Dr. Johnson - um

Era de manhã bem cedo, quase madrugada, quando Daniel, um jovem médico recém-formado, começou uma caminhada de 25 milhas até a cidade de Armstrong, onde trabalharia como assistente do único médico local, dr. Christopher Johnson ou, como era conhecido, doutor Johnson. Esta era a primeira experiência de Daniel Taylor com a prática da medicina fora da Universidade. Aos vinte e poucos anos, era miúdo, mas a agilidade que demonstrava durante a caminhada e a cabeça erguida davam a impressão de que fosse mais alto. Era muito bonito e tinha o cabelo bem cortado. Os olhos escuros brilhavam como diamantes negros, quase faiscando. Eram olhos honestos. Semeava suas sementes selvagens, mais com as mãos que com a alma. E andava devido a energia acumulada; deleitava-se dando largas passadas na estrada enquanto apreciava o ar da manhã. O transporte ferroviário entre Cambridge, sua terra, e Armstrong, era muito ruim. Eram necessárias duas trocas de trem e longas horas de espera, o que o incomodava. Quando um homem jovem está começando a carreira, não quer ficar sentado por horas em estações ferroviárias sujas. Era, assim, mais agradável caminhar, quase correr, como ele fazia agora. Sua única bagagem era a maleta médica; o restante havia sido despachado por trem um dia antes. Estava muito bem vestido, com as roupas feitas sob medida por um conhecido, que era alfaiate. O pai de Daniel era um agricultor bem-sucedido. Tinha uma grande propriedade rural e plantava pêssegos. No outono, o pomar estava repleto de frutas, e delas exalava agradável perfume. Ficou rico com a produção, o que proporcionou ao fazendeiro certa distinção na cidade. Já foi prefeito da vizinha Cambridge. Daniel tinha muito orgulho do pai. Admirava-o, e com razão. O pai fez tudo o que pode pelo filho, deu boa educação e quantias generosas em dinheiro. O filho, no entanto, jamais cometeu extravagâncias, sabia valorizar o esforço do pai. Iniciava agora, desta modesta forma, a carreira de médico. “É melhor começar e se acostumar à sua profissão em uma cidade pequena antes de trabalhar em outras maiores”, ensinou o pai. O filho acatou o conselho. Obedecia às etapas do processo natural de fazer pequenos vôos antes das grandes decolagens. Daniel, assim como seu pai, tinha bom discernimento. Assobiava enquanto caminhava. Estava feliz. Tinha a sensação de que iria cumprir seus objetivos naquele dia. Pensou no pai, na mãe, nas irmãs mais novas, mas não com tristeza, por ter tido que se distanciar deles para os estudos. Sempre teve o apoio da família. Vinte e cinco milhas para alguém jovem como ele soava como uma travessia na rua. Não tinha, na verdade, noção do tamanho da distância. “O que são vinte e cinco milhas?”, perguntava rindo à mãe, quando esta se despediu. Ele não fazia ideia do sentimento dela, que se preocupava com esta mudança na vida do filho. Ele não percebeu a preocupação dela. Apenas caminhava, munido de uma imensa alegria e, por não ter percebido, acreditava que seus familiares compartilhavam tal sentimento. Era uma bela manhã. Uma manhã clara. No chão havia pedrinhas de gelo. As árvores, os telhados das casas e mesmo o ar, estavam todos brancos. A oeste, uma lua transparente lentamente baixava; violeta e vermelho preenchiam o espaço do céu visto a leste. Eis que surgiu o sol, tal como um glorioso navio, queimando a brancura, reavivando o cenário, radiando luz e brilho como de joias. Daniel observava tudo com o prazer de um desbravador. Era sua primeira manhã no novo trabalho, e ele encontrou pessoas indo para seus empregos, balançando as marmitas. Até mesmo estes humildes recipientes se destacaram, refletindo a luz do sol em cores vivas. Daniel sentia os aromas de café da manhã nas roupas dos passantes. Ele levantava a cabeça ao cruzar com as pessoas. Lutaria pela vida de qualquer uma delas, mas tinha plena consciência do que representava a si próprio, de que recebeu alto grau de educação e era ambicioso.

Ele encontrou um homem mexendo um balde. Tossia muito. Era uma tosse longa e forte. Daniel abriu a maleta e produziu algumas cápsulas.

“Senhor, tome este remédio de hora em hora, até aliviar esta tosse”, orientou.

O homem o encarou, engoliu uma das cápsulas, olhou de novo, de forma estranha e bastante suspeita.

Próxima atualização: segunda-feira, 07/11.