ZÉ DINIS E O HOMEM, DO MEGA BIGODE, QUE ERA CAPATAZ DE UMA USINA DE ÁLCOOL

Após um longo, e difícil, período de desemprego, Zé Dinis estava a caminho de uma usina, produtora de álcool, para assumir um emprego na função de pedreiro. O homem encontrava-se, extremamente, feliz com a possibilidade de retornar ao mercado de trabalho.

Estava, então, pedalando a sua velha bicicleta, radiante de felicidades, e cheio de esperanças, numa possível melhora de vida, ao assumir o novo emprego, que não chegara a notar que um dos pneus da bicicleta havia furado. Só veio notar, portanto, o ocorrido quando a jante traseira da bicicleta ficara, aqui acolá, aderindo ao calçamento e fazendo grande zoada.

- “É muito azar! Logo agora! Não tenho como remendar o pneu” – pensou o rapaz, bastante preocupado.

Todavia, consciente de que tudo na vida tinha jeito, com exceção, apenas, da morte, o jovem saiu empurrando o seu veículo em busca de um posto de gasolina, situado um pouco mais a frente, mas na mesma rodovia, na esperança de lá conseguir consertar o pneu e seguir, o quanto antes, para assumir o seu novo emprego.

Infelizmente, não conseguira remendar o pneu furado de sua bicicleta e não tivera, portanto, outra opção senão deixar a mesma no posto, sob a guarda de um bombeiro amigo seu, e partiu para a margem da rodovia na pretensão de arrumar uma carona. Por muita sorte, logo pegou uma, num caminhão que transportava gás de cozinha, e seguiu, feliz da vida, para a tão sonhada usina.

Diante do grande portão de entrada da usina, apresentou-se, do seu jeito humilde e acanhado, a um vigilante, que assumia precariamente à função de porteiro:

- Bom dia! Irmão. Eu sou José Dinis e vim assumir o meu emprego.

O vigilante, sujeito grosso e de pouca conversa – um verdadeiro brutamontes – pegou uma prancheta, verificou alguns nomes e, em seguida, com uma cara bastante sisuda, encarou o rapaz e falou:

- Estou vendo o seu nome aqui. É um emprego de pedreiro que você deve assumir, mas você chegou atrasado, pois já são 7 horas e 5 minutos e o horário da entrada de funcionários vai, somente, até 7 horas. Você não pode mais entrar.

Aquela resposta, seca e impiedosa, do vigilante surtira um efeito avassalador nas esperanças até, então, alimentadas pelo pobre homem. Logo pensou: E agora? O que eu vou fazer? Será que vou perder o meu emprego? É muita falta de sorte, esta minha!

Contudo, apesar da explicação de caráter ímpio do vigilante, Zé Dinis não amedrontara-se e, prontamente, expressou-se:

- Meu irmão! Cinco minutinhos não valem nada. Deixe eu entrar para não perder o meu emprego.

- É bacana, né! Eu deixo tu entrar para não perder o teu emprego e eu perco o meu – respondeu o vigilante, com uma maneira mais grosseira, ainda, e continuou:

- De modo que eu não posso fazer nada por você, cara. Você tem é que esperar para entrar no horário da tarde, que começa às 13:00 horas. Isto é: se quiser, pois senão, vá embora e passe bem.

O homem, diante da possibilidade de uma entrada, no turno da tarde, apesar de não ser uma coisa muita boa para quem estava assumindo um emprego, uma vez que, no primeiro dia já chegar atrasado, seria, pelo menos, um prenúncio de que não perderia o tão pretendido emprego.

- Tudo bem, meu amigo! Eu vou ficar, então, esperando para entrar no expediente da tarde. Assim, deixe eu entrar na tua sala e ficar sentado naquela cadeira com essa bolsa em que levo as minhas roupinhas – falou o homem, denotando certo ar de felicidade, apesar dos pesares.

- Ah! Não... Você não pode ficar nem um segundo aqui dentro, cara – respondeu o vigilante.

- Assim, tudo bem! Eu posso, portanto, ficar sentado aqui na calçada do lado de fora, nessa sombra? – perguntou Zé Dinis, mais uma vez decepcionado com a postura do porteiro.

- Não, rapaz. Eu já lhe disse que você tem que ficar bem longe daqui.

- Mas o sol está pesado e eu vou ficar esse tempo todo me queimando? – questionou, mais uma vez, o pobre homem.

- O problema é teu, cara. E vamos logo, pois eu tenho muitas coisas pra fazer e você, com essa conversa besta, está é me atrapalhando – o vigilante procurou finalizar, grosseiramente, o diálogo.

O pobre do Zé Dinis estava arrasado com a recepção daquele homem. De repente, veio, em sua mente, o pensamento: “será que, lá dentro, as pessoas serão como este homem?. Sem dúvida alguma, mal educado e grosso, sem saber tratar as pessoas com dignidade”. Quanto a esta questão, o tempo encarregar-se-ia de lhe mostrar.

No entanto, ainda, buscou coragem para perguntar ao seu irredutível interlocutor:

- Será que eu, por conta do sol, posso ficar dentro daquele trator velho, lá na frente?

- Pode meu amigo. Você pode ir pra onde você queira. Só não pode ficar aqui perto de mim. Entendeu, agora?

