A casa tinha as janelas guarnecidas de cortinas e gerânios vermelhos num  jardim entre árvores, flores e borboletas. Casa completa e repleta das aquarelas das lágrimas transfiguradas em arco-íris.
            Alegria e tristeza fundiam-se ali conciliando extremos como o são a misericórdia e a justiça.
      Passeando no mundo mágico do quintal-jardim com a leveza dos canários e a suavidade das lesmas, o encantador de pássaros tinha consciência do lúcido dever, antes de tudo, de cantar, que outro não é o ofício dos poetas, que não cantam tanto para espantar, mas embalar a dor, tornando-a adulta.
     Chegou também para ele o Natal naquele jardim-quintal,  celebrando na tranqüilidade e na paz o Deus que sofre em nós.      Trazia pássaros nos ombros, nos braços, no coração e sobre a cabeça revoando às dezenas em sua alma extensa, com os quais convivia e conversava.
     Com fala mansa e doce coração conversava com eles as fábulas da vida, os mistérios de Minas e os segredos do universo. E quando a noite trazia o silêncio dos voos, ele os guardava soltos dentro de si para depois soltá-los quando o dia principiasse, encantado com o alvoroço de suas asas. Abria o sorriso raro e os deixava livres em coloridos bandos. 
     Finalmente o Natal. No ar e na arte, nas harpas dos anjos e nos arquivos dos homens. Sentiu-se entre nuvens e estrelas. Coisa notável seus gestos de asas quando conversava com as sabiás.
-“É melhor virar pássaro, pensou!”-
     Nunca se soube se sorrindo ou dormindo, mas  foi ficando frágil, leve como a brisa. O sorriso ficou doce e a voz melodiosa. E sua alegria ao contemplar a Mãe e o Filho sob a estrela de Belém contagiou os poetas amalucados, os cronistas aéreos e os seres alados.
E, por ser Natal voou, enquanto Deus tomava posse de Belém entre árvores, flores e borboletas.