Papai Noel X Albert Einstein

Era noite do dia 24 e todos da casa já estavam dormindo. Todos, com exceção da filha caçula do casal, de 9 anos, que estava sentada aconchegantemente na poltrona que ficava ao lado da árvore de natal montada às pressas, uma semana antes, no canto da sala de visitas. A pequena menina, ao contrário do que seria esperado, não aparentava cansaço e nem cochilava. Estava com as duas perninhas dobradas, os pés apoiados sobre o assento da poltrona. O tremelique em uma das pernas não escondia que uma certa ansiedade incomodava a garota. Apoiado nas perninhas estava um caderno tão pequeno quanto o lápis que a menina segurava e com o qual aparentava escrever ou desenhar. Estranhamente, havia na outra mão da menininha uma calculadora que ela sempre consultava após escrever alguma coisa no caderno. Seu rosto inocente demonstrava a sensação de espanto e, ao mesmo tempo felicidade, por alguma coisa que estava sendo descoberta. Num movimento único, a menina olhou num relógio de ponteiros que ficava na mesinha do telefone...deu um sorrisinho. Alguma coisa estava prestes a acontecer. Retirou os pés da poltrona, cruzou as pernas, apoiou um dos cotovelos no braço da poltrona, inclinou a cabeça de modo que ela ficasse apoiada por dois dedos da mesma mão que segurava o lápis, e virou os olhos fixamente para a porta de entrada da casa. No instante seguinte, a porta, que o pai da menina trancara antes de dormir, começou a se abrir. A garota conferiu o alarme, que não disparou. Deu um sorrisinho como se já soubesse que isso fosse acontecer. A porta abriu-se por completo. Uma luz forte impedia que a figura que entrava na casa fosse identificada. Os olhos da menina brilharam.

-- Papai Noel!!! – disse seguramente a menina.

O bom velhinho entrou, espantado, na sala. A luz forte apagou-se.

-- Teresa, o que você faz acordada a uma hora dessas ?! – questionou Papai Noel.

A menina pensou: “Humm... tudo conforme eu esperava: a porta abriu-se mesmo trancada, o alarme não disparou, e ele sabe meu nome”.

-- Preciso lhe fazer umas perguntas, meu senhor. – disse Teresa em tom desafiador.

Papai Noel achou engraçada a situação, deu uma risadinha inocente e respondeu:

-- Pois bem, meu anjo, pode fazer as suas perguntas. Mas não demore muito, ainda tenho muitos presentes a entregar, e não gosto de alongar a noite de natal.

Teresa levantou-se da poltrona. Segurou o caderninho com as duas mãos.

-- Tenho provas consistentes, baseadas em cálculos confiáveis, de que essa história de Papai Noel é uma farsa. Mas algumas repostas só o senhor pode me dar.

-- Diga, querida Teresa – disse Papai Noel, aproximando-se da menina.

-- Meus cálculos são claros. Levando-se em consideração a magnitude da área do planeta habitada por pessoas que comemoram o Natal, considerando-se a densidade demográfica aproximada de cada região, e considerando um número relativo de pessoas que deveriam receber o presente de Natal, eu concluo que o senhor só conseguiria atender à demanda mundial de presentes se viajasse com uma velocidade aproximadamente igual à da luz.

Papai Noel sorriu, como um pai orgulhoso das notas escolares de sua filha.

-- Sim, continue – disse ele.

-- Mas tudo bem. Consideremos certa que sua velocidade seja igual à da luz, mesmo sabendo que isso nunca foi alcançado por nenhum ser humano. Se assim fosse, de acordo com as idéias do genial Albert Einstein, o senhor, depois de viajar na velocidade da luz por cerca de 8 horas seguidas, jamais deveria envelhecer. Então como explicar sua barba e seus cabelos brancos, suas rugas e sua voz rouca? Estou certa de que o senhor é uma invenção que está hoje representada, provavelmente, por um dos meus avôs.

Dizendo isso, a pequena Teresa dirigiu-se rumo ao Papai Noel e deu um pulo para que pudesse arrancar a barba do bom velhinho.

-- Ai!!!!!!!!!!!!!!!!! – gritou Papai Noel.

A menina espantou-se e recuou, sentando-se na poltrona.

Papai Noel riu, alto dessa vez: “Ho – ho – ho”.

-- Querida Teresa, você é uma menina muito esperta. E certamente não é a primeira a me fazer todas essas perguntas. Mas, infelizmente, você não entenderia as respostas para elas. Por isso, você deve crer que algumas coisas da vida devem realmente ser inexplicáveis. É isso que nos dá o prazer de viver cada dia como se fosse único. E é isso que nos impulsiona a continuar vivendo a mágica e o mistério da vida. Teresa, simplesmente acredite!

Os olhos da menina brilharam. Papai Noel se dirigiu a ela, deu-lhe um beijo no rosto, e ao passar a mão por sobre sua face, Teresa fechou os olhinhos e durmiu...

Papai Noel retirou os presentes de uma sacola que carregava, colocou ao redor da árvore de Natal, bebeu o copo de leite que a mãe de Teresa deixara na mesinha ao lado da poltrona e abriu a porta. A luz forte acendeu-se novamente. Teresa continuou dormindo. Papai Noel virou o pescoço para que pudesse ver Teresa. Deu um sorriso, e saiu da casa. Um silêncio tomou conta do lugar.

No dia seguinte, Teresa acordou cedo. Dormira na poltrona. Constatou que os presentes estavam realmente ao redor da árvore de Natal, mas antes de abri-los, queria contar da sua conversa com Papai Noel pra seus pais. Subiu as escadas correndo, e entrou no quarto dos pais. Decepcionou-se. O guarda-roupas estava semi-aberto e Teresa pôde ver uma roupa vermelha pendurada num cabide, juntamente com o que seriam a barba e o cabelo de um falso Papai Noel. Teresa teve raiva. No mesmo instante, uma voz veio no interior da cabeça dela:

-- “Simplesmente acredite!”.

Fernando Augusto
Enviado por Fernando Augusto em 20/12/2006
Reeditado em 21/12/2006
Código do texto: T323700