- Muito obrigado! – respondeu Zé Dinis, partindo, automaticamente, em direção à velha máquina.

Assim, instalou-se no velho trator e passou, em seguida, a fazer as mais diferentes elucubrações, inclusive, todas nada alvissareiras. O homem, no entanto, mediante as suas necessidades, uma vez que tinha uma família para sustentar, nada tinha a fazer, senão, encarar a situação com resignação.

De modo que, chegando a hora da entrada dos funcionários, do turno da tarde, teve, mais uma vez, mesmo a contragosto, que encarar o vigilante mal educado. Assim, diante do portão, falou humildemente:

- Boa tarde, irmão! Voltei para entrar e começar a trabalhar.

O vigilante, calado estava e calado ficara, tendo, portanto, se restringido a abrir o portão e a entregar um cartão de ponto para que o rapaz marcasse a sua presença no relógio de ponto, de cor marrom, que estava pregado na parede ao lado direito de sua mesa.

Assim, Zé Dinis começara a sua aventura, que, por sinal, fora nada atraente, naquela grande usina. Em princípio, apercebeu-se de que teria que saber a quem deveria apresentar-se para assumir o emprego e começar a trabalhar. Assim, após ter dados alguns passos usina adentro, mesmo sem muita vontade, e com grande apreensão, teve que voltar, novamente, a defrontar-se com o seu algoz vigilante:

- Meu irmão! Me desculpe, mas eu não sei a quem procurar para poder começar a trabalhar. Quem eu devo procurar?

- Ah! Cara! Você de novo aqui, perturbando? Você sabe quem foi que arrumou esse emprego para você? – perguntou o vigilante, fazendo jus ao seu jeito ignorante de ser.

- Foi um homem chamado de doutor Manoel – respondeu, prontamente, Zé Dinis.

O vigilante, com um ar de escárnio, deu uma risadinha debochada e respondeu:

- Aqui tem não sei quantos doutores Manoel e você acha que eu, certamente, vou saber qual deles foi o que arrumou o teu emprego?

- Eu agora? O que eu faço? – perguntou, de forma humilde e paciente, o rapaz.

Mesmo, diante de toda a sua arrogância, o vigilante condoeu-se do pobre homem e disse:

- Lá no pátio tem um cara, chamado de Manoel, que está, certamente, agora, comandando uma turma de pedreiros. Ele é mestre de obra da usina. Vá lá falar com ele, pois ele deverá saber o que fazer com você, cara.

O homem agradeceu, mais uma vez, da forma simples que lhe era peculiar, e partiu em busca do homem informado. Assim, depois de perguntar a algumas pessoas, que ia encontrando, sobre o paradeiro do homem, conseguiu encontrá-lo e apresentou-se ao mesmo, demonstrando grande interesse pelo trabalho, apesar de já encontrar-se um pouco faminto, uma vez que estava só com o desjejum:

- Boa tarde! O senhor é o doutor Manoel?

O mestre de obras, prontamente, respondeu:

- Eu sou o Manoel, mestre de obras da usina, e suponho que você é o novo pedreiro, que vem para fazer um estágio sob a minha orientação. É você que é chamado de Zé Dinis, não é?

- É sim, senhor – respondeu o rapaz, bastante esperançoso, pois sentia que as coisas estavam tomando rumo certo.

O mestre de obras encarou o pedreiro e falou:

- Bem! Pra começar, você vai pegar aqueles tijolos, que estão ali, do outro lado, e trazer todos eles para junto desta sapada, que está feita do lado de cá, pois aí vai ser levantado um grande muro. Entendeu?

O homem, apesar de estar sentindo bastante fome, não contou história. Imediatamente, correu, em disparada, para começar a pegar os tijolos e o mestre o advertiu:

- Ei, Cara! Pode voltar e pegar este carro de mão, uma vez que os tijolos devem ser carregados no mesmo e passando, inclusive, por este trecho, de areia mole e molhada, aqui. Você não está pegando biscate para carregar tijolos com as mãos. Aqui é uma usina e devemos, portanto, evitar, ao máximo, a possibilidade de acidentes de trabalho.

Zé Dinis olhou, meio desanimado, para o carro de mão e o trecho de areia por onde deveria passar carregando os tijolos e logo imaginou a dificuldade do trabalho que iria enfrentar. Pensou: “Quê lasqueira! Com este carro de mão de madeira, que já é bastante pesado, e para completar, com uma roda de ferro, e ter, ainda, que passar com ele, carregado de tijolos, por um trecho de areia mole e molhada, não será brincadeira”.

Contudo, o homem, empolgado com o emprego, não desanimou e começou, portanto, a trabalhar. Depois de algumas horas, já exausto e com bastante fome, contando, portanto, as horas e os minutos para chegar o momento de largar o serviço, imaginando, então, já ser umas 17 horas - bendita hora da largada do serviço - escutou alguém gritar, informando que hoje o horário seria estendido até às 19 horas.

- “Deste jeito! É pra se lascar todinho” – pensou Zé Dinis, bastante triste.

