EU E MEU NAMORADO

Antes de tudo faço menção que a princípio o que escrevo aqui era para ter sido uma crônica com uma pitada de humor, isto acerca de um mês atrás, quando passamos aquela noite na Lapa. Mas o tempo foi passando e com os dias cada vez mais corridos só fui adiando. A inspiração não me fugiu, mas os mínimos detalhes que fariam toda a diferença, passei a percebê-los de uma outra maneira que não se encaixariam mais tão bem ao que tinha proposto a escrever.

Então, pensei em escrever uma carta para você, descrevendo nela, as maravilhas que você fez e faz em minha vida, e a importância que você tem nela. Isso pensei logo após o nosso passeio pelo Museu do Amanhã. Mas, hoje resolvi parar tudo para definitivamente registrar uma coisa e outra para que nada mais se perca.

O tempo não para e vamos vivendo momentos em cima de momentos que vão construindo a nossa história. Sem perder a inspiração nem de um dia e nem de outro, resolvi unir aqui momentos do que seria a crônica com os sentimentos que expressaria na carta. Eis que surge um conto sobre nós dois juntos, eu e você. Me regozijarei agora e muito orgulhosa disso, em abordar como é que a gente acontece. Como é quando acontece eu e meu namorado.

Não me lembro de muitos momentos bons quando eu ia ao Centro do Rio de Janeiro. Não importa a época, nunca ia para passear, mas sempre para resolver coisas. Quando mais jovem, pulava de agências em agências para procurar empregos e isso implicava também em achar ruas e mais ruas.

Nada me tira até hoje, a sensação de estar indo a uma caçada às bruxas, pois sempre aonde eu ia tinha um aglomerado de pessoas querendo a mesma coisa que eu. Se cada pessoa na ocasião levantasse suas infinidades de currículos impressos, e neles ateassem fogo, ali estariam as tochas acesas.

Naquela época não existia GPS e nem o "Salve! Salve!" Google Maps. Era aquele mapinha de ruas do Centro mesmo que se comprava em uma banca de jornal. E depois com o passar dos anos, minhas idas ao Centro se limitaram a visitas à Prefeitura da Cidade, agências bancárias, clínicas médicas... Ou seja, resolver coisas.

E nosso primeiro encontro foi ser logo aonde? Isso mesmo, no Centro da Cidade do Rio de Janeiro, bem na gema, local que só de pensar, minha mente já se fadigava no automático. Não se engane como eu me deixei enganar, caro leitor. O Centro tem lugares maravilhosos para se visitar e conhecer, mas ainda penso que se não fosse com o meu namorado ao lado, ainda assim eu não o apreciaria tanto como o faço nos dias de hoje.

Eu nunca me vi literalmente, como fizemos algumas vezes, passeando tranquilamente de mãos dadas, em meio a todo aquele contraste (riqueza x pobreza) que todos sabemos que existe no local, pois dependendo do lugar, o cenário pode mudar bruscamente. Mas eu passeava tranquila com ele, atenta, mas tranquila. Sentia-me pela primeira vez, verdadeiramente amada, feliz e até mesmo carioca, só pelo fato de estar na companhia dele, que por sinal conhece tão bem o local.

Fomos a restaurantes, visitamos exposições, museus, centros culturais, cinemas... A lista é meio extensa, pelo menos se comparada às limitações de antes. Nunca imaginei na vida me sentir a pessoa mais feliz do mundo por estar de pé, abraçada com meu namorado em plena Av. Rio Branco, esperando um VLT (Veículo Leve Sobre Trilhos). Aliás, eu só fui saber da existência do mesmo por causa dele. Bem, não foi só isso que eu descobri por causa dele não. Descobri muitos outros fatores que estavam dentro dos meus sonhos, porém totalmente fora da minha realidade antes dele entrar na minha vida. Descobri que existem passeios românticos, de mãos dadas, abraços apertados em pleno ponto de ônibus, beijos que despertam olhares alheios em um banco de praça. Devo confessar que quando não é em uma cena de filme que vejo isso acontecer entre dois adultos, na vida real, só costumo ver com adolescentes ou casais bem mais jovens que nós.

A verdade é que independente do que estamos fazendo ou o local que estamos, sempre acontece um episódio que marca a ocasião. Como por exemplo, a última vez que fomos ao cinema e eu voltando do banheiro, guiava os meus passos até ele. Ele estava sentado na mesa, levantou-se e puxou a cadeira para eu tomar assento. Eu não reparei, mas depois ele comentou este gesto típico dele, que naquela ocasião atraiu vários olhares. Inclusive o de uma senhora de idade sentada em uma das mesas que possivelmente deve ter pensado: Nossa, ainda acontece coisas desse tipo nos dias de hoje e com esta juventude?

Eu em nada duvido, pois eu ainda além de pensar o mesmo, também gostaria de estar no meu próprio lugar. Qual mulher não gosta quando seu namorado lhe abre a porta do carro? Ele faz isso sempre... Sou uma privilegiada por ter ele... E mesmo apesar de não estar habituada a este cavalheirismo "atípico" para a época, não demorei a me acostumar ao mesmo, pois sempre me considerei uma dama, ainda que outros homens não tenham conseguido me enxergar assim.

