Naquele Bar

Ali eu estava por mais um dia, sentada no banco daquele bar e aguardando um sinal, uma resposta ou qualquer coisa que fosse sobre ele.

- "Outro conhaque" - Eu pedi. Já era o terceiro daquela noite, e a noite nem havia começado.

- "Cinco reais".

Verifiquei minha carteira. Uma nota de dez reais, mas eu ainda precisava comprar um cigarro.

- "Eu tenho dez. Tem como me vender um cigarro?"

- "O cigarro é seis" - Ele me olhou com uma mistura de pena e desprezo.

- "Posso te dever um real? Eu te pago aman..."

- "Quer saber? Leva o cigarro. Um real a mais ou a menos não faz diferença".

Agradeci, peguei meu copo e meu cigarro e voltei pro banco lá fora. Abri o maço e acendi um cigarro. Um trago, dois tragos, três tragos. Com quantos tragos te trago pra mim?

Dei um gole no conhaque. Me lembrei de cada maldita noite em que passei do teu lado, sentindo teu cheiro e transando bem baixinho, pros teus amigos não escutarem. Outro gole. Te esqueço pra beber ou bebo pra te esquecer?

Foi nesse bar, nesse maldito bar que uma vez você me chamou pra ir.

- "Ta na hora, o show já vai começar. Vamos?" - Eu te disse.

- "Eu to esperando há um mês por esse show" - Você se sentou na cama e pegou na minha mão".

- "Eu sei" - Teu toque me estremeceu e meu olhar tentou evitar o teu.

- "Mas por você eu to esperando há dois meses. E eu não vou deixar de aproveitar cada segundo com você na minha cama".

Você me beijou e me jogou na cama, tirou lentamente a minha roupa, e de uma forma sutil e excitante ao mesmo tempo, me beijou por todo o corpo. Eu enrosquei meu dedo entre seus cabelos e desejei que o tempo parasse com você ali.

E ali eu estava naquele bar, me lembrando de tudo e desejando desesperadamente que ele aparecesse. Segundo cigarro, mais um gole no conhaque. Terceiro cigarro. Eu já ia embora quando avistei de longe, aqueles cabelos enrolados. E me lembrei de novo da sensação de enroscar meus dedos entre eles.

Ele me avistou, mas foi como se eu não estivesse ali. Ele me olhou, mas foi como se não me enxergasse. E foi nessa hora que eu descobri que o pior dos sentimentos não era a raiva, o ciúmes ou o ódio. O pior deles é o sentimento de rejeição. Eu fui ignorada por uma pessoa que me conhecia intimamente. Tão intimamente que me senti a vontade para me despir na frente dele. E não estou falando de roupas. Eu despi para ele a minha alma e mostrei para ele a minha verdadeira nudez. Ele me viu tão despida, mas tão despida que não gostou do que viu.

Ele ficou pouco tempo ali, então resolveu ir embora. A tempestade que fazia aquela noite, com toda aquela chuva nem se comparava com a que eu estava sentindo dentro de mim. Peguei meu copo e corri. Corri por duas quadras na chuva, gritando pelo nome dele. Joguei o copo fora e continuei gritando. Ele parou, mas não me olhou.

- "Eu preciso conversar contigo" - Disse pra ele. A chuva molhando todo o meu corpo e borrando a maquiagem impecável. Ela escorria entre os cabelos enrolados dele e pelos lábios carnudos que um dia eu já beijara.

- "Eu to ouvindo".

- "Por que você ta me tratando assim? Eu sinto a tua falta..." - Tentei beijá-lo e ele virou o rosto. Aquilo me feriu como ser queimada viva.

- "Eu acho que a gente não tem mais nada pra conversar".

- "Moreno..."

- "Para com isso! Nós não temos mais nada a ver um com o outro".

- "Eu sinto a tua falta, eu gosto muito de você..."

- "Gostar de mim? Eu não acho que você tenha gostado de mim algum dia. Você gosta tanto de mim que fodeu com o meu melhor amigo!"

Era verdade. Mas não era assim.

- "Não foi assim... Você também transou com outra no mesmo dia!" - Repliquei com lágrimas nos olhos.

- "Ela não era sua amiga. Mas tudo bem, eu já não ligo pra isso. Eu gosto muito dele e fico feliz por ele. Mas não acho que podemos ter mais nada agora".

- "Moreno... Eu sinto muito..." - Eu chorei como um bebê e pude diferenciar o gosto da lágrima no meu rosto, do gosto da chuva. Tinha um gosto salgado, de saudade e desamor.

- "Eu gosto muito de você. Mas eu não te amo".

- "Por quê?" .

- "Vá pra casa. Já é tarde e a chuva não vai parar".

- "Eu ainda quero conversar com você. Moreno, por favor não vá ainda!"

- "Eu estou com outra. Já faz um tempo. Eu a amo e nós estamos felizes juntos. Segue a tua vida também".

Ele se virou e partiu. Ele partiu e meu coração também. A chuva caía mais forte que nunca, mas não se comparava à tempestade de tristeza que se passava dentro de mim. Acendi outro cigarro e me sentei num canto, observando aqueles longos cabelos enrolados caminharem pra longe de mim. "Já é tarde e a chuva não vai parar". Ele tinha razão. Desde então ainda sinto a chuva cada vez mais forte e cinza, com gosto de saudade e arrependimento. Às vezes fraca, às vezes imperceptível... Às vezes forte e muitas vezes avassaladora. E eu me molho cada dia mais nela, pois até hoje eu a vejo como numa nuvem pairando sobre a minha cabeça, e me acompanhando pra qualquer lugar que vá, me lembrando a cada segundo dele e trazendo um sentimento pior ainda que o desprezo: a saudade.