Afinal, chegara a grande hora da largada e todos foram liberados para o banho. E Zé Dinis, como um boi que, inocentemente, segue uma boiada, adentrou, também, junto com os outros colegas de trabalho, num banheiro e começou a tomar um reconfortante banho e só pensando no jantar que estava prestes a ser servido. Cansado e sonhando em comer alguma coisa, demorou, então, mais do que os demais companheiros e quando cuidou na vida estava sozinho naquele imenso banheiro coletivo, e o pior, é que não tinha a mínima ideia para onde os demais companheiros tinham saído. Ficou, portanto, atabalhoado e não teve outra saída, senão, a de enfrentar, mais uma vez, o vigilante mau encarado.

- Boa noite, meu irmão! Por favor! Me dê mais uma informação – falou o rapaz, com um tom de voz bastante amedrontado.

- Você de novo, cara. Você, ainda, não se orientou na vida. Você, cara, é muito enrolado. O que é desta vez? – falou o vigilante, com a sua maneira ríspida de se dirigir às pessoas.

- Me desculpe, mesmo. É que eu estava tomando banho com a turma e, de repente, sem que eu notasse, todo mundo sumiu e eu não sei para onde foram.

- Foram para a cidade deles. Foram embora e só voltam amanhã pela manhã.

- E eu vou pra onde? Onde é que eu vou dormir? – perguntou Zé Dinis, bastante preocupado com a sua situação.

- E sou eu que vou saber aonde tu vai dormir, cara? Eu só sei dizer uma coisa: é que você não poderá é ficar aqui por perto do meu setor. Te vira, cara. Vai dormir debaixo de uma árvore desta por aí. Tem muitas, inclusive, bastante frondosas, em toda a área da usina.

O rapaz, extremamente cansado e já bastante fustigado pela fome, encarou o cruel porteiro e suplicou:

- Amigo! Tenha pena de mim e me ajude por esta noite e eu te prometo que, a partir de amanhã, não mais virei te aperrear por nada.

O porteiro olhou para o pobre homem e notou que este, na verdade, estava sofrendo e para ele não custava nada dar alguma ajuda a quem estava precisando. Assim, falou:

- Você siga em frente nesta rua e, mais ou menos, com uns 4 quilômetros, você vai ver umas casinhas. Você pode bater na porta de alguma e, quando alguém atender, você diz que fui eu, Saturnino da portaria, que mandei você dormir lá.

O homem ficou, extremamente, agradecido e partiu em busca do tão almejado local para descansar. Pela fome, aguentaria até o outro dia, isto é se encontrasse algum local para beber água, pois assim conseguiria enganar, até certo ponto, a barriga faminta. Como não sabia se iria encontrar água no local para onde deveria seguir, perguntou ao vigilante:

- Posso tomar um pouco de água neste bebedouro.

- Pode tomar, mas está faltando copo. Toma este pedaço de jornal, faça um copo de papel e pode beber água à vontade – respondeu o porteiro, sem nenhuma compaixão com o pobre homem, uma vez que existia, em uma prateleira embaixo de seu balcão, e era do seu pleno conhecimento, um pacote de copos descartáveis.

Zé Dinis viu o pacote de copos, mas, a estas alturas, não adiantava, ou melhor, não era conveniente, questionar coisa alguma, pois quem estava, na verdade, na contramão da situação era ele. Só fez, resignadamente, tomar, então, vários copos cheios de água e partiu para mais uma aventura.

Desta forma, seguiu na estrada, cheia de embaraços, e extremamente escura, ao encontro das casinhas para passar a noite. Após uma boa caminhada, encontrou, finalmente, 6 casinhas conjugadas, mas, infelizmente, estavam abandonadas. O homem bateu várias vezes na porta de cada uma, gritou, chamando por alguém, mas ninguém apareceu. Exausto e faminto, Zé Dinis sentou-se na calçada e só teve, neste momento, vontade de chorar, todavia, tinha que ser forte, pois precisava daquele emprego e iria lutar por ele até as últimas consequências. “Não seria um vigilante de ‘merda’ daquele que iria por fim no seu sonho de trabalhar na usina”- pensou.

Assim, levantou-se e começou a caminhar de volta para a guarita do maldito vigilante. Lá, este, desta vez, teria que resolver o seu problema, custe o que custasse, uma vez que já se encontrava, praticamente, sem forças para continuar naquele vai e vem e a hora, inclusive, já estava bastante avançada – não parava de pensar o pobre homem.

A noite parecia que ia ficando, com o passar do tempo, cada vez mais escura, e o homem, de forma decidida, caminhava, mas, praticamente, não via quase nada a sua frente. Contudo, tinha a consciência de que não deveria desanimar e continuou, portanto, a caminhar, todavia, para aumentar a sua desventura, caiu, bruscamente, em uma vala cheia de lama. Não chegou, felizmente, a se machucar, no entanto, ficou, quase que completamente, melado de uma lama bastante fedorenta. O mau cheiro era, na realidade, bastante forte, odor este que não deixaria, com toda a certeza, Zé Dinis passar despercebido ao chegar perto de alguém, mas nada poderia fazer, pelo menos, naquele instante. Só lhe restava, portanto, voltar para a fatídica portaria, por onde, infortunadamente, já tinha passado várias vezes naquele dia.

