As ruínas falantes

Em Zeltaini, o céu azul de verão combinava com o vento frio que soprava do mar. Sentados sob a amendoeira onde ele a vira na praia pela primeira vez, Varvara e Sedriks tinham agora o livro de Bergmanis entre eles.

- Então, nosso ponto de partida é a gravura da página 193, - recordou Sedriks - que por coincidência, se refere justamente à Zeltaini.

- Eu vir aqui não era coincidência - replicou Varvara. - Desde pequena, sempre gostei dessa praia.

- A praia onde seu tio desapareceu - assinalou Sedriks. - Acha que ele poderá reaparecer aqui?

- Não - retrucou Varvara, folheando o livro até chegar à uma ilustração mais próxima do fim da obra, sob a qual não havia nenhuma anotação à lápis. - Por causa disso.

Sedriks inclinou-se sobre o desenho em água-forte. Nele, uma paisagem caótica que parecia ser o interior de uma grande caverna repleta de escombros de edifícios antigos e fragmentos de estátuas. No centro da imagem havia um homem de pé, roupas em desalinho, encarando o leitor com ar de assombro.

- Acredite se quiser, mas este é meu tio, Adgars.

- Num livro de quase um século atrás? - Questionou Sedriks incrédulo. - Seu tio viajou no tempo e virou um desenho de Bergmanis?

- Precisamos ir até lá - disse Varvara, sem se importar com o comentário.

- Onde é "lá"? - Insistiu Sedriks.

- Leia o rodapé da figura: "sob a praia de Kaulu Pelni"... onde eu nunca coloquei os pés.

- Se esse lugar da figura fica abaixo de Kaulu Pelni, estando ou não seu tio lá, é compreensível essa sua resistência - ponderou Sedriks. - Resta saber o que nós poderemos fazer, se o seu tio estiver preso no passado.

- Vamos precisar de ajuda - admitiu ela. - E, para isso, é necessário voltar mais algumas páginas.

E só então Sedriks percebeu, que a ajuda à qual Varvara se referia, estava em outras pranchas do livro. Como iriam fazer para tornar reais àquelas representações monocromáticas bidimensionais, era algo que ele gostaria de ouvir Varvara dizer.

- Você acha que essas entidades vão ficar do nosso lado, se as trouxermos para o nosso mundo? - Questionou.

- Não vamos trazê-las para cá - replicou calmamente a garota. - Da mesma forma que o meu tio fez, nós é que iremos até elas...

Isso tornava tudo ainda mais perigoso, pensou Sedriks. Afinal, Adgars Builis não voltara da sua aventura.

- [Fim da 1a. parte]

- [29-03-2022]