O corte

Faziam dias que não andava pela cidade, estive em casa por todo esse tempo, saindo esporadicamente para fins rápidos e precisos. Mas naquela manhã saí, fui caminhar sentindo uma brisa fria que fazia-me sentir muito bem com o mundo, sorria sozinho enquanto caminhava. Cheguei à Praça e fui sentar-me, quando olhei para minha direita, quase não acreditei no que vi. Vi uma grande árvore cortada, uma das mais bonitas, das mais antigas, um verdadeiro patrimônio de minha infância que tanto brinquei por entre as árvores daquela praça e conhecia como conheço meus irmãos. Meu coração apertou e senti uma dor intensa, quase chorei. Dizia: Que covardia! Que crime! Como podem fazer isso com a gente que ama esta paisagem, que ama este lugar? Senti como se houvesse algo de sagrado e isto, foi destruído, algo de sagrado para mim, não num sentido divino, mais num sentido particular perdi algo ali de alguma importância que antes não sabia que tinha. Não contente com a distância, fui ali perto, averiguar se havia alguma razão de um corte tão cruel, percebi que o resto do tronco que havia estava inteiro, o âmago estava sem brocas ou podridões que poderiam justificar o ato. Fiquei ainda mais desconfortável ao perceber a crueza do destruidor, quase que desconsolado caminhei, porque ali cortaram mais que uma árvore, cortaram uma parte de minha memória, uma parte de minha infância. E voltei para casa para me lançar de novo nos livros, para quem sabe esquecer daquela árvore.

José Lins Ferreira
Enviado por José Lins Ferreira em 17/01/2014
Reeditado em 17/01/2014
Código do texto: T4653284
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