- Irmão! Estou aqui de volta, mais uma vez – falou o homem para o vigilante, desta feita com um receio muito maior do que das outras vezes.

O porteiro levou, bruscamente, uma das mãos ao nariz para evitar, certamente, o mau cheiro impregnado em Zé Dinis, e falou asperamente:

- Você, mais uma vez, de volta, cara! E agora, parece que está todo melado de “merda”. Onde molesta você se meteu, cara?

O pobre homem, bastante acabrunhado, respondeu:

- Lá fora tá muito escuro e eu caí numa vala cheia de vinhoto, acredito. Lá nas casas não tinha ninguém e eu tive, portanto, que voltar.

- Cara, eu vou te dizer uma coisa. Eu trabalho aqui, neste mesmo local, de inverno a verão, há quase dez anos, mas nunca me chegou um peão pra me dar tanto trabalho como você. Pra você, agora, só tem uma saída, mas é lá do outro lado da usina. Lá daquele outro lado, onde tem aquele clarão. Fica daqui a uns 3 quilômetros. Você tá vendo?

O homem, bastante cansado e depauperado, olhou para o homem e respondeu:

- Eu estou vendo, amigo. E o que eu devo fazer lá?

- Você vai procurar um cara de nome Fuscão e pode ser que ele possa te ajudar.

- Tudo bem! Eu vou agora mesmo procurar este cara, mas deixe eu tomar um banho e trocar de roupa.

- Não senhor. Se você tomar banho aqui, com este maravilhoso cheiro, para não dizer ao contrário, vai deixar o banheiro podre e amanhã eu vou ser chamado atenção pelo chefe. Vá embora logo daqui, com esse aroma da molesta, antes que a ronda da usina chegue por aqui, uma vez que já são quase 9:30 horas, que é, praticamente, a hora dela chegar.

- E eu vou chegar fedendo deste jeito, junto de doutor Fuscão? Ele, com certeza, não vai gostar – Zé Dinis atreveu-se, ainda, a perguntar, dando, portanto, motivo suficiente para receber um baita de um desaforo de Saturnino.

- É problema dele, seu idiota! Se ele não gostar, vai tampar a venta ou vai, ligeirinho, mandar você sair de perto dele e se lascar.

Sem opção, Zé Dinis, outra vez partira, conformado com a sua desventura, em busca de um acolhimento para passar a noite. Assim, após um significativo tempo de caminhada, chegou diante da portaria indicada e o seu porteiro, de revólver em punho, e devidamente engatilhado, dirigiu-se, bruscamente, a ele:

- Fique onde está. Não dê mais nem um passo, se não quiser levar um balaço. Quem é você e de onde vem?

- Eu sou Zé Dinis, pedreiro daqui da usina, e trabalho com o doutor Manoel, mestre de obras. Estou vindo aqui para falar com o doutor Fuscão para ele resolver um problemazinho – apresentou-se o homem, com certo grau de esperança em resolver o seu problema da dormida, apesar da "bela" recepção que havia recebido.

- Não sei se ele vai atender você e mais, ainda, com você todo “cagado” do jeito que está.

- Eu não estou “ cagado”, não senhor. Eu estou todo melado de vinhoto, uma vez que caí numa vala, cheia dele, lá do outro lado da usina.

- Eu vou ligar pra ele e ver se ele quer atender você. Mas eu preciso saber qual é o assunto que você quer tratar com ele.

Após o homem ter explicado, nos mínimos detalhes, o motivo de sua presença, o porteiro fez uma ligação para o tal Fuscão e, em seguida, dirigiu-se a Zé Dinis:

- Vamos, então, lá falar com ele. Ele está esperando. Entre aqui e vamos.

O porteiro, com as mãos tampando o nariz, para evitar sentir o odor exalado pelo homem, carregou este até a sala do doutor Fuscão, que já estava diante da porta esperando os dois homens.

Zé Dinis, por sua vez, teve um espanto com o tamanho do homem. Na verdade, a sua estatura física fazia jus ao apelido pelo qual era conhecido. O homem, bastante moreno, dava, na verdade, em largura e altura, dois ou três de Zé Dinis. Era uma corpulência para ninguém botar defeito. No entanto, aquele homem de grosso só tinha o porte físico, pois era de uma educação e doçura nunca vistas pelo pedreiro, que ora procurava a sua ajuda. Assim, o doutor Fuscão, com uma das mãos tampando o nariz, com certeza, para não sentir o mau cheiro exalado pelo sofrido homem, falou:

- Meu amigo! O que você está querendo comigo?

Zé Dinis explicou , detalhadamente, o que já tinha passado na usina e o que estava precisando dele no momento. O doutor Fuscão, coçou a cabeça com a mão esquerda, pois a direita jamais deixara de segurar o nariz, e falou:

- Meu querido! O que eu posso fazer por você é mandar ir se instalar no galpão dos ferreiros, mas é um pouco longe daqui.

- Doutor Fuscão! Pra ele ir para lá é muito perigoso, pois já são quase 10:00 horas da noite e por aquelas bandas passam muitos bandidos. Todas as noites, doutor, são assaltadas várias pessoas por lá – expressou-se, de forma bastante receosa, o vigilante.

