viver um dia de cada vez. Sem tirar Pedro do pensamento, também devia ter Paris em mente, esperava-a uma semana para se deliciar na cidade-luz.
 
 

 









 
Ferreira Estêvão
Enviado por Ferreira Estêvão em 12/04/2016
Reeditado em 12/04/2016
Código do texto: T5602628
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