Nunca esquecerei a ligação do meu pai para mim em que perguntava se eu estava bem. Eu bem? Bem é muito pouco, quis responder. Mas desisti da resposta ao ver que estava deslocada a quilômetros de distância da minha casa, em pleno sábado à noite, em um dos bairros mais boêmios do Rio de Janeiro, na Lapa. Apesar da confiança que meu pai tem em mim, optei por não querer preocupá-lo com o cenário totalmente novo aos meus sentidos, pois a sensação era incrivelmente nova e diferente. Apesar de ser adulta eu me senti adulta naquela noite, apesar de ser carioca, eu me senti carioca naquele dia, apesar de ser mulher, eu me senti mulher nesta minha vida, só pelo fato dele estar comigo.

Eu e meu namorado somos a soma do sucesso de toda a prática, de cujos relacionamentos anteriores tanto meus quanto dele, eram apenas teorias, ou até pior, quando nem isso tinha. Ele me faz tão bem... Me faz rir e sorrir também. Tira de mim sorrisos bobos e me arranca gargalhadas. Nunca esquecei aquele dia em que "discutíamos" em qual hotel passaríamos a noite. Ele dizendo que conhecia um que era muito bom e eu o provocando com risos, acerca dos comentários feitos pelos usuários do hotel, que não eram nada bons. Então, eu lia rindo pra ele:

- "Como assim o gerente deu em cima da minha mulher e os garçons choram por gorjetas?"

Eu não fazia ideia de que ele não deixaria a minha provocação barato, e não passaria desapercebido nenhum detalhe negativo relativo a nossa nova escolha, sugerida por mim. Conheci este lado dele naquela noite, e o amei ainda mais por isso. Chegamos no hotel, ele foi tomar um banho e ao sair já perguntou extasiado como alguém que tinha acabado de realizar um nocaute.

- Onde estão as pantufinhas?

- Pantufinhas?

Como assim ele queria pantufinhas?

- Sim, lá no que eu sugeri tinha pantufinhas.

Eu ri muito daquela atitude dele, mas tínhamos coisas bem melhores para "discutirmos" naquela noite. E assim sucedeu, experimentamos momentos maravilhosos de intimidade, e quando mesmo aquecidos nos braços um do outro, começamos a perceber que somente o lençol não estava dando conta do frio gerado pelo ar condicionado. Agora entre nós havia um consenso, nada de desligar o ar. Afinal, que diabos de ser humano consegue dormir sem aquele barulhinho gostoso? Pedi a ele que ligasse para a recepção e pedisse um cobertor. Ele fez igual a Judas e negou três vezes. Sim, eu contei.

Apesar do telefone estar do meu lado da cama e mesmo sem entender no momento a sua negação, já que o cavalheirismo é sua marca, logo em seguida a sua atitude seria assimilada.

- Mas por que não amor?

- Porque no outro hotel não tinha cobertor.

Por fim, resolvi sair da minha zona de conforto que eram os seus braços e tentando apenas colocar pra fora o meu braço, alcancei o telefone e com um certo esforço encontrei o bendito do número 9.

- Boa noite! Por favor, vocês poderiam nos enviar um cobertor?

- Boa noite! Pois não, já estamos enviando.

Sorri vitoriosa como quem conquista um empate de 1 x 1. Afinal de contas quem precisa de pantufinhas quando se está com o corpo inteiramente nu congelando? Sem mencionar o fato de congelarmos por opção, pois nenhum de nós ousaria interromper o maravilhoso barulhinho do ar condicionado.

- Eles estão enviando.

Não demorou muito a campainha tocou, e ele é claro quase congelando, o pegou e depois se deliciou com aquele edredom quentinho e que nos aqueceu pelo restante da noite.

Fomos privilegiados com o quarto escolhido pela recepcionista, pois fomos despertados pelo canto dos passarinhos em nossa janela logo pela manhã. Um privilégio associado à sensação mágica de acordar ao lado dele, de ser olhada profundamente nos olhos e de ser fortemente abraçada. Nos beijamos intensamente, e lembro que nos amamos por várias horas...

Ele pediu que eu não fosse para o banho daquela vez, e que ficasse ali em seus braços, apenas nos beijando. Assim fizemos e sem ter noção da hora do dia, pensei termos perdido o horário do café da manhã que a recepcionista havia nos notificado que seria às 8:00 h da manhã. Por fim, acabamos cochilando um nos braços do outro depois de tantos suspiros e beijos.

Passado algum tempo que não sei dizer o quanto, fomos despertados novamente, só que agora por outro som, o do telefone que tocava. Era a recepcionista para nos notificar se o café poderia ser servido, pois já iria dar 10:00 h. Surpresa por ainda nos oferecem o café, respondi que sim e enquanto ele se preparava para receber, eu fui para o banho. Ao sair ele me deu sua camisa para que eu a vestisse. Vesti e notei como era boa a sensação de sentir impregnando em mim o seu cheiro e o de seu perfume. Só ele faz essas coisas...

Ao sair também notei que tinha sobre a mesa uma bela bandeja com: frutas, torradas, geleias, café, leite, pães, biscoitos, frios, sucos, enfim... Era um café da manhã bem reforçado. Eu sorri um sorriso da virada, como quem dizia: agora fala mal do café da manhã daqui. Mas não quis provoca-lo porque o meu namorado é o homem o qual eu nunca vou querer vencer em nada. Mas ele e somente ele pode fazer estas coisas de tornar tudo em uma brincadeira bem gostosa. Então, ele comentou:

- Realmente o café da manhã daqui é bem melhor que o café de lá!

Sabe, meu namorado é assim... Eu e meu namorado não somos um conto do que gostaríamos que acontecesse. Juntos nós realmente acontecemos porque ele faz tudo pra mim ser melhor do que já é. Eu e meu namorado, de fato existimos...