- Não tem problema, não. Você vai com ele até lá e vá com o revólver em punho para poder se defender de alguma coisa mal – retrucou, imediatamente, o chefe.

Ao escutar o presente diálogo, Zé Dinis estremecera de medo, mas, mesmo assim, partiu com o vigilante, imediatamente, para o local onde se situava o alojamento dos ferreiros.

Entretanto, para a surpresa e felicidade do mesmo, o local era bastante aconchegante e o melhor é que fora bem recepcionado pelo líder dos ferreiros, que, após escutá-lo, atentamente, falou:

- Pode ficar aqui com a gente, camarada, mas você tem que tomar banho primeiro. Ali, na frente, tem um chafariz, com água à vontade, onde você pode tomar banho para tirar esta catinga. Depois disto, volte que eu tenho um local para você dormir.

Desta forma, poucos minutos depois, Zé Dinis estava acomodado em uma cama de alvenaria nua e crua, digamos assim, sem colchão e sem nenhuma coberta. Mas era tudo o que estava precisando naquele momento. De repente adormeceu, pensando já no café da manhã.

Assim, logo cedo, partiu para o refeitório, bastante ansioso, com os seus novos companheiros ferreiros, para tomar aquele reforçado café da manhã.

- Cadê a autorização do seu chefe? Sem ela, o senhor não poderá entrar – falou a moça da portaria para o pobre do Zé Dinis.

- Eu não sabia que era preciso e, então, não pedi, mas na próxima vez eu trarei, moça – justificou-se o homem.

- Não adianta justificativas, senhor, pois só entra com a autorização.

- Moça! Me ajude, por favor, pois eu estou com um dia sem comer nada. Deixe eu entrar pra comer alguma coisa – Zé Dinis suplicou à moça.

- Não tenho poderes para isto, senhor. Por favor, saia da frente para o próximo homem poder entrar.

Alguns colegas ferreiros, que estavam ao lado do homem, ainda, quiseram fazer algum movimento, mas não teve jeito. O homem ficara, numa realidade nua e crua, sem se alimentar mais uma vez.

Desolado e bastante fustigado pela fome, Zé Dinis não teve outra opção senão apresentar-se ao doutor Manoel, mestre de obras, para o segundo dia de trabalho naquela usina em completo jejum.

Bastante triste e desolado, mas sem comentar nada com ninguém, recebeu do mestre, uma espécie de marreta, inclusive estranha, pois a peça fixa num cabo de madeira era um tipo de rolamento e este, por ser móvel, todas as vezes em que atritava uma talhadeira, que buscava desbastar alguma coisa fixa, resvalava, por mais hábil que fosse o operador, e, na maioria das vezes, acertava em cheio a sua mão fazendo, por conseguinte, terríveis ferimentos. Parecia, então, uma coisa premeditada para fazer o peão iniciante sofrer, de forma desmesurada, e o pobre Zé Dinis já notara esta intenção, uma vez que tinha observado, várias vezes, o doutor Manoel soltar alguns risinhos quando a infeliz marreta acertava, em cheio, uma de suas mãos.

Contudo, com grande grau de conformação, o homem continuou a trabalhar e, aqui acolá, para amenizar a fome, tomava alguns copos de água para poder esperar a hora do almoço. Trabalhou com afinco e, já bem próximo da hora da refeição, dirigiu-se ao chefe e falou:

- Doutor Manoel! Eu estou sem comer desde ontem, pois não estou com a autorização do senhor para entrar no refeitório. Eu queria que o senhor me desse as autorizações, pois a moça da portaria do refeitório só deixa a gente entrar com elas.

- Ah! Meu rapaz. E eu não lhe dei nenhuma autorização? Tudo bem! Tome aqui... uma para o almoço e outra para o jantar de hoje. Amanhã, eu lhe dou o restante para o mês – falou o homem sorrindo, ao mesmo tempo em que entregou as benditas autorizações para Zé Dinis.

Uma vez findo o expediente do turno da manhã, Zé Dinis partira, todo feliz, com as autorizações na mão para almoçar. Estava, portanto, sonhando em colocar alguma coisa sólida na barriga, mas, infelizmente, a autorização não foi aceita, pois a moça da portaria lhe informara que aquele doutor Manoel não tinha autoridade para expedir tal documento.

Rapidamente, o homem voltou para falar com o doutor Manoel, mas este já tinha saído para o almoço e Zé Dinis, infelizmente, mais uma vez, ficara sem refeição. Contentou-se, então, em tomar uns dez copos de água e sentou-se em uma pedra para ficar esperando o horário do expediente da tarde. Pensou, reiteradas vezes, em voltar para casa e mandar todos aqueles escrotos, que tinha se deparado naquela maldita usina, se queimarem nas profundezas do inferno, mas era persistente e iria mostrar para todos aqueles crápulas que não desistiria por hipótese alguma.

Assim, retornou as suas atividades, logo após o toque da estridente buzina, que indicava a hora do início dos turnos de trabalho, empunhou a famigerada marreta e continuou a marretar numa talhadeira e, de vez em quando, machucava as mãos, quando batia o rolamento na talhadeira visando abrir, numa superfície de concreto, certo espaço que, na verdade, ele não sabia para que objetivo o mesmo estava sendo aberto. Sabia, apenas, as dimensões do espaço que eram de 5 centímetros de largura e de 6 metros de comprimento e que as dores das batidas da marreta nas mãos eram terríveis.

O homem já estava começando a perder a paciência, mas algo interior lhe dizia: “Zé Dinis! Tenha paciência, que quem ri por último, ri melhor”. Continuou e quando já estava perto do jantar dirigiu-se, mais uma vez, ao chefe:

- Doutor Manoel! A autorização que o senhor me deu não foi aceita pela moça da portaria e eu fiquei, mais uma vez, sem comer. O que é que o senhor pode fazer para resolver este problema?

- Como é que não foi aceita? Ela tem é que aceitar. Vá lá, novamente, agora no jantar, e diga a ela que, da próxima vez, se ela não aceitar, quem vai lá tomar satisfações, com ela, sou eu. A autorização é esta mesma que eu lhe dei e ela tem é que autorizar você fazer a refeição – explicou-se, com certo grau de autoridade, o chefe dos pedreiros.

E assim, Zé Dinis procedeu:

- Moça! Doutor Manoel disse que a autorização para eu jantar era esta e que a senhora tem é que aceitar.

- Esse Doutor Manoel, de quem você está falando, não manda em nada aqui. Por favor! Abra o espaço para outra pessoa entrar, que a fila já está ficando grande – retrucou, mais uma vez, a moça da portaria.

O homem saiu da portaria do refeitório em total desalento por ter ficado, outra vez, sem fazer a refeição que lhe era devida, de direito, pela usina, e iria, com toda certeza, passar mais uma noite de fome. Não sabia, portanto, o que fazer para resolver o presente impasse. Decidiu, apenas, que deveria ir, novamente, a procura do seu chefe, mas, a estas alturas, o mesmo já teria saído para ir, numa boa, jantar em casa. Por outro lado, os seus amigos ferreiros, quiseram tomar as providências, ao modo deles, visando pressionar a portaria do refeitório para que Zé Dinis chegasse a jantar, mas o mesmo implorou aos mesmos para não agirem de forma alguma, alegando que através de certas determinações violentas não se chegaria a lugar nenhum e a coisa ficou da mesma forma.

No outro dia, logo cedo da manhã, quase morto de fome, foi visitar, então, uma lanchonete, localizada no lado de fora da usina, mais, precisamente, na lateral direita da sua portaria, na esperança de encontrar algum filho de Deus que lhe patrocinasse algo para matar a sua fome. Não se enganara! Ao entrar no recinto, de imediato, avistara dois homens, com um aspecto de peão de obra, que logo surpreendeu-se com as palavras generosas de um deles:

- Amigo! Pela tua cara, dá pra notar que tu tá com muita fome da molesta. Se tu não tem nenhum dinheiro, pode pedir o que quiser pra comer, cara. Fica tranquilo que a gente paga. Mata a tua fome!.

Zé Dinis, com grande surpresa, respondeu:

- É verdade, meu irmão! Eu estou com muita fome.

Assim, acolhido pelos dois homens, comeu a vontade e matou a sua fome. Uma vez mais tranquilo, relatou tudo o que tinha acontecido com ele na usina e o peão que, inicialmente, se prontificara para lhe ajudar, falou:

- Eu passei por tudo isto que você falou nessa maldita usina. Foi por conta disto que, na primeira oportunidade que tive, deixei essa “merda”. Mas não desista, não. Levante a cabeça e vá em frente, cara. Encare esses cafajestes sem medo, que você vencerá.

- Obrigado, amigos! Muito obrigado, mesmo! Um dia, tenho a certeza de que eu vou pagar este favor a vocês – falou Zé Dinis, bastante emocionado, mas já um pouco entusiasmado, diante da força que recebera daqueles peões, para enfrentar a sua luta na usina.

Apresentou-se, então, para mais um dia de serviço e retomou a sua, praticamente, interminável e maltratante tarefa, com a maldita marreta da cabeça de rolamento, que machucava mais as mãos do que ajudava a talhadeira a abrir os espaços no duro piso de concreto armado. As suas mãos já continham, portanto, ferimentos horríveis e, extremamente, dolorosos, e já eram notórios por qualquer um, apesar de que ninguém jamais, naquela usina, se referira a estes, mas o homem continuava firme no seu calvário. Assim, prestes a hora do almoço, voltou a falar com o doutor Manoel sobre as famigeradas autorizações para as refeições:

- Ontem fui jantar e, mais uma vez, não deixaram, pois disseram que as suas autorizações não tinham validade, doutor Manoel.

O chefe olhou para o homem, deu um risinho, e disse:

- Olha! Eu não tenho nada o que fazer. Acho que você deve tentar de novo e ser brabo com essa mulher da portaria do refeitório, pois a autorização é legal.

- Diga a ela que eu não estou gostando disto, não. Ela está tirando a minha autoridade – concluiu o homem, dando uma risada de deboche.

Naquele momento, pelo jeito em que o homem falara, Zé Dinis começara a entender, perfeitamente, que estava sendo, o tempo todo, enganado por aquele homem, uma vez que ele se tratava, sem sombra de dúvidas, de um peão igual a ele e que passava longe de ser um doutor como ele vinha cognominando de forma, totalmente, errada. Era, na verdade, um peão um pouco graduado, pois se tratava de um mestre de obras, mas jamais um doutor, portador, então, de diploma superior como ele vinha imaginando. O doutor Manoel deveria ser outro. Veio, então, de repente, em sua mente as palavras do vigilante que tanto lhe machucara: “aqui tem não sei quantos doutores Manoel e você acha que eu, certamente, vou saber qual deles foi o que arrumou o teu emprego?”

O homem estava, extremamente, irado consigo, porém, não podia dar mais jeito na forma inocente como tinha agido até agora, diante da atitude do mestre de obras. Teria, no entanto, que seguir em frente e foi o que, realmente, fez. Já tinha feito uma refeição na lanchonete e, certamente, aguentaria até o outro dia sem comer, se por acaso, não tivesse, mais uma vez, acesso ao refeitório, dado que, no outro dia, iria procurar o verdadeiro doutor Manoel e, com certeza, tudo seria resolvido.

Assim, na hora do almoço, apresentou-se, novamente, na fila do refeitório:

- Eu já lhe disse que sem autorização, o senhor não entra – falou, bastante zangada, a moça da portaria.

- Moça! Doutor Manoel disse que a autorização era legal e era essa mesma e que a senhora tinha que aceitar, pois estava tirando a autoridade dele – procurou justificar-se Zé Dinis.

- Senhor! Eu já lhe disse que a autorização desse seu doutor Manoel não tem validade alguma. Ele não tem autoridade para tanto.

- Ele disse, moça, que vem aqui se debater com a senhora sobre isto e que não estava gostando disso tudo – retrucou Zé Dinis.

- Pois o senhor venha com ele aqui pra gente resolver. Agora, saia da frente para que os outros possam entrar – concluiu a moça.

Diante do impasse, ocorrido mais uma vez, alguns ferreiros quiseram se alterar no sentido de colocar o homem na marra para almoçar, mas Zé Dinis pediu para que eles deixassem para tomar uma providência deste tipo no período da noite, uma vez que iria ver agora a reação do mestre de obra. E assim foi feito:

- Seu Manoel! Fiquei, mais uma vez, com fome.

O homem notara, perfeitamente, que o seu subordinado, desta feita, já não lhe chamara de doutor, mas se fez de desentendido e levou a coisa na brincadeira:

- Você vai afinar, meu rapaz, e eu não posso fazer nada. Nesta usina, não sei o porquê, ninguém respeita mais um chefe tão importante como eu – respondeu seu Manoel, dando, em seguida, uma grande gargalhada.

Neste momento, Zé Dinis teve, definitivamente, a certeza de que aquele homem esteve o tempo todo gozando de sua boa fé e iria, portanto, procurar agora o verdadeiro doutor Manoel para resolver, definitivamente, o seu problema.

No entanto, isto seria feito a partir do outro dia, uma vez que hoje iria, ainda, ao refeitório, com as falsas autorizações, e mostraria, então, àquela moça que jantaria no refeitório, desse o que desse, dado que contaria, de sobra, com a ignorância de seus amigos ferreiros para ajudá-lo neste pleito.

Assim, depois de larga discussão entre alguns ferreiros, a moça da portaria e o seu chefe, um cara bastante ignorante, também, chegaram a um acordo no sentido de Zé Dinis jantar, apenas, naquele dia, mas este deveria ir, urgentemente, falar com o doutor Manoel, o doutor que trabalhava na gerência da usina, e não o seu Manoel, mestre de obras, para que viesse, nos outros dias, ter o direito de fazer as refeições no refeitório, uma vez que as autorizações do doutor Manoel da gerência da usina eram válidas e seriam, portanto, bem recebidas. O chefe do refeitório concluiu, dizendo para Zé Dinis:

- A partir de agora, o senhor só me traga as autorizações de doutor Manoel da gerência, pois elas são, realmente, válidas, uma vez que, aqui na usina, ele tem poder de mando. Este amigo seu, chamado de Manoel, que vive dando autorizações para você vir fazer refeições aqui no refeitório, não manda nem na casa das negas dele.

Após a conversa com o doutor Manoel, da gerência da usina, Zé Dinis passou, por conseguinte, a ter uma vida tranquila na empresa, dado que passou a frequentar, regularmente, o refeitório,

tendo o direito, portanto, de realizar, normalmente, as suas refeições. O seu Manoel, mestre de obras, por sua vez, pressentiu que a caçoada que vinha pregando no pobre de Zé Dinis tinha, a partir de agora, ido por água baixo, passou, portanto, a dispensar outro tratamento para este. Assim, passou, a tratar o homem de uma forma mais digna, como se nada tivesse feito, e o Zé Dinis, de forma bastante sábia, passou a conviver, também, com o homem como se nada tivesse acontecido.

A única coisa que, ainda, estava fora da normalidade para Zé Dinis era a sua dormida no alojamento dos ferreiros, que apesar de ser confortável, não dispunha de uma cama com colchão e coberta para o pobre homem.

Contudo, um amigo ferreiro, que iria se desligar da usina, prometeu passar para Zé Dinis o seu colchão e cobertas, desde que o mesmo fosse, com ele, na gerência de operações da usina, falar com o senhor Ayres para que as parcelas dos pagamentos destes materiais passassem, doravante, para o nome de Zé Dinis.

- O que eu já paguei, deixa pra lá, pois eu não quero nada de você. Vamos falar com seu Ayres para passar, apenas, o resto das parcelas, que eu falto pagar, para você assumir – falou Nego de Lia, o ferreiro que se prontificara em ajudar o homem.

Diante do acordo, foram os dois homens conversar com o tal do seu Ayres e foi, justamente, nesta conversa que a aventura de Zé Dinis na usina se findaria.

Ao entrar, com Nego de Lia, na sala do seu Ayres, Zé Dinis encarou aquele homem, de um extenso bigode, em que as suas laterais desciam de queixo abaixo, de costeletas, também, exageradas, e cara, extremamente, sisuda, e logo pressentiu que não iria tirar as contas certas com aquele cidadão.

Nego de Lia explicou ao seu Ayres, nos mínimos detalhes, os reais motivos da presença dos dois para falar com ele, naquele momento, e o ser do “mega” bigode, sem mostrar nenhum interesse pelo pleito dos dois homens, encarou Zé Dinis e, rispidamente, perguntou:

- Quem deu autorização para você ficar alojado naquele dormitório?

O pedreiro, de imediato, começou a ratificar os seus pressentimentos com relação àquele homem, mas dissimulou que nada estava prestes a acontecer e, sorrindo, respondeu:

- Doutor Ayres! Quem me deu autorização, por primeiro, foi o doutor Fuscão e depois o doutor Manoel da gerência disse que eu poderia ficar lá, tranquilamente. Assim, eu estou lá gostando muito, pois me entendo bem com os meninos. Lá é muito bom! Só estava faltando um colchão e cobertores que o meu amigo, aqui, vai ceder para mim, caso o senhor autorize.

- Pois fique sabendo que o Fuscão e esse doutor Manoel mandam nas áreas deles e lá, naquele alojamento, quem manda sou eu. Na minha área, quem manda sou eu e você pode pegar os seus cacarecos e sair de lá, urgentemente.

- Só lhe dou 20 minutos para você pegar as suas borcarias de lá de dentro, pois se não tirar eu vou mandar jogar naquela lagoa poluída que fica vizinha ao alojamento. Você sabe qual é, não sabe? E vocês dois podem ir embora. E passem bem!

O sangue, naquele momento, subira à cabeça de Zé Dinis que teve vontade de agarrar-se com aquele homem, inclusive, o mais ignorante que tinha encontrado, até agora, naquela famigerada usina, mas, infelizmente, o mesmo estava arrodeado por três capangas que, logo, passaram a encará-lo, demonstrando que, a qualquer gesto de brabeza de sua parte, estavam prontos para enfrentá-lo.

Não lhe restava, portanto, a fazer outra coisa, senão ir buscar os seus pertences no alojamento dos ferreiros e procurar sair, imediatamente, daquele local em que tanto sofrera. Rapidamente, chegou, com Nego de Lia, ao alojamento dos ferreiros, para retirar a sua mochila com os seus pertences, e interrogado pelos colegas, sobre o que estava acontecendo, contou o que acontecera no diálogo com o seu Ayres e, de repente, a maioria dos ferreiros se armaram de facas e porretes e se decidiram a acertar as contas com o citado capataz – digamos, gerente de operações da usina – mas Zé Dinis suplicou a todos para que não fossem tomadas medidas precipitadas, pois isto não seria nada bom para ninguém. Eles, então, aceitaram e o homem agradeceu a amizade e o acolhimento de todos e partiu em busca do setor competente da usina para que fossem providenciadas as suas contas rescisórias.

Chegando, então, ao setor competente, encontrou, na porta da sala, um cidadão, de uma altura significativa e uma barriga, extremamente, grande, que lhe dissera que a sua carteira só estaria a sua disposição quando o mesmo viesse receber as suas contas. Não satisfeito, portanto, com a informação do homem, dado que a sua carteira profissional se encontrava no escritório da usina, e já fazia quase 30 dias, Zé Dinis disse, ao mesmo, que precisava falar, imediatamente, com o chefe do setor e, automaticamente, partira em direção a porta de entrada. Mais uma vez, no entanto, sofrera outro embaraço naquela usina, dado que o gordão ficara, bruscamente, na entrada da porta e deu uma grande barrigada no pobre homem que este chegou a cair sentado a uns dois metros de distância do homem.

Confrangido, então, com tudo o que tinha passado naquele tenebroso local, Zé Dinis encarou o gordão, levantou-se e, sem esboçar nenhuma palavra, partiu às pressas, antes que chegasse até a apanhar, em busca da saída da usina, rogando a Deus, no entanto, para não mais encontrar o seu primeiro algoz, naquela maldita usina, que fora o vigilante Saturnino.

Todavia, de uma coisa tinha a certeza: só voltaria para aquele local quando viesse buscar as suas contas rescisórias e, se possível fosse, bem acompanhado com um advogado, amigo de sua irmã.

Roberto Vieira
Enviado por Roberto Vieira em 08/10/2016
Reeditado em 29/06/2020
Código do texto: T